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Com 20 anos de profissional e pronto para mais uma temporada, Valdomiro avisa: 'Tenho lenha para queimar'

16/01/2017 07h45

De estilo imponente, vigoroso e sem papas na língua. Esse sempre foi Valdomiro, zagueiro com passagens por Bahia, Palmeiras e mais recentemente pela Portuguesa. Aos 38 anos, 20 deles dedicados ao futebol profissional, ele inicia sua trajetória em um novo clube, o Anápolis, que disputa a primeira divisão do Campeonato Goiano.

Apesar da idade e de admitir que já vê o fim da carreira, descarta a aposentadoria tão cedo, ainda diz ter muito a dar para o Anápolis e para o futebol. Segundo ele, assim que se sentir sem condições de jogo, pedirá para sair de cena.

- O que eu tinha pra ganhar eu já ganhei em termos financeiros. Gosto dos desafios e de jogar futebol, sem contar que ainda eu tenho condições de atuar em alto nível. Quando não tiver condições eu paro, peço as contas, por respeito a mim, ao clube e aos torcedores, não quero enganar ninguém. Tudo tem um começo, um meio e um fim, já vejo o meu fim, mas ainda tenho muita lenha pra queimar - afirmou em entrevista ao LANCE!.

A motivação para aceitar mais um clube na carreira, após jogar a temporada 2016 pelo JMalucelli, do Paraná, vem justamente da paixão pelo esporte. Assim, foi seduzido pelo time goiano, vice-campeão estadual no ano passado, para ser referência no elenco.

- Tive um convite do gerente de futebol, ele me falou do projeto, perguntou se eu estava bem, eu já vinha me preparando. Gostei dos objetivos, é um time em ascensão. A torcida comparece, tem média de oito na nove mil torcedores por jogo, o prefeito da cidade compra uma parte dos ingressos e distribui. Outro dia, em um jogo-treino contra o Brasiliense, tinha 50 torcedores no CT, isso me motiva - contou.

Ser a referência de uma equipe não é novidade para Valdomiro. Não foram poucas as vezes em que o jogador chamou a responsabilidade, tanto nas horas boas e, principalmente, nas ruins. No Anápolis ele promete que será igual e sem arrependimentos.

- Sempre falei o que pensei e não me arrependo, tinha que falar na hora e falei. Se errei fez parte do aprendizado, do amadurecimento. Sempre briguei pelos meus direitos, dos meus companheiros e dos clubes pelos quais passei. No vestiário também. A verdade ninguém quer ouvir, mas ela é necessária. Olhar na cara do companheiro e falar o que pensa. O cara pode ficar puto na hora, mas depois ele vai ver que eu estava certo - argumentou.

Muitas das vezes em que Valdomiro se expôs foi durante sua passagem de quase quatro anos pela Portuguesa. Identificado com clube, ele viveu momentos complicados de má administração, salários atrasados e rebaixamento, que culminaram na atual e deprimente situação da Lusa. O zagueiro, porém, vê uma luz no fim do túnel com a reestruturação iniciada no ano passado.

- Eu tenho muito carinho pelo clube, aprendi a gostar, acompanho muito. A situação é triste, mas vejo mudança. O principal reforço da Portuguesa nos últimos dez anos se chama Emerson Leão, pode escrever aí, ele vai ser de grande importância para essa mudança. O presidente Alexandre Barros é um cara que eu conheço, muito sério, tem ideias boas, se ele cumprir metade do que prometeu na campanha, eu já vou aplaudir - finalizou.

BATE-BOLA VALDOMIRO, ZAGUEIRO DO ANÁPOLIS

Em 2017 você faz 20 anos de profissional, certo? Como se sente neste ponto da carreira?

Rapaz, faz 20 anos mesmo, estou ficando velho. Mas isso é fruto de respeito ao meu corpo, de me cuidar, de levar a sério. Jogar futebol é a minha paixão, não foi à toa que cheguei até aqui com 38 anos e podendo jogar de igual para igual com garotos de 22, 25 anos. Sempre me cuidei, claro que não deixei de viver, mas tudo dentro de um profissionalismo. Posso não ter a recuperação de um jogador mais jovem, mas faço os mesmos treinamentos, mantenho meu percentual de gordura de 11%, que é exigência do clube. Estou feliz e motivado.

Você passou seis anos fora do país, o que isso te trouxe de experiência?

Acho que acima de tudo o respeito, respeito pelo esporte, pelos horários, pela disciplina, pelos companheiros. Chegando lá na Europa você tem que pegar o primeiro ano para aprender, tendo oportunidade ou não, aí no segundo ano, você arrebenta. Por isso que os brasileiros voltam cedo, não tem essa paciência.

Como vê essa nova geração de jogadores?

Essas redes sociais estão acabando com eles. Porque quem olha parece que é tudo maravilhoso, mas ninguém sabe quantas coisas obscuras e quanta dificuldade a gente passa. Muitas vezes passam uma imagem que não existe, de uma felicidade que não é real. Eu não gosto dessas coisas, acho que tira o foco verdadeiro que é jogar futebol.

Você tenta aconselhar ou conversar com esses garotos?

Com certeza, mas vai de cada um querer ouvir ou não. Jogador é uma profissão que pode facilmente não dar certo, aí os caras vão lá e fazem piercing, brinco, tatuagem... E se não der certo? Vai chegar com uns 30 anos procurar emprego com aquele monte de tatuagem? Precisa pensar. Só 5% dos jogadores ganham bem no Brasil. Vi muitos que não deram certo, muita gente talentosa.

Acredito que você tenha se deparado com inúmeras situações em sua carreira. Alguma delas te fez se decepcionar com o futebol?

Tem muita coisa, mas não posso falar, não encerrei minha carreira ainda, posso me comprometer, seria até falta de ética falar isso agora, mas quando eu parar vou meter a boca aí, pode esperar, vou falar tudo.

Chegou a pensar em parar em algum momento?

Nunca pensei, apesar de tudo. Sempre foquei no trabalho, em dar o melhor que poderia, sempre quis provar que eu tinha condições de continuar, mesmo que diretores, dirigentes não quisessem, eu provava o contrário.

O que te irrita hoje no futebol?

Jogador costuma culpar o técnico por não jogar, mas não olha para si pra saber se está mal ou não. Poxa, se o companheiro está jogando é porque está melhor naquele momento, ou seja, tem que trabalhar mais, mostrar serviço e esperar a oportunidade, quando entrar, fazer o melhor que pode. Titular ou reserva, vai receber o mesmo salário, não tem porque se reclamando, é trabalhar. Isso me irrita.