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Adversários no Brasileirão, Ponte e Chape 'incomodam' gigantes com profissionalismo e contas em dia

11/06/2017 09h05

Ponte Preta e Chapecoense se enfrentam neste domingo, às 16h, no Moisés Lucarelli. O jogo, válido pela 6ª Rodada do Campeonato Brasileiro, também coloca frente a frente dois clubes que vêm mostrando modelos de gestão de sucesso, principalmente por não estarem entre os grande do país e não desfrutarem de recursos vultuosos para competir com os rivais.

De 2013 para cá, ambos se mostram em ascensão, tanto nos resultados de campo quanto fora dele. No mesmo período chegaram à decisão de Copa Sul-Americana, subiram de divisão e garantiram posições honrosas na primeira divisão do país. Resultados invejáveis se comparados com algumas das potências que atuam nas mesmas competições.

Em conversa com o LANCE!, dirigentes das duas agremiações foram enfáticos e concordaram com o que é a base dessas duas boas gestões: a consciência financeira.

- É um clube que não tem dívida tributária, não tem endividamento, clube que paga rigorosamente em dia seus profissionais, não tem atraso salarial, os atletas recebem a cada 15 dias, seja salário, seja imagem. Você tem atletas absolutamente satisfeito com seus valores, tudo é pago de forma adequada e correta - declarou Rui Costa, diretor-executivo da Chape, ao LANCE!

- Temos uma folha salaria enxuta, de acordo com o que a Ponte Preta pode pagar, as despesas não podem ser maiores do que as receitas, a gente trabalha nesse sentido para que a Ponte possa caminhar com as próprias pernas e manter as contas em dia. Isso tudo gera um bom ambiente e possibilita que o clube fique cada vez mais forte - afirmou Giovanni Dimarzio, vice-presidente da Macaca também ao LANCE!.

A Chapecoense passa por uma situação especial, em que viu o clube ser devastado por uma tragédia no fim do ano passado que matou quase todos os seus jogadores, comissão técnica e alguns dirigentes. O processo de reconstrução, porém, acabou sendo muito menos doloroso e prejudicial não fosse uma mentalidade que já havia sido estabelecida antes do acidente. Não à toa, em pouco tempo de trabalho, já carrega o título catarinense de 2017.

- Por mais que eles estivessem envolvidos com o luto, com a tristeza, por mais que eles tivessem velado dezenas de amigos, eles conseguiram um espaço para o profissionalismo na Chapecoense, contrataram profissionais de mercado capacitados para fazer o processo de reconstrução. Mesmo nesse momento de dor em que seria natural tomar uma decisão emocional, eles tiveram a capacidade de fazer um projeto profissional - ressaltou Rui Costa.

Além da tragédia, o time da cidade de Chapecó enfrenta outro grande obstáculo, algo que compartilha com a equipe campineira: a diferença de orçamento em comparação com os chamados gigantes. O desafio de construir um elenco competitivo e ao mesmo tempo financeiramente responsável ronda as portas das agremiações consideradas menores. A Ponte Preta, por exemplo, eliminou Santos e Palmeiras no Paulistão, disputou a final contra o Corinthians e no último domingo derrotou o São Paulo, pelo Brasileirão. Para alcançar esses resultados foi preciso arranjar estratégias para agir no mercado.

- É muito difícil brigar e disputar com times que tem uma folha salarial muito maior, porque enquanto você tem uma folha de "x", outros clubes tem "5x", "7x", "10x", então é complicado. A gente tem que ter um bom ambiente de trabalho e investir em promessas, em jogadores que ainda estão surgindo no mercado, pra que a gente possa ter esse retorno dentro de campo. Claro que a Ponte neste ano está com jogadores já renomados, que têm muita história no futebol, como o Rodrigo, como o Cajá, como o Sheik, como o Aranha, como o Bob, como o Wendel, e isso também é importante, ter um meio termo, jogadores que estão surgindo e equilibrando com jogadores de experiência - explicou Giovanni Dimarzio.

