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Moreno lembra atrito com Luxa e revela sondagens de cinco clubes do Brasil

Marcelo Moreno se desentendeu com Luxemburgo no Grêmio e acabou afastado - Lucas Uebel/Divulgação/Grêmio
Marcelo Moreno se desentendeu com Luxemburgo no Grêmio e acabou afastado Imagem: Lucas Uebel/Divulgação/Grêmio

Marcello De Vico

Do UOL, em Santos (SP)

24/03/2019 04h00

Desde 2015 no futebol chinês, o filho de pai brasileiro e mãe boliviana Marcelo Moreno deixou seu nome marcado no país verde e amarelo, especialmente no Cruzeiro, onde foi o artilheiro da Libertadores em 2008, em sua primeira passagem, e conquistou o Campeonato Brasileiro de 2014, quando voltou ao time celeste emprestado pelo Grêmio. Mas um atrito com o técnico Vanderlei Luxemburgo acabou interrompendo a sua passagem pelo time gaúcho.

Em entrevista exclusiva ao UOL Esporte, Marcelo Moreno diz ainda não entender o que aconteceu entre ele e o treinador, com quem fez boa temporada em 2012 - sendo artilheiro do time com 21 gols em 55 jogos.

"Eu sempre me perguntei qual o problema que o Luxemburgo teve comigo no Grêmio. Era o artilheiro do time na temporada anterior, consegui fazer o gol da classificação para a Libertadores do ano seguinte e, quando vira a temporada, ele simplesmente me afasta e isso me prejudica bastante porque eu fico dois meses sem treinar com o grupo", lembra Moreno.

"E eu chego empolgado para fazer o meu trabalho, e não é o mesmo do que quando você está treinando todos os dias, jogando... Por um lado me prejudicou, sim. Era mais fácil ele falar comigo, ter uma conversa de homem para homem e falar que eu não faria parte do ano seguinte. Aí eu me preparava melhor para poder ir para qualquer lugar e trabalhar de forma correta, como se deve, e não ter passado por tanta coisa desagradável que eu passei. Seria melhor uma conversa cara a cara e não ter que sofrer o que eu sofri", acrescenta.

"Não estava 100% no Flamengo"

Sem clima com Luxemburgo, Marcelo Moreno acabou emprestado ao Flamengo no mês de maio. O começo foi promissor, com quatro gols nos sete primeiros jogos, mas a passagem pelo clube carioca terminou sem grande destaque. Ainda assim, disputou algumas partidas na campanha da Copa do Brasil que terminou com título rubro-negro - em final contra o Athletico.

06.jul.2013 - Marcelo Moreno comemora primeiro gol do Flamengo sobre o Coritiba pelo Campeonato Brasileiro - Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, ESPORTE - Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, ESPORTE
Imagem: Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, ESPORTE
"Quando eu cheguei ao Flamengo, queria dar o melhor de mim dentro e fora de campo, ser um jogador que pudesse ajudar. Fui com a mentalidade positiva de ganhar títulos, e consegui ganhar um com os meus companheiros, uma Copa do Brasil, e é isso que se deixa na história. Mesmo você jogando todos os jogos ou menos. O grupo sempre vai estar na história", conta.

"Mas eu não estava 100%, eu vinha de um problema físico porque fui afastado no Grêmio com o Luxemburgo. Tenho certeza que se tivesse bem fisicamente poderia ter jogado muitos jogos e ajudado muito mais o Flamengo. Esse ponto foi fundamental. Depois que o Mano Menezes saiu do Flamengo, as coisas começaram a mudar bastante para mim. Não tive oportunidade, sequência, então as coisas acontecem dessa forma e você acaba não mostrando o teu futebol. Isso atrapalhou bastante na minha passagem pelo Flamengo, onde queria deixar o melhor de mim porque era um time que merecia", afirma o atacante, hoje com 31 anos.

