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Castelo Vermelho: Clube sírio é a última fortaleza de Aleppo

Cidade de Aleppo, na Síria, foi devastada pelas disputas armadas na região - Omar Sanadiki/ Reuters
Cidade de Aleppo, na Síria, foi devastada pelas disputas armadas na região Imagem: Omar Sanadiki/ Reuters

31/12/2016 07h35

''Estamos sofrendo muito''. A frase é de autoria de um jovem atacante de 21 anos, nascido na cidade síria de Aleppo. O local é palco de uma guerra civil desde 2011, quando o conflito entre forças pró-governo de Bashar al-Assad e rebeldes se intensificou na região.

- É difícil. Treinamos em uma área controlada pelo governo sírio, mas estamos sofrendo muito. Minha família está fora do país, eu moro sozinho nas dependências do clube de Aleppo - contou Tarek Hindawi, em entrevista ao LANCE!

Tarek é formado nas categorias de base do Al-Ittihad Aleppo. O time de futebol, aliás, é um dos mais populares do país ao lado do Al-Karamah, na cidade de Homs, que fica aproximadamente a 300 km de Aleppo. O clube, também conhecido como Castelo Vermelho, disputa a primeira divisão síria, o que parece ser inimaginável para quem compartilha do terror da guerra.

- Jogamos futebol porque queremos dar alegria ao povo sírio. É um momento difícil, mas o futebol se mostrou a única maneira de quebrar tantos muros que se construíram por causa da guerra.

Os muros mencionados por Tarek não são apenas físicos. No conflito da Síria, que se estende para chegar ao sexto ano consecutivo, diversos grupos de interesses distintos também travam batalhas ideológicas. No local, além do conflito entre rebeldes e governo, ainda disputam o poder grupos jihadistas como o Estado Islâmico e Jabhat Fateh al-Sham, antes conhecido como Frente Nusra e que era o braço da Al Qaeda na Síria.

Apesar de um cessar fogo firmado entre Rússia e Turquia, que apoiam lados opostos dos principais envolvidos na guerra, nesta semana, a dor pela perda de tantas vidas jamais será esquecida. Segundo a ONU, a guerra na cidade que já foi o principal centro financeiro da Síria, resultou na morte de mais de 300 mil pessoas. Dentre elas, o irmão mais velho de Tarek, executado por um grupo terrorista, conforme afirmou à reportagem.

Dentro da área protegida em que treina o Al-Ittihad, o atacante já se acostumou com o tremor de terra e com os barulhos provocados pelas bombas. Algo que não deveria ser natural, mas que faz parte de sua rotina. Os jogos do clube já não ocorrem na cidade de Aleppo e Tarek precisa abandonar seus torcedores para poder cumprir seu papel como jogador de futebol. Mesmo assim, é neste cenário que o atacante sonha com um futuro diferente.

- Já recebi propostas de outros clubes, mas por conta do regime (que dificulta ou até mesmo impede a saída de civis do país) não pude aceitar. Agora, penso nas qualificatórias para a Copa do Mundo de 2018. Tenho a ambição de ir para a competição na Rússia. É uma forma de passar felicidade ao povo sírio - declarou.

Apesar das circunstâncias, o futebol segue no país do Oriente Médio. O clube de Tarek Hindawi terminou em terceiro lugar na última temporada no Campeonato Sírio e é um dos favoritos nesta edição da competição. Atualmente, após a segunda rodada, a equipe está na quarta colocação, com quatro pontos somados. Sem dúvida, o time do Castelo Vermelho é última fortaleza viva de Aleppo.

SONHOS E GRATIDÃO

Durante toda a entrevista, Tarek fez questão de agradecer o interesse pelo seu país. Ressaltou por diversas vezes que a situação é complicada, mas que o povo sírio é muito esperançoso. A mensagem de gratidão é também um grito que busca ecoar para além de Aleppo. Se lá dia e noite se confundem pelas fumaças geradas por inúmeras bombas que deixam escombros por todos os lados, fora da Síria não há cortinas que encobrem a destruição do país.

- Eu agradeço imensamente o interesse. Gostaria de continuar falando da Síria e do povo sírio. É importante! Gostaria que todos pudéssemos voltar a seis anos atrás (antes da guerra), quando nossa nação vivia com segurança. Nós, jogadores, não vamos desistir de alcançar nossos sonhos: acabar com as barreiras e também o de conseguir a classificação para a Copa do Mundo na Rússia.

Tarek Hindawi é um dos símbolos de sua geração. Nascido em dezembro de 1995, na cidade de Aleppo, na Síria, o jovem atacante convive com a guerra civil que afeta o país desde março de 2011. Ele também foi o capitão da seleção síria na categoria sub-20, no ano passado.

ASTROS PUXAM FILA PARA A SOLIDARIEDADE À SÍRIA

Astro do Real Madrid, Cristiano Ronaldo também se solidarizou com as vítimas da guerra na Síria. Em uma rede social, o português deixou uma mensagem de natal aos fãs e lembrou-se do conflito no país do Oriente Médio.

- Vocês têm sofrido bastante. Eu sou um jogador famoso, mas vocês são os verdadeiros heróis. Não percam a esperança. O mundo está com vocês. A gente se preocupa com vocês. Eu estou com vocês - disse Ronaldo, que é embaixador da instituição social 'Save the Children'.

O lateral da Juventus, Patrice Evra, também lembrou das crianças afetadas pela guerra. Pelo Instagram, o francês chegou a oferecer ajuda.

- Ao invés de desejar a todos um feliz natal, eu espero que vocês tenham todos da Síria em seus corações e incentivo que seus presentes de natal possam ajudar outras pessoas. Nós somos iguais e nesse mundo nós temos o dever de ajudar uns aos outros. Juntos podemos fazer do mundo um lugar melhor - escreveu, complementando em mensagem de vídeo:

- Nós precisamos ajudar essas crianças. Se pessoas realmente sérias na Síria querem ajudar essas família, eles podem me contatar pelo Instagram.

De acordo com levantamentos da Unicef, mais de 5,5 milhões de crianças foram afetadas pela guerra civil na Síria, incluindo as que morreram, as órfãs e as que vivem em campos de refugiados ao redor do mundo.