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Brasiliense ressurge com filha de ex-senador preso. E ele segue ativo

18/09/2017 07h30

Vice-campeão da Copa do Brasil de 2002, o Brasiliense voltou a aparecer na mídia nacional na última terça-feira, ao anunciar a contratação do lateral-direito Cicinho, ex-Seleção, São Paulo e Real Madrid, atualmente com 37 anos. O clube do Distrito Federal não disputa uma competição nacional desde 2014, quando jogou a Copa do Brasil e a Série D. Porém, após anos de declínio, o time faturou o Campeonato Brasiliense deste ano, encerrando jejum de quatro anos sem ganhar o estadual e garantindo vaga na próxima Copa do Brasil e Série D. Por trás dessa reação está Luiza Estevão, de 20 anos, diretora de futebol do clube e mais jovem dirigente do futebol brasileiro. Apenas tal fato já mereceria destaque, mas outra particularidade na jovem também chama a atenção: Luiza é herdeira de Luiz Estevão, ex-senador preso no Complexo Penitenciário da Papuda (DF) desde 2016, em função da condenação pelos crimes de desvio de verba na obra do TRT-SP. Luiz Estevão é dono do Brasiliense e, com a filha na diretoria, consegue se manter ligado ao clube mesmo de dentro do presídio.

Luiza Estevão vive o Brasiliense, clube fundado em 2000, desde cedo. Caçula de cinco irmãos, sendo três mulheres e dois homens, é a única que se interessou a trabalhar no mundo da bola. Em 2015, Luiz começou a aproximar Luiza do dia a dia do time. No ano seguinte, ela virou diretora e ele foi preso - com pena de 31 anos. Em entrevista ao LANCE!, Luiza falou de suas funções no clube, detalhou as ambições da equipe para 2018 e abriu o jogo sobre a relação com seu pai.

Vinícius Perazzini: Como aconteceu sua entrada na diretoria do clube?

Luiza Estevão: Eu, meio entre aspas, acompanho o Brasiliense desde que tinha três anos, quando o time começou. Tecnicamente, tenho 17 anos de experiência (risos). Comecei a acompanhar o Brasiliense mais de perto em 2015, indo para todos os jogos, entrando no vestiário, acompanhando muito de perto meu pai. Ele viu que, de todos os filhos, eu era a mais ligada ao futebol, então foi me preparando. Aí, quando aconteceu toda a situação que aconteceu (referindo-se a prisão), ele perdeu a condição de trabalhar tão perto do time quanto gostaria. Minha entrada foi uma coisa discutida há muito tempo, não foi uma coisa assim, do nada. No momento, trabalho ligada ao Paulo Henrique, que é o gerente de futebol do clube, e o Rafa (Rafael Toledo), que é o técnico.

Qual é o seu papel no Brasiliense?

Eu e o Paulo conversamos muito, discutimos os nomes que vamos contratar. Na contratação do Cicinho eu fui lá, conversei com ele, falei as nossas expectativas e escutei as expectativas dele. Também entro muito no vestiário e converso com o técnico, que depois repassa as orientações aos jogadores.

Você já sofreu algum tipo de preconceito entre os homens?

?Nunca sofri nenhum ato de preconceito por ser mulher, nem por parte dos jogadores, nem das federações. Sinto que acontece às vezes mais por eu ser nova do que por ser mulher. As pessoas acham até legal, me dão parabéns por ter entrado no meio do futebol. Como eu entro muito no vestiário, às vezes os jogadores recém-chegados estranham um pouco, mas depois eles acostumam.

Como surgiu a ideia de contratar o lateral Cicinho?

Era um jogador que a gente estava olhando há tempos. Quando vimos que ele tinha voltado ao Brasil (em janeiro), a gente começou a debater o nome aqui no clube. Temos um bom elenco e mantivemos a base para 2018. Com a base pronta, fomos atrás de um jogador que fosse muito bom para reforçar o time.

Tem algum outro nome conhecido na mira do Brasiliense?

Ter a gente sempre tem, mas como a apresentação do elenco está chegando, estamos vendo se vamos atrás. O grupo vai se apresentar no fim de outubro e começar a treinar em 1º de novembro. Como não jogamos a Série D deste ano, nossos jogadores estão emprestados e retornarão no finalzinho de outubro.