Procurado por brasileiros, preferiu seguir na China

Marcelo Moreno é nome frequente no Brasil quando a janela de negociações está aberta. Na última, inclusive, ele diz que chegou a ser sondado por cinco clubes - sendo que dois fizeram proposta. O atacante, porém, não esconde que a questão financeira falou mais alto.

10 jan 2014 - Marcelo Moreno foi recebido com entusiasmo por torcedores do Cruzeiro em sua chegada ao Aeroporto de Confins - Dionízio Oliveira/UOL - Dionízio Oliveira/UOL
Imagem: Dionízio Oliveira/UOL
"Eu cheguei a negociar com cinco clubes do Brasil, mas só dois fizeram proposta oficial, e não chegamos a um acordo. A maioria ia jogar a Libertadores. O time chinês já me conhecia, me queria há algum tempo e foi muito rápida a negociação. Acabaram mostrando um projeto muito interessante para mim, já estou bem adaptado à China e isso pesou muito para poder aceitar essa proposta. A nível de contrato, é irrecusável. Eu abracei essa oportunidade, é um contrato de três anos que me dá oportunidade de fazer história no futebol chinês também", diz Marcelo, que hoje atua pelo Shijiazhuang Ever Bright, o terceiro clube chinês em sua carreira.

"Qualquer jogador do Brasil, ou a grande maioria, gostaria de vir para China. Te falo porque muitos amigos dentro do futebol já me ligaram. É um contrato surreal perto do Brasil. Você tem a sua independência. Jogador de futebol joga, no máximo, em alto nível, até 38 anos, se se cuida muito bem, e mesmo assim a vida que o jogador tem, de luxos, o dinheiro acaba. Depois o dinheiro vai embora. E você tem quatro filhos, tem que pagar escola, se tiver em escola internacional tem que pagar todo ano, e isso gera despesa. Depois que você não joga mais, as contas chegam, e o dinheiro que você no futebol, dentro do Brasil, talvez acabe", analisa.

"Não é esse mundo que muita gente pensa. Lógico, jogador é bem remunerado, mas até 35 anos. E depois? Você não tem renda que entre na sua conta. O futebol chinês te proporciona uma vida pós-futebol que é importante para a carreira do atleta, para a sua vida, para a família, é uma segurança financeira muito boa. Não vou negar que os contratos que fiz foram surreais porque realmente foram, muito importantes, e valorizo bastante quem faz um contrato desse, porque mostra que confia em você, que eles te valorizam. E isso não tem preço", acrescenta.

Vender lanches nos estádios despertou paixão por futebol

Filho do brasileiro Mauro Martins, ex-jogador do Palmeiras, Marcelo Moreno cresceu respirando futebol dentro de casa. Porém, a simples atração virou paixão depois que ele, ainda na pré-adolescência, começou a trabalhar vendo lanche e refrigerante dentro dos estádios da Bolívia. Ver de perto o amor da torcida por seu time nas arquibancadas mexeu bastante com Marcelo.

Marcelo Moreno comemora segundo gol da Bolívia contra a Argentina - Aizar Raldes/AFP - Aizar Raldes/AFP
Imagem: Aizar Raldes/AFP
"Eu sempre vivenciei futebol dentro de casa. Meu pai [Mauro Martins] é ex-jogador, craque, foi muito bom [risos], meu irmão também foi profissional, então se falava de futebol, a gente assistia sempre, meu pai tentava me treinar de vez em quando, isso com 13 anos, e já comecei a me interessar. Mas teve um momento marcante na minha vida pessoal que foi nos estádios, mas não no futebol. Eu estava trabalhando, já com 13 anos, eu vendia lanches e refri nos estádios, e foi esse jeito de ganhar a vida no momento e por estar nos estádios que tive a felicidade de enxergar uma torcida que ama seu clube, e eu fui acompanhando isso desde as arquibancadas. Isso foi realmente marcante para mim. Eu era mais um torcedor", lembra.

