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Como brasileiros tentam encerrar lobby e "festa" argentina na Conmebol

Rodolfo D"Onofrio (c), presidente do River Plate, chega ao hotel da Conmebol cercado por seguranças e no foco dos holofotes - REUTERS/Jorge Adorno
Rodolfo D'Onofrio (c), presidente do River Plate, chega ao hotel da Conmebol cercado por seguranças e no foco dos holofotes Imagem: REUTERS/Jorge Adorno

Pedro Ivo Almeida

Do UOL, em Assunção (Paraguai)

15/05/2019 04h00

Segunda-feira, 13 de maio, dia de sorteio das oitavas de final da Copa Libertadores 2019. Pouco depois das 17h, repórteres, cinegrafistas, um batalhão de seguranças e hóspedes curiosos seguem um senhor de cabeça branca a passos rápidos. Quem observa à distância logo percebe se tratar de alguém especial no lobby do hotel da Conmebol, em Luque, no Paraguai. De fato, cruzava o enorme salão a caminho do elevador um dos mais influentes dirigentes do futebol do continente na atualidade: Rodolfo D'Onofrio, presidente do River Plate.

A cena poderia ser comum, uma vez que o mandatário do atual campeão do torneio demanda atenção especial. Mas vai além, representa muito mais quando se analisa o restante da cena. Espalhados em cadeiras e sofás do luxuoso hotel, dirigentes de clubes brasileiros, pouco notados, acompanham tudo de longe. É o retrato do cenário política dos dias atuais na confederação sul-americana.

Enquanto os argentinos dominam a "festa" e são tratados com enorme pompa, os brasileiros ainda tentam se acostumar a um ambiente que parece novo. Entre os cartolas de Palmeiras, Flamengo, Cruzeiro, Grêmio, Internacional e Athletico-PR, resta o desconforto e aceitação de que o país com mais times na fase final e que rende as maiores receitas com televisão ainda não marca presença nos bastidores como poderia.

"Eles [os argentinos] mandam aqui. Estamos pagando uma conta de 10 ou 15 anos. É um trabalho a longo prazo. Precisamos mudar a cultura, nos fazer mais presentes, conversar, articular", explica Luiz Eduardo Baptista, o Bap, vice-presidente de relações externas do Flamengo e representante do clube no evento desta semana.

Nas conversas entre xícaras de cafés ou garrafas de vinho, os ataques de outros dirigentes brasileiros são ainda mais contundentes. Uns dizem que os argentinos "brincam" na Conmebol, outro afirma que a entrada na sala da presidência ocorre sem que nem batam na porta. Por fim, um terceiro diz que os Hermanos "mandam no Alejandro [Dominguez]".

Galiotte se aproxima de presidente

Alejandro Dominguez e Mauricio Galiotte - Pedro Ivo Almeida/UOL - Pedro Ivo Almeida/UOL
Presidente do Palmeiras, Mauricio Galiotte (d) é brasileiro com mais abertura junto ao mandatário da Conmebol, Alejandro Doimnguez (e)
Imagem: Pedro Ivo Almeida/UOL

Quem não sobe tanto o tom é Mauricio Galiotte. O comandante do Palmeiras é o cartola brasileiro com maior abertura junto ao presidente da Conmebol. O segredo? "A gente vem uma vez, vem outra, conversa, tenta entender, dialoga. Precisamos realmente estar aqui. E eu venho procurando fazer isso. Quero entender tudo para poder passar ao meu clube, ao meu técnico, aos meus jogadores. Vamos trabalhando aos poucos", diz ele.

E é justamente a presença - ou falta dela - de um presidente que acaba sendo apontado por pessoas da Conmebol como grande diferencial dos argentinos. Na visão de membros da confederação com acesso à alta cúpula, os mandatários Hermanos prestigiam todos os eventos, reuniões e sorteios importantes.

Diferentemente, apenas os presidentes Galiotte, Wagner Pires de Sá, do Cruzeiro, e Luis Salim Emed, do Athletico-PR, estiveram na sede e centro de convenções da Conmebol.

No farto coquetel oferecido antes do aguardado sorteio da Libertadores, mais uma cena para confirmar a diferença de trânsito entre brasileiros e argentinos. Enquanto os dirigentes Hermanos eram cortejados e atraíam a atenção de figurões da cena futebolística sul-americana, os brasileiros cruzavam os salões sozinhos, sem acompanhamento de estafes da confederação, como quem procura uma companhia para não passar a festa sozinho. Ao menos a lição de que a coisa precisa mudar parece ter sido assimilada.

"O Brasil tem que ser protagonista. Tem que tomar café? Virei. Conversar? Virei também. E receber os caras no Rio, no Maracanã, convidar, dialogar, se aproximar. Está na hora. Estamos conversando, vamos mudar isso", prometeu Cacau Cotta, diretor de relações externas do Flamengo e responsável pela articulação com entidades brasileiras e internacionais.

Clubes pedem ajuda à CBF

Antes dos cafés e diálogos no Paraguai, os clubes brasileiros tentam uma solução em casa. Após encontros em fevereiro e março deste ano, os dirigentes resolveram pedir ajuda à CBF.

"Os clubes brasileiros campeões da Taça Conmebol Libertadores e os clubes participantes da edição da referida competição em 2019, representados aqui por seus presidentes, vêm por meio deste documento, fruto de reuniões realizadas exclusivamente para este fim, nos dias 26 de Fevereiro e 21 de Março deste ano, solicitar à CBF que interceda à Conmebol, com o objetivo de revisarmos aspectos comerciais, institucionais e esportivos que, no entendimento destes signatários, são essenciais para a manutenção da atratividade e interesse dos clubes brasileiros nas competições organizadas pela Conmebol. Entre os principais aspectos podemos destacar: remuneração dos clubes, padronização e exigências, comerciais e calendário. Por fim e adicionalmente, os clubes brasileiros vêm por meio deste requerer tratamento mais respeitoso por parte da Diretoria de Competições de Clubes, Órgãos Judiciais e Tribunal de Disciplina da Conmebol e solicitam à CBF uma reunião com a Conmebol até o dia 25 de abril de 2019, a fim de deliberarmos sobre os pleitos ora apresentados para implementação nas competições Conmebol a partir de 2020", diz o documento assinado por Athletico-PR, Atlético-MG, Corinthians, Cruzeiro, Flamengo, Grêmio, Internacional, Palmeiras, Santos, São Paulo e Vasco e endereçado à presidência da confederação brasileira.

A tentativa ainda está longe de ser um sucesso, como boa parte das missões recentes. Tal reunião ainda não aconteceu. Ainda assim, representantes da CBF e times acreditam em um encontro até a Copa América, quando a cúpula da entidade sul-americana estará no Brasil.

*Colaborou Marcel Rizzo, do UOL, em Fortaleza (CE)