Seu pai, mesmo da prisão, estava por dentro da contratação do Cicinho?

Ele fica por dentro o máximo que consegue, nunca desfez totalmente do time, mesmo licenciado da presidência. Brinco com ele, falo que o time é o sétimo filho dele, porque ele gosta muito, e era o sonho dele de criança ser presidente de um clube. De duas em duas semanas vou lá falar com ele, ele me pergunta como está o time, procura ficar por dentro. Ele estava por dentro da negociação com o Cicinho. Então, assim, é só por causa da situação (referindo-se a prisão) que agente fez esse arranjo, mas ele participa do que ele consegue participar.

Seu pai segue com voz ativa dentro do clube?

Ele tem opiniões (sobre o clube), o problema é que ele não consegue ficar por dentro de tudo, com detalhes. Ele não pode assistir os jogos, ele não consegue acompanhar o dia a dia tão rapidamente quanto a gente acompanha o que está acontecendo. Mas ele sempre pergunta como está, sempre tem umas ideias e sugestões em cima daquilo que eu falo com ele, está sempre de olho.

Que tipo de sugestões ele dá?

Por exemplo, eu assisto os jogos anotando em um caderno tudo o que acho. Se teve alguma substituição que eu não concordo, se o time está mal... Eu não posso levar o caderno para a visita (nenhum objeto pode entrar), mas conto minhas impressões e ele desenvolve os pensamentos dele. Se falo que a defesa não está indo bem, ele começa com alguma sugestão do que a gente pode fazer, se podemos mudar isso ou aquilo. A visita dura três horas e só familiares podem entrar. Quando volto ao clube, eu falo: "Aconteceu isso, isso e isso".

Qual é o objetivo do clube para 2018 e qual será o tamanho do investimento?

Estamos trabalhando muito para conseguir que o time vá subindo de séries. Da Série D para C, da C para B, até chegar na A, que é o que a gente quer. Então a gente tem que ter um investimento alto, mas dentro do possível. Sem exagero, estamos tentando fazer um bom time. Sobre os valores, a gente não revela.

Como estão os salários e a estrutura no clube?

O pagamento está sempre em dia e o clube oferece boas condições de trabalho. Uma das filosofias que a gente tem aqui dentro é que temos de ter um bom vestiário, mantendo uma boa relação entre diretoria e jogadores.

O Brasiliense ainda tem número expressivo de torcedores no Distrito Federal?

Como o Brasiliense enfrentou sofreu diversas quedas, a gente perdeu um pouco de contato com o grosso da torcida. Mas acho que a torcida está crescendo de novo depois do título deste ano. Tem muito torcedor que vem desde pequeno, que me mostra foto antiga com camisa, que está feliz em ver o time voltando. E, aos poucos, vamos reconquistando os que estão distantes.

Qual é sua formação acadêmica?

Estou fazendo psicologia no UniCEUB aqui de Brasilia, faltam três anos para acabar a faculdade. Estudo de manha e trabalho no clube de tarde. Depois, quero estudar algo relacionado a gestão esportiva. Depois que me envolvi no dia a dia do Brasiliense, ficou difícil eu me ver desapegando disso.

O Brasiliense apresenta, em seu site oficial, ensaios fotográficos com musas do time nuas. O que você acha desse assunto? Concorda com essa exposição?

Isso é uma coisa que vem sendo discutida dentro do clube. Não sou a favor, nem contra. Não tenho uma opinião sobre isso. Isso começou em 2012, antes da minha entrada na diretoria. Deve ter algum público fiel que fica olhando a página, mas não me envolvo com isso. O problema do site é que ele está parado há tempos. Como o time deu uma caída, a TV do clube acabou e o site foi ficando menos atualizado. Hoje estamos tentando reviver o site. A ideia é criar bons conteúdos do time e uma lojinha virtual com produtos do clube.

Caso seu pai volte ao dia a dia do clube, você pretende seguir na diretoria?

A gente vai continuar trabalhando junto, como era antes de ele ser preso. A gente já trabalhava junto, lado a lado, com ele me ensinando tudo que podia ensinar. Acho que, quando ele voltar, não vai ser diferente.