Embora as gestões rendam elogios atualmente, ambos os dirigentes sabem que o futebol pode ser ingrato quanto aos esforços administrativos. Os resultados negativos, tropeços, falhas humanas, podem custar o projeto fora de campo. Se as finanças são programadas de médio a longo prazo, o sucesso no gramado precisa ser imediato.

- Quanto mais os clubes forem rigorosos com o orçamento, os executivos forem equilibrados na questão dos jogadores, eu acho que isso vai mostrar a competência dos gestores, mas tem que ganhar, porque talvez se a gente não tivesse ganhado o catarinense, tudo o que eu estou te dizendo aqui seria poesia - disse Rui Costa.

- Não adianta a gente montar um time agora que vá bem no ano que vem, porque se neste ano a gente fizer um campeonato ruim, a gente pode ser rebaixado, pode gerar uma crise, uma instabilidade, o que é sempre muito ruim para o futebol. Então a gente tem trabalhar a médio prazo, investindo em categoria de base, investindo em contratos mais longos, em que a gente possa segurar o jogador, sempre sabendo que isso tem que ter resultado a curtíssimo prazo - corroborou Giovanni Dimarzio.

Mas enquanto o futebol permanece impiedoso e, por vezes, injusto do ponto de vista administrativo, algumas gestões que tentam se voltar mais ao profissionalismo tratam de plantar suas sementes e dar exemplos. São os casos de Chape e Ponte. Ambos investem nas categorias de base e na criação de ativos que possam render frutos ao clube em alguns anos. Se a taça é o maior prêmio dentro de campo, fora dele deixar um legado parece ser o objetivo.

- A minha meta é que a Chapecoense possa adquirir e vender mais ativos, criar uma fonte de receitas importante a partir de ativos que ela mesmo constrói. Por isso que a gente fez questão de colocar naqueles atletas que a gente via potencial um preço de compra razoável, que se encaixe na nossa capacidade de pagamento, e que possamos realmente contratar um jogador que já custe cinco ou seis vezes mais do que o preço que nós condicionamos - afirmou Rui Costa.

- Nós temos uma receita menor do que a maioria absoluta dos clubes da Série A e por isso nosso grande objetivo é investir na categoria de base, a Ponte Preta hoje tem seis jogadores da base jogando no profissional. É uma área em que essa gestão atua bastante - concluiu Giovanni Dimarzio.

Enquanto a Ponte Preta registrou sua melhor campanha na era dos pontos corridos com o 8º lugar no Brasileirão do ano passado, a Chapecoense é a atual campeão da Copa Sul-Americana, torneio no qual os dois já estão classificados para a próxima fase e esperam repetir campanhas de sucesso. O momento, porém, é de focar na continuidade do bom começo na competição nacional, pela qual se enfrentam neste domingo.

BATE-BOLA COM GIOVANNI DIMARZIO, VICE-PRESIDENTE DA PONTE PRETA:

O planejamento é baseado em metas de curto ou de longo prazo?

Planejamento é sempre baseado a médio prazo, mas o futebol é muito imediatista, isso é normal do torcedor brasileiro, a gente também é, não adianta você falar que está montando um time para estar forte daqui dois anos. O resultado tem que ser agora e é assim que a Ponte Preta trabalha, então diria que é a médio prazo, porém, a resposta tem que ser a curto prazo, porque o futebol é assim, o futebol pede isso.

Acredita que o modelo de gestão da Ponte está à frente de outros clubes considerados maiores?

Eu não gosto muito de comparar, a Ponte Preta ganhou recentemente um prêmio em um instituto renomado, ficou em primeiro lugar, como clube de melhor gestão, mas eu não quero comparar, acho que a Ponte tem que continuar trabalhando como ela vem trabalhando, pensando nela, cuidando da nossa casinha, da nossa gestão, trabalhar, e aos poucos subir mais um degrau, para fazer o clube cada vez mais forte.