"Isso me chamou muito a atenção para gostar de futebol também, e depois desses anos comecei a treinar num time de futebol na Bolívia e logo em seguida fui para o Vitória da Bahia, onde realmente começou tudo e, graças a Deus, consegui virar um jogador profissional", diz.

Brasil ou Bolívia? "Foi uma decisão muito difícil"

Antes de se profissionalizar pelo Vitória, Marcelo Moreno precisou, ainda nas categorias de base, optar por qual seleção jogaria dali em diante: Bolívia ou Brasil. A primeira opção prevaleceu, mas o atacante recorda o quão difícil foi fazer essa escolha.

Marcelo Moreno posta foto no Twitter de quando defendeu a seleção brasileira de base - Reprodução/Twitter - Reprodução/Twitter
Imagem: Reprodução/Twitter
"Se voltar no tempo vem um monte de lembranças sobre seleção brasileira, seleção boliviana, e, realmente, nesse momento foi muito difícil para eu tomar uma decisão. Imagina. A maior seleção de todos os tempos e você tendo a oportunidade de jogar lá. Como boliviano, você sendo convocado para a seleção da base do Brasil era de me orgulhar muito, mas infelizmente não consegui ir adiante porque esperei umas convocações para competições importantes como Sul-Americano, Mundial, e isso não aconteceu. E a seleção principal da Bolívia já estava me chamando, em contato comigo, e tomei essa decisão junto com a minha família de ir para a seleção boliviana, onde eu poderia ter muito mais oportunidades e virar uma referência, e graças a Deus isso aconteceu, hoje sou uma referência do meu país, da minha seleção, graças ao meu trabalho, ao meu esforço, dedicação, e já me vejo disputando mais uma Copa América no Brasil, e isso que me enche de orgulho de ter tomado essa decisão", afirma o jogador, que será, mais uma vez, o grande destaque da seleção boliviana na Copa América do Brasil.

Curiosamente, o primeiro adversário da Bolívia na Copa América é o Brasil, em confronto que abre a competição e está marcado para o dia 14 de junho, no Morumbi.

"Expectativa está a mil porque o futebol brasileiro que abriu as portas para mim, me deu oportunidade de ser um jogador profissional, me deu esse conhecimento e ainda estou tendo essa oportunidade de jogar a Copa América no Brasil, contra o Brasil, então é muito emocionante para mim poder participar e tentar fazer um grande jogo, porque tem que ser o nosso dia, um jogo perfeito para conseguir os pontos que a gente quer. E acredito que, se todos os jogadores estão se preparando da melhor maneira possível, vamos conseguir fazer um grande jogo, sim", afirma Marcelo, que diz sempre sentir algo diferente quando enfrenta o Brasil.

"É um sentimento único para mim, até porque me sinto metade brasileiro, por toda essa identificação que tenho, por ter jogador nas categorias de base do Brasil, pelo respeito que tenho dos torcedores brasileiros que estão sempre lembrando de mim, mesmo eu jogando um tempo fora, aquela foto eterna para mim que tirei com a seleção brasileira em La Paz... Então o sentimento é de alegria, de orgulho, de poder jogar com uma seleção tão forte no mundo tudo. E tomara que eu possa ir bem, que minha seleção possa fazer um grande jogo e que a gente faça festa para as pessoas que comparecerão ao estádio", acrescenta.

VEJA OUTROS TRECHOS DA ENTREVISTA

Passagens pelo Cruzeiro: "marcantes"

Marcelo Moreno converteu cobrança de pênalti para abrir o placar para o Cruzeiro - Heuler Andrey/Getty Images - Heuler Andrey/Getty Images
Imagem: Heuler Andrey/Getty Images
As duas passagens que tive pelo Cruzeiro foram marcantes e o torcedor não esquece, e nem eu. Jogar com uma torcida que te apoia, que te idolatra, que quer que você jogue no Cruzeiro, que gosta como você joga, com raça, amor, carinho, identificação ao clube, isso todo jogador quer, imagina eu, que sou cruzeirense. Tenho muita confiança que, na época, poderia ter uma vaga na seleção, sim, porque estava jogando muito bem no Cruzeiro, estava numa fase maravilhosa, e acredito que eu poderia fazer parte de uma seleção brasileira.

