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Tá em casa! As histórias incríveis de Gabriel Jesus no Jardim Peri

10/10/2017 08h00

Gabriel Jesus está em casa! Nesta terça-feira o atacante atuará pela primeira no Allianz Parque com a camisa da Seleção Brasileira e o local é o mesmo da estreia como profissional, quando entrou em campo aos 26 minutos do segundo tempo em Palmeiras 1 x 0 Bragantino, dia 7 de março de 2015, pelo Campeonato Paulista.

De lá para cá, muita coisa mudou na vida do garoto de 20 anos. Virou titular do Palmeiras, ganhou Copa do Brasil, Campeonato Brasileiro, medalha de ouro nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, foi vendido para o Manchester City e assumiu a camisa 9 da Seleção. Mesmo com tanta mudança, uma situação segue igual: o carinho que tem pelo Jardim Peri, bairro humilde da Zona Norte de São Paulo em que o "Tetinha", como é conhecido na região, foi criado. Mesmo na Inglaterra, ele mantém contato com familiares e amigos.

"Tenho contato com ele. Todos aqui têm contato com ele. Vem para cá nas férias. Esteve aqui quando se machucou (no fim do ano passado)", diz Alan Santos Diniz, primo do atacante, que mora no bairro em uma casa ao lado da habitada por Gabriel Jesus até 2015.

Alan é um ano mais velho do que o primo e foi um dos primeiros parceiros dos "contras" nas ruas cheias de subidas e descidas do Jardim Peri.

"A gente tinha um timão. Eu, ele, Rodolfo, Fernando, que está com o Gabriel hoje na Inglaterra, Igor, Júnior. O time não tinha nome não, só jogava. Jogava contra e ganhava refrigerante. Teve uma vez que estava jogando contra o time aqui de cima e estava perdendo de 15 a 8. O jogo acabava nos 20. Viramos 20 a 15 e ganhamos seis Cocas", recorda.

Mesmo com mais vitórias do que derrotas nas peladas do bairro, Alan lembra a reação do primo quando o time perdia em algum "contra":

"Nós sempre ganhamos vários jogos e quando perdia ele ficava bravo. Nunca gostou de perder, não. A gente juntava o dinheiro e tinha que pagar refrigerante para o outro time", disse.

Além das partidas de futebol, os dois também foram parceiros na hora de pintar a rua antes da Copa do Mundo de 2014. Já na base do Palmeiras, Gabriel se juntou a parentes e amigos para enfeitar o local onde morava.

"A foto que saiu estava pintando eu, ele, um moleque daqui, outro dali (aponta para as casas). Os dois sobrinhos dele também estavam. Nós pintamos em cima da hora, faltavam dois dias para começar a Copa. A gente arrecadou o dinheiro e compramos as tintas", explica Alan.

Para o ano que vem, a ideia é repetir a pintura nas ruas , mas desta vez o time estará desfalcado por um bom motivo, afinal Gabriel estará na Rússia.

"Nós pretendemos pintar de novo. Mas só sobrou eu e mais alguns... Tetinha, o Gabriel, foi embora. O irmão dele (Fernando) também não está mais aqui", comenta o primo de Jesus.

DA VÁRZEA PARA O MUNDO

Outro irmão de Gabriel Jesus, Caíque, segue morando em São Paulo. Ele relembra os primeiros passos do atacante.

"Aqui na rua do ponto final do ônibus o couro comia (no futebol). Essas ruas aí, véspera de Copa pintávamos tudo. A gente jogava na várzea. Eu jogo até hoje", disse.

O time de várzea em questão é o Vitória Futebol Clube, do Jardim Peri. Gabriel chegou ao time em dezembro de 2012, com 15 anos, levado por Caique, que já jogava na equipe. Não demorou semanas para o garoto assumir a camisa 9. José da Silva, de 41 anos, presidente e técnico do Vitória, tem muitas histórias sobre Gabriel. Uma delas, gera risos e arrepios até hoje.

"A gente estava em um campeonato no Paraná, durante o Carnaval de 2013, e ele precisava sair antes para se apresentar na base do Palmeiras na Quarta-feira de Cinzas. Ele estava agoniado, porque não podia atrasar. Aí, nosso goleiro ficou encarregado de voltar com ele na terça de noite. Só que o nosso goleiro não enxerga direito de noite, e quase matou ele (Gabriel) na estrada. Veio entrando no mato. O Gabriel nem dormiu durante a viagem, oito horas de viagem. Ele passou o trajeto acordado e assustado, fazendo em nome do pai o tempo todo", diz José, que também trabalha com pisos de madeira, logo emendando outra história:

"Ele era bem encrenqueiro quando jogava na várzea, gostava arrumar umas brigas. Certa vez, numa semifinal, a arbitragem prejudicou muito a gente. Percebi que o Gabriel partiu para cima do árbitro e fui atrás dele, porque ele tinha só 15 anos. Estava chovendo. Ele juntou um monte de barro no chão, pegou e tacou na cara do árbitro. O árbitro guardou os cartões e foi pra cima dele. Aí eu entrei na frente: "Não vai bater no moleque. Ele é responsabilidade minha". Juizão tinha 1,90m. Só não bateu nele naquele dia porque eu entrei na frente. Graças a Deus ficou por isso mesmo", disse.

Foi com José da Silva que Gabriel Jesus começou a ganhar "casca" no futebol:

"Já briguei muito com ele, peguei muito no pé dele... Gabriel, faz isso, protege a bola assim, cabeceia assim. Inclusive, teve um jogo que ele e um outro jogador nosso estavam só brincando, passando o pé sobre a bola, e acabei tirando os dois. Eles não estavam levando as coisas à sério O jogo acabou empatado e eu saí xingando todo mundo, inclusive o Gabriel: "Quer ser profissional, moleque? Tem que jogar sério. Faz cinco, seis, oito, dez gols". Esse lado profissional dentro do futebol eu sempre cobrei.

FOME DE BOLA

Gabriel Jesus defendeu o Vitória até 2015, quando já era profissional no Palmeiras, revela José da Silva:

"Ganhamos um campeonato importante com o Gabriel se dividindo entre a base do Palmeiras e o nosso time. Anos depois, em 2015, ele já estava no profissional e ainda jogava bola com a gente. Teve dois jogos nossos que a gente estava perdendo e ele mandava pedir a chave no vestiário para se trocar, mas eu não dava. Ele acabava se trocando como dava. Um desses jogos estava um 1 a 0 para os caras. A gente empatou com o Gabriel em campo e ele ainda bateu pênalti na série alternada. Nós vencemos", disse.

José da Silva e Gabriel mantêm contato até hoje. O técnico já ganhou sete camisas de presente do atacante. Uma delas é raríssima, a camisa 10 da Copa do Mundo Sub-20 de 2015. Há apenas três modelos desse tipo. Gabriel ficou com um, Caique com outro, e José ganhou o último exemplar:

"O moleque é muito humilde. Sempre quando o vejo, falo: "Gabriel, te desejo muita sorte na vida". Espero nunca perder a amizade que tenho com ele.