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Jonathan Wilson: 'A Euro 2016 foi o fim do jogo de posse de bola?'

13/07/2016 13h50

"Então, acabou, o pior dos 15 campeonatos europeus até hoje. Um torneio tão sem qualidade que o País de Gales tranquilamente venceu a Bélgica naquele que foi denominado o menor clássico da competição. De 51 jogos disputados, talvez, apenas a vitória da França sobre a Alemanha será lembrada - e, na verdade, não representou o que foi o resto do torneio.

Muitos questionaram se Portugal foi digno para vencer: nenhum campeão, talvez, nunca, teve uma filosofia tão representativa em um torneio. Dois atacantes deixaram suas próprias características ofensivas para ajudar oito homens que concederam um gol em 420 minutos, e ganharam apenas uma partida no tempo normal durante toda a competição: isso é o tal do futebol moderno.

Sim, aconteceram partidas empolgantes para algumas minorias, os torcedores da Islândia e do País de Gales vão lembrar da França com carinho. Mas isso parece como outro ponto de partida para a morte do futebol internacional, considerado de elite. Ainda assim, permanece sendo dos menos poderosos.

Apesar de realmente ter sido como uma batalha de David contra Golias, Golias estava cansado após uma longa e lucrativa temporada do Campeonato Inglês, perguntando para si mesmo o que estava fazendo ali, quando as recompensas de um jogo pelo seu clube eram muito maior.

A questão é o que nós aprendemos taticamente com o torneio? Não é como em 1958, ano em que o Brasil venceu sua primeira Copa do Mundo e mudou o futebol. Nem 1974, com a Holanda confirmando a eficiência do 'Futebol Total', com Ajax e Feyenoord. Nem 1986, com o encantamento pelas defesas formadas com três jogadores. A relação da Euro 2016 com o jogo praticados pelos clubes é indireta e, talvez, mais psicológica do que tática.

Ainda temos Pep Guardiola, que com o tiki-taka do Barcelona, frequentemente alcançava 70% ou mais da posse de bola. No começo, todos entraram em pânico e tentaram trabalhar de outras formas para ficar com a bola e, então, no auge do sucesso da Internazionale, na semifinal da Champions League de 2010, foi descoberto que o jeito de vencê-los era deixa-los com a posse de bola. José Mourinho, técnico da equipe italiana naquela ocasião, desafiou a regra do Barça e um novo paradigma surgiu.

Equipes neste torneio estão ansiosas para assumir um papel reativo. Muitos jogos pareceram quase que uma batalha para não se tomar a iniciativa, uma lenta corrida sem se preocupar com a posse de bola. Jogos com pressão, de dois times que, na verdade, vão de encontro um ao outro, fazendo o espetáculo mais emocionante - a maior ambição é colocar oito homens atrás da bola.

Estatísticas, neste caso, são simplesmente escorregadias, mas há um número aproximado de que 49% dos jogos teve uma uma equipe com 60% mais posse de bola do que os 37% dos jogos da última temporada do Campeonato Inglês. Em outras palavras, metade dos jogos foram essencialmente ataque contra defesa.

Esse não é necessariamente um problema. A Alemanha teve 66,8% de posse de bola contra a França, e se o lado que busca maior movimentação na partida tem uma ideia clara de como atacar, assim como a França fez em Marselha, a disparidade da posse de bola pode produzir grande dinâmica no jogo. Mas, quando um time essencialmente comporta-se como um saco de pancadas, raramente vale a pena assistir a tal jogo.

Esse é o segredo sujo da FA Cup (Copa da Inglaterra): pessoas não acompanham às fases iniciais da competição porque simplesmente não são bons jogos. Os confrontos, que são seitas, por definição, raramente, mesmo com equipes da Premier League sempre são definidos contra oponentes mais fracos, assim os jogos que não têm a participação de um clube da elite do futebol inglês, sempre são menos visados.

Mas, em nível internacional, isso é ainda pior. Jogadas de ataque não são bem treinadas como são nos clubes, a falta de tempo torna impossível para construir um bom entrosamento, algo que iria ajudar um corte lateral em meio a uma defesa bem postada, por exemplo. A Alemanha foi capaz de fazer isso contra a Eslováquia, mas isso porque os alemães têm um meio de campo criativo, com Toni Kroos, Thomas Müller e Mesut Özil, que jogaram juntos durante anos. Eles são uma raridade.

Isso pode ser entendido como elitismo. Não é. Todo mundo tem a chance de se qualificar para a Eurocopa. Os times menores que causaram impacto - País de Gales, Islândia e até mesmo a Irlanda do Norte - teriam qualificado para um torneio de 16 equipes porque foram bons o suficiente. Veja a França mais as 15 melhores equipes da fase de classificação, as únicas diferenças para os últimos 16 seriam a Hungria e Irlanda nos lugares de Áustria e República Checa: 36 jogos, a maioria deles sem brilho, ao longo de um período de duas semanas.

Isso pode ser entendido como uma reclamação sobre aqueles times que defendem. Não é. Equipes mais fracas devem se defender. Sua obrigação é a de obter o melhor resultado possível, senão não pode ser um tipo de esporte. Isso pode ser inspirador, mas quando os ataques são pobres, tende a ser maçante.

Em vez disso, este é um lamento sobre o melhor dos torneios internacionais, que dura pouco mais de três semanas. Vimos a qualidade ser destruída pela ganância, oportunismo político e a mentalidade de que todos podem ter uma chance, algo que inspira a mediocridade. Só porque a Euro 2012 também foi um torneio decepcionante não muda o fato de que as últimas três Eurocopas foram excelentes. O futebol internacional está se afogando na diluição de qualidade. Já a Euro 2016, talvez, será lembrada como o primeiro torneio homeopático."

Jonathan Wilson - Jornalista do 'The Guardian'