Os resultados de campo podem colocar em risco a continuidade do modelo? Ou a solidificação da gestão independe dos resultados?

Os resultados no futebol são imediatos, a torcida cobra, a imprensa cobra, nós nos cobramos como torcedores, já que somos gestores, mas somos torcedores também. Os atletas se cobram, o estafe também, todos. Claro que se os resultados não acontecerem isso pode atrapalhar a continuidade da gestão e do projeto, que envolve o crescimento e o fortalecimento da Ponte Preta. A gente vem trabalhando com muito afinco, já há bastante tempo para fazer a Ponte mais forte e os resultados estão surgindo, eu não tenho dúvida que o clube vem se consolidando como uma grande força e isso vai ser sempre o nosso objetivo e o nosso projeto, é o que a Ponte e a sua apaixonada torcida merecem.

BATE-BOLA COM RUI COSTA, DIRETOR-EXECUTIVO DA CHAPECOENSE:

Como foi o início desse projeto de reconstrução do clube?

Esse projeto, por ser profissional, em um primeiro momento contou com dinheiro de fora, contou com parceria. Eles passaram para mim, para a gestão de futebol, um orçamento muito claro, autonomia absoluta, mas dentro de um limite orçamentário e eu respeitei esse orçamento, inclusive fazendo reuniões semanais com todo o pessoal do administrativo, mostrando como estava o salário e o que eu já tinha gastado do valor que eles já tinham me dado. A área financeira foi muito bem estruturada, foram buscar um profissional do mercado para ser diretor administrativo-financeiro, eles têm uma governança em sintonia com os grandes clubes. Há um discurso, mas acima de tudo uma prática profissional que evolui a cada dia.

Acredita que o modelo de gestão da Ponte está à frente de outros clubes considerados maiores?

Eu acho que ainda temos alguns problemas estruturais, nós temos um CT que não é do clube, nós fizemos uma série de reformas e hoje é um CT totalmente funcional. A Chapecoense tem profissionais de altíssimo nível em todos os setores, de fisiologia, de medicina, de fisioterapia, comissão técnica, enfim, o trabalho e as pessoas são muito qualificadas. Isso nos trouxe a um patamar de excelência que pouca gente saberia e pouca gente conhece. A recuperação que a gente faz dos atletas aqui é algo incrível. Aos poucos isso foi nos trazendo um equilíbrio de forças. Se isso continuar, a Chape caminha a passos largos para ser uma potência do futebol. Claro que não vai ser um Flamengo, não será um Corinthians, um Atlético, um Grêmio, ainda, mas vai se equiparar a clubes médios, com condições muito maiores do que esses clubes médios. Acho que o nosso clube tem uma capacidade de grandeza que talvez nem nós saibamos, por conta da tradição daqui, dos profissionais. Claro que esse processo não é de um ano para o outro, nós temos que passar pela transição, principalmente em 2018, já que 2017 é o ano da transição e 2018 é o ano da maturidade, porque vamos voltar a caminhar com as nossas próprias pernas. Acho que esses dois anos dirão muito o que será a Chapecoense nos próximos dez anos.

Você já estão pensando nesse futuro?

Você não pode montar um elenco a cada anos. Nós já estamos pensando em 2018, já temos aqui catalogado e precificado quanto custa a manutenção desse meu time para 2018, o presidente já tem esse valor. É um valor alto? É. Se eu quiser manter o Reinaldo, o Girotto e todo mundo que está aqui, eu tenho o valor pré-fixado e estabelecido para o meu presidente. Daqui a pouco, se eu vender um jogador por cinco milhões de euros, eu posso investir tudo isso no futebol. Os projetos vencedores são os projetos a longo prazo, o nosso caso aqui é fora da curva, porque não tinha como ter longo prazo aqui, o time e o clube foram devastados. Mas daqui pra frente, mesmo que nesse anos tenhamos uma performance fora da curva, nós temos que pensar nos próximos cinco anos.