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Premiado, francês que trabalhou no Brasil aposta na Seleção de basquete

04/08/2016 07h50

Premiado como melhor técnico da França na última temporada e com passagem pelo basquete brasileiro, Julien Martin conhece bem a realidade dos dois países. Nascido no país europeu, o treinador, que trabalhou no Saldanha da Gama, acredita que a Seleção tem mais chances de conseguir uma medalha na Olimpíada do Rio de Janeiro do que seus compatriotas.

A França que vem para o Rio de Janeiro fez parte da vida de Martin. O treinador conhece o ala-pivô Joffrey Lauvergne desde os 11 anos de idade. Mesmo assim, acredita que o fator casa será determinante para o Brasil na busca por medalha.

Especialista em basquete de base, Martin pôde acompanhar de perto como se dá a formação de jogadores no país. Além de jogar campeonatos pelo país inteiro com os jovens do Saldanha da Gama, o francês foi convidado por Ricardo Oliveira para acompanhar a Seleção sub-15. De acordo com o treinador, potencial não falta para os jogadores: o problema está na gerência, desde os técnicos até a Confederação Brasileira de Basquete (CBB).

Em sua passagem pelo Saldanha da Gama, Martin viveu de perto a dificuldade para o trabalho de base no Brasil. Chegou a colocar recursos do próprio bolso para viabilizar viagens e treinos com a equipe capixaba.

Excelência para opinar sobre a questão não falta para Martin. De volta para seu país natal, foi eleito o melhor técnico de base da temporada passada pelo Pau-Lacq Orthez. Antes disso, foi convidado para acompanhar o Los Angeles Clippers na Liga de Verão da NBA.

Agora, a partir de sábado, Martin poderá se alternar entre jogos da França e do Brasil, já que os europeus estão no grupo A e a Seleção, no B. Será que ele também é bom de palpite?

Confira um bate-bola exclusivo com Julien Martin:

Que memórias você tem de sua passagem pelo Espírito Santo?

Tenho boas lembranças. Foram seis anos com muitos bons momentos. No Espírito Santo, tive a sorte de encontrar o professor Guilherme Salazar. Ele queria realmente fazer as coisas de uma forma inovadora. Eu acredito que fizemos um trabalho diferenciado e que deu para colher frutos rapidamente. Hoje, temos atletas nos melhores clubes brasileiros, mas também temos atletas na Universidade Federal do Espírito Santo. Sucesso no basquete e nos estudos era o foco do projeto, e temos muito orgulho dos resultados.

É verdade que você trabalhava de maneira voluntária e que chegou a colocar recursos do próprio bolso para cuidar dos meninos?

A gente cobrava uma mensalidade que não era sempre paga, e a maioria dos atletas era bolsista. Na realidade, a verdade era que éramos voluntários e que muitas vezes o dinheiro voltava para eles. Por exemplo, com as rifas que os meninos estavam fazendo para financiar viagens para torneios com o clube ou a seleção do estado. Na maioria do tempo, a gente pagava várias coisas. Quando eu voltava da França, comprava muito material, como bolas ou tênis. Também compramos uma academia completa. Sei que ficou realmente difícil para nossas famílias. Agradeço aqui a paciência das nossas esposas, mas acreditamos que o esforço era necessário e que tínhamos que fazer de tudo e mais um pouco para dar o melhor possível para os nossos atletas.

O quanto as categorias de base do Brasil estão atrasadas em relação às da França?

Potencial o Brasil tem. Eu tive tempo para observar isso: primeiro em competições de base no Brasil todo, e depois deu para ver os jovens brasileiros em competições internacionais. Fui convidado pelo Ricardo Oliveira para seguir a Seleção sub-15 dele. Isso me deu uma visão bem precisa da situação, e quero agradecer o Ricardo por isso aqui.

O atraso não vem do potencial dos atletas. Então, a responsabilidade é primeiramente dos técnicos e depois, insisto, bem depois é dos clubes, das federações e, finalmente, da CBB.

Meu ponto de vista é que são os técnicos que estão com os jogadores no dia a dia. É fácil ter acesso a informações de qualidade: tem artigos, vídeos e até formação online feita pela Fiba. Não tem como não aprender o melhor para seus atletas. A responsabilidade do nível técnico, tático e físico é bem do técnico, né? Os problemas de clubes, federações e confederação existem no Brasil como em qualquer país do mundo, talvez no Brasil são maiores, mas tem lugar que é pior. Para mim, isso é política e tem pouco a ver com basquete.

Eu prefiro dizer que, se alguém tem culpa, são os técnicos, porque acredito que eles podem mudar a situação mais rapidamente do que a política. Não é necessário ser o melhor técnico do mundo para compensar o resto.

Quem tem mais chances de medalha no Rio: Brasil ou França?

Por jogar em casa, acredito que o Brasil tem uma chance maior. O trabalho na base ajuda a seleção adulta com certeza, mas o impacto é maior no campeonato nacional do que na seleção. Um time nacional precisa de dois ou três gênios, e esses caras vão sair de qualquer jeito. Pelo talento que têm, só precisam de uma bola, de uma quadra e de um técnico que não estrague tudo.

Então, se você relaciona trabalho de base com níveis de seleções, é mais fácil ter uma seleção adulta forte que um campeonato forte. Para mim, isso explica os níveis iguais entre a França e o Brasil.