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Como Tabárez rompeu fronteiras do Uruguai e virou guru mundial de técnicos

Óscar Tabárez comanda a seleção do Uruguai na primeira rodada da Copa América, contra o Equador Imagem: Thomás Santos/AGIF

Bruno Grossi, Marinho Saldanha e Thiago Fernandes

Do UOL, em São Paulo, Porto Alegre e Belo Horizonte

20/06/2019 04h00

São 13 anos ininterruptos à frente da seleção uruguaia, com três Copas do Mundo seguidas disputadas e um título da Copa América. Óscar Tabárez devolveu o orgulho ao país que era potência mundial no início do século passado, mas que perdeu força com o passar das décadas. Virou o "Maestro" para os celestes e conseguiu transcender as fronteiras de sua nação. Conquistou recordes históricos e hoje é uma espécie de guru para outros grandes técnicos sul-americanos.

Tite é um dos seguidores de Tabárez. O treinador da seleção brasileira já chegou a assistir palestras do uruguaio e o tem em alta conta pela trajetória no esporte e pelo exemplo de vida. Mesmo com limitações físicas geradas por uma doença, Tabárez segue aplicando os treinos da Celeste e pede uma cadeira separada do banco de reservas para poder ficar mais próximo do time no gramado.

Seus métodos e resultados chamam a atenção na Europa, principalmente pela forma como mobiliza grandes estrelas. Giménez, Godín, Suárez e Cavani jogam em times badalados do futebol europeu e fazem questão de exaltar a qualidade do trabalho de Tabárez na seleção uruguaia.

"Quando os resultados aparecem, o trabalho tem transcendência maior. E os meios de comunicação são incríveis, a quantidade de gente que pode ser atingida, e isso pode levar a que me visem de uma maneira que não ocorreu antes. Mas já digo que não tomo como algo pessoal. Eu valorizo o processo que estamos fazendo, com integração com as seleções de base. É um processo que nem todo treinador tem. Me surpreende muitas vezes que se fale na Europa do que se faz na seleção do Uruguai. Ou aqui no Brasil. Fico muito agradecido, mas com humildade e calma", diz o comandante celeste.

Os métodos e princípios ganharam tanta fama, que o técnico chegou a receber um convite incomum antes da Copa da Rússia, no ano passado. O colombiano Juan Carlos Osorio, ex-São Paulo e então à frente do México, pediu a Tabárez um encontro. Queria conversar, trocar ideias sobre futebol e, acima de tudo, aprender. Foram três dias de contato com o uruguaio, suficientes para que Osorio ficasse impressionado. Outros treinadores, sem a possibilidade de encontrá-lo, apelam para ligações e tentam ao máximo absorver informações.

Mas o que há de tão diferente no trabalho de Tabárez? Há alguns elementos que parecem pequenos, irrelevantes, à primeira vista, mas que para ele são preponderantes. Não são detalhes nos treinamentos ou nos jogos. São ajustes de convivência e respeito, acima de tudo.

O começo da passagem atual de Tabárez pelo Uruguai foi marcado por uma reformulação extrema do elenco, em que jogadores talentosos perderam espaço por não serem aplicados e dedicados em campo, muito menos exemplos fora de campo. Diego Forlán foi a estrela sobrevivente dessa geração e, não por acaso, o condutor do histórico quarto lugar na Copa de 2010, na África do Sul.

Ali se formou uma nova identidade da seleção. Suárez e Cavani tiveram essas referências para crescer na carreira e hoje são os espelhos para uma nova geração, que inclui Arrascaeta, do Flamengo. O meia diz que o diferencial de Tabárez está justamente no trato pessoal com os atletas.

"Ele é muito diferente dos demais, porque é um técnico que costuma ser direto com os jogadores e fala sempre a verdade, sempre sem perder a educação. Quando há algo, ele é bem direto. Gostamos muito do trabalho dele aqui na equipe", disse o flamenguista.

Essa espécie de código de ética chegou a ameaçar Suárez, por seu currículo de confusões em campo, e até mesmo Diego Lugano, capitão celeste por boa parte desses 13 anos de gestão Tabárez. O ex-zagueiro e atual superintendente de relações institucionais do São Paulo estava no Fenerbahçe, da Turquia, quando brigou feio com um técnico e recebeu uma dura de Tabárez pelo ato de indisciplina.

"São pensamentos, ideias que vamos tendo com o decorrer dos acontecimentos. Foi acontecendo, conseguimos coisas, classificamos para Mundiais, fomos bem, Copa América... E isso foi gerando um bom ambiente para que, através dos jogadores, das relações que temos criar um processo de empatia", valoriza Tabárez.

Para que jogadores mais famosos não tirem os pés do chão ou se deslumbrem, o técnico uruguaio faz questão de um tratamento igualitário a todos e que todos convivam, aprendendo a respeitar diferenças e trocar experiências. É por isso, por exemplo, que as refeições da seleção são feitas em mesas redondas e grandes, onde é possível que todos escutem quem fala. Na maioria das equipes, são usadas mesas compridas, em que pequenos grupos se formam, mas sem uma comunhão, ou ainda mesas menores, separando de vez esses pequenos grupos.

O mesmo princípio faz com que a concentração seja feita em quartos com três pessoas, enquanto boa parte dos elencos fica, no máximo, em quartos duplos. Na seleção brasileira, muitas vezes, são cômodos individuais. São estímulos constantes à convivência social.

Só que todos esses elementos invejados e elogiados por tanta gente não impedem que existem críticas no próprio Uruguai. Tabárez é visto como um técnico tão apegado a seus métodos e ideais que muitas vezes beira a teimosia. É um questionamento que envolve o engessado esquema tático, com duas linhas de quatro e os dois atacantes famosos na frente.

Outra ponderação feita a Tabárez envolve também os dirigentes da Associação Uruguaia de Futebol (AUF). Há um consenso de que nenhum substituto foi preparado para substituir o Maestro, que tem contrato até o fim da Copa de 2022, no Qatar. Auxiliares antigos já deixaram a comissão para outros projetos, como Juan Verzeri, que trabalha com Diego Aguirre, ou Fabián Coito, que comanda a seleção de Honduras.

O fato é que Tabárez tem mais uma chance de fazer história. Nesta edição da Copa América, o Uruguai apresentou um dos melhores rendimentos da primeira rodada, ao golear o Equador por 4 a 0. E hoje, às 20h, pode chegar a ter a melhor campanha da primeira fase se vencer o Japão na Arena do Grêmio, em Porto Alegre.

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