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Polícia vê culpa de Bandeira em artigo que pode dar até 30 anos de prisão

Ninho do Urubu após incêndio que acabou resultando na morte de 10 garotos - Thiago Ribeiro/AGIF
Ninho do Urubu após incêndio que acabou resultando na morte de 10 garotos Imagem: Thiago Ribeiro/AGIF

Leo Burlá

Do UOL, no Rio de Janeiro

12/06/2019 04h00

Indiciado por homicídio pelo incêndio que vitimou na morte de 10 meninos no Ninho do Urubu, Eduardo Bandeira de Mello, ex-presidente do Flamengo, foi apontado no inquérito assinado pelo delegado Márcio Petra, titular da 42ª DP, como autor do crime por omissão.

De acordo com o inquérito, o ex-mandatário é incluído no artigo 121 do Código Penal, que trata sobre homicídios. Ao rubro-negro foi imputado o inciso III, cuja redação aborda mortes "com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel". A pena prevista em caso de condenação é de 12 a 30 anos, mas o trâmite legal é longo, já que o Ministério Público ainda tem de decidir se irá ou não oferecer a denúncia, que seguiria seu caminho na Justiça.

A mesma argumentação foi usada por Petra para indiciar o monitor Marcos Vinicius Medeiros, Marcelo Sá e Luis Felipe Pondé, engenheiros do Flamengo; Danilo da Silva Duarte, Weslley Gimenes e Fábio Hilário da Silva, da empresa de contêineres NHJ, e Edson Colman da Silva, técnico em refrigeração, pois eles "assumiram o risco da produção do previsível resultado, no contexto do dolo indireto eventual, em decorrência das queimaduras e asfixias provocadas pelo fogo". Todos foram indiciados pelo crime de homicídio doloso qualificado e 14 vezes por tentativa de homicídio.

Em sua investigação, o delegado listou as circunstâncias consideradas na investigação: "o conhecimento de que diversos atletas da base residiam no contêiner; estrutura incompatível com a destinação; contêiner com diversas irregularidades estruturais e elétricas; ausência de reparos dos aparelhos de ar condicionado instalados no contêiner; ausência de monitor no interior do contêiner; recusa de assinatura do Termo de Ajuste de Conduta (TAC) proposto pelo Ministério Público para que fosse regularizada a situação precária dos atletas da base; piora das condições do alojamento dos jogadores da base, inclusive, no que se refere a segurança contra incêndio; descumprimento da Ordem de Interdição do CT editada pelo Poder Público Municipal por falta do alvará de funcionamento e do certificado de aprovação do Corpo de Bombeiros; e pluralidade de multas impostas pelo Poder Público Municipal diante do descumprimento da Ordem de Interdição".

Por meio de nota enviada à imprensa, Bandeira de Mello afirmou: "Fui surpreendido com a notícia de hoje (ontem), que recebi de vocês (imprensa) e que, obviamente, não esperava receber. Nem eu nem meus advogados tivemos ainda acesso à íntegra do relatório, apenas aos trechos que foram divulgados pela imprensa. Por esse motivo, não posso declarar nada a não ser que estou com a consciência absolutamente tranquila e que confio na Justiça.

Também por merio de comunicado oficial, a NHJ informou que "embora não tenha tido acesso ao relatório, entende que os trabalhos periciais estão incompletos, razão pela qual, no último dia 3 de junho, apresentou petição à autoridade policial com quesitos complementares dirigidos aos peritos do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE). Sendo assim, o encerramento dos trabalhos investigativos neste momento, sobretudo com a imputação de responsabilidades pessoais a título de dolo eventual, não traduz a completa elucidação dos fatos". O Flamengo, por sua vez, não se manifestou sobre o caso.

Relembre a tragédia

O incêndio no Ninho do Urubu aconteceu no dia 8 de fevereiro deste ano e deixou 10 jovens mortos - Athila Paixão, de 14 anos; Arthur Vinícius, 14 anos; Bernardo Pisetta, 14 anos; Christian Esmério, 15 anos; Gedson Santos, 14 anos; Jorge Eduardo, 15 anos; Pablo Henrique, 14 anos; Rykelmo de Souza, 16 anos; Samuel Thomas Rosa, 15 anos; e Vitor Isaías, 15 anos. Outros três atletas ainda ficaram feridos e tiveram de ser hospitalizados: Kauan Emanuel, 14 anos; Francisco Dyogo, 15 anos; e Jhonata Ventura, de 15 anos. Jhonata foi que apresentou o quadro mais grave, com queimaduras em 30% do corpo.

Os jovens dormiam em contêineres e o fogo teria começado após um curto-circuito em um aparelho de ar-condicionado de um dos dormitórios. À época, os alojamentos não estavam totalmente cheios porque, devido ao temporal do dia anterior, os treinos haviam sido cancelados e muitos jovens retornaram às respectivas casas.

Durante a apuração do caso, foi apontado que o local onde estavam os alojamentos, segundo a planta original, seria destinado a um estacionamento e, portanto, não poderia ter tais estruturas.

Após o incêndio, iniciou-se uma batalha entre o clube e as famílias das vítimas. Inicialmente, nas reuniões entre as partes, a diretoria rubro-negra não aceitou os valores propostos pela Defensoria Pública. Depois de todo um imbróglio - em um período que, inclusive, o Fla se pronunciava apenas através de notas à imprensa -, as negociações foram individuais e, até o momento, apenas quatro acordos foram fechados: com os familiares do Athila, Gedinho, Jhonata Ventura e com o pai do Rykelmo (a mãe permanece em negociação).