Sonho: levar a Bolívia a uma Copa do Mundo

Meu sonho é levar a Bolívia para uma Copa do Mundo. É tudo que mais quero. Mas é muito difícil. A Bolívia precisa de muito investimento, diretoria, presidente, pessoas que têm que poder que se importem muito mais com futebol do que com outras coisas, e isso tem que mudar, porque é muito difícil você jogar contra Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Uruguai, e você não tem as mesmas armas que as outras seleções, não tem os mesmos investimentos, centros de treinamento de alto rendimento como tem em todos os países, então você precisa melhorar muito as categorias de base para poder pensar em Mundial. Mas tem tempo para fazer isso, esse investimento, colocar pessoas corretas, honestas, que amem futebol, que se interessem pela seleção, que é o que importa para o torcedor da Bolívia no momento. Acredito que é se unindo, porque não temos as armas como as outras seleções, e a união e a sinceridade fazem com que mude muitas coisas. E o sonho de todo boliviano é ir para o Mundial, e é só trabalhando desse jeito, melhorando as categorias de base, que o futebol boliviano vai evoluir e conseguir chegar ao Mundial, que é o sonho de todos.

Maior artilheiro da seleção boliviana?

Acredito que esse momento vai chegar. O momento de ser o maior artilheiro da seleção boliviana vai chegar. Estou a três gols [de Joaquin Botero, com 30], mas não tenho pressa. Sei que as coisas acontecem naturalmente para o atacante, e para mim tem sido assim na seleção. Com calma sei que as coisas vão acontecer e a seleção vai se beneficiar com esses gols. Tomara que seja na Copa América, mas não tenho pressa alguma de chegar, o importante para mim sempre vai ser o coletivo, sempre vai ser a seleção tentando somar os pontos em uma competição tão difícil como a Copa América.

Ucrânia, Alemanha, Inglaterra...

Eu sou um daqueles jogadores rodados, como se fala no futebol [risos]. Logo aos 18 anos eu já estava fazendo um contrato com o Shakhtar Donetks, da Ucrânia, e você novo, com outras ideias, pensa diferente, e o tempo é aquele que vai te dar muita experiência, vai te ajudar a se preparar melhor, e eu tive passagens por muitos lugares, ligas importantes que me acrescentaram ao futebol, ao meu dia a dia, à minha vida, e Inglaterra, Alemanha, Ucrânia, China, todas ligas me ajudaram bastante. Eu gosto muito da Bundesliga, foi muito bom. Acho que poderia ter segurado a impaciência de não estar jogando muito, porque tinham muitos jogadores importantes no elenco. Eu poderia ter aguentado mais e, quem sabe, ficar mais nesse campeonato. Eu pedi para sair porque queria jogar, era novinho, e isso, às vezes, acaba atrapalhando. Mas são coisas que acontecem quando a gente é jovem. Gostaria muito de ter permanecido.

Ucrânia: "Não me entendiam nos restaurantes"

Uma história curiosa que eu passei foi na Ucrânia, porque é um lugar que eu não falava o idioma ainda e nos restaurantes a gente brincava bastante. Não me entendiam, não entendiam minha família, a gente queria pedir algum frango, algum prato do cardápio, e era muito difícil, tudo escrito em ucraniano, então não dava para gente, e sempre criava um ambiente engraçado.

Adaptação à China: "me tratam muito bem"

Estou muito adaptado à China, os caras aqui me tratam muito bem e dão um suporte incrível, e isso é importante para o atleta. Então eu valorizo bastante isso e estou deixando tudo de mim aqui dentro de campo, e meus números falam sozinhos em relação a isso, e agradeço a confiança que eles têm no meu futebol.