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Da falta de uniformes ao Engenhão: Bebeto pode virar grande benemérito

15/03/2018 06h00

Após ser eleito, em novembro de 2002, houve pouco mais de um mês até a posse. Qual não foi a surpresa de Bebeto de Freitas e seus pares quando, naquele momento, viram um Botafogo praticamente sem nada. Muitos computadores, bolas e até uniformes de jogo e treino não foram mais no clube. Neste cenário calamitoso, uma das primeiras medidas do mandatário foi tirar do próprio bolso o dinheiro para compra de material esportivo e o Glorioso poder entrar em campo. Para treinar ou para jogar. E a evolução da instituição foi tanta que o nome do ex-mandatário deverá ser elevado ainda mais.

A diretoria prestou queixa-crime, na época, informando o roubo do patrimônio do clube. Paralelamente, Bebeto, outros dirigentes e empresários alvinegros se mobilizaram para comprar bolas, camisas, shorts e meiões. O contrato com a Finta, então fornecedora do material esportivo, havia acabado e os jogadores estavam para retornar de férias.

- A vontade dele era criar uma marca de material esportivo do Botafogo. Não deu, então falou: "Vamos comprar o material." Ele deu maioria. Compramos material de treino e de jogo até podermos negociar, para não negociarmos por baixo - lembra Vinícius Assumpção, conselheiro da chapa de Bebeto na ocasião e candidato a presidente em 2014.

Mas a situação crítica da instituição da Estrela Solitária se dava por razões além. Funcionários chegaram a ter dez meses de salários atrasados, credores batiam à porta dia sim, dia também, e local para jogar era um drama. Aos poucos a gestão foi arrumando a casa, e a imagem do ex-jogador era vista como fundamental naquele processo.

- As pessoas viram no Bebeto uma tábua de salvação. Tem cartas de pessoas oferecendo contato para ajudar. Um garoto ofereceu a primeira mesada, R$20,00, e o pai não era botafoguense. Ele (Bebeto) mobilizou um monte de pessoas do Brasil todo por conta de honestidade, da credibilidade dele. As pessoas viram a situação paupérrima do Botafogo e se uniam, não só pelo material esportivo - recorda Mario Sergio Pinheiro, vice-geral do clube naquele primeiro mandato.

Dali em diante o caminho trilhado pelo instituição foi de terreno difícil, mas habitável. Habitar, inclusive, no Estádio Nilton Santos. À época sob a alcunha de Engenhão, foi sob a batuta daquele presidente que o Alvinegro garantiu um estádio para chamar de seu. As dívidas, apesar de divergências entre números, caíram até a gestão seguinte, de Mauricio Assumpção.

Por isso e muito mais, um grupo de torcedores se mobiliza, desde esta quarta-feira, durante o velório de Bebeto de Freitas, para colher assinaturas num abaixo-assinado para tornar o ex-mandatário, mesmo morto, sócio grande-benemérito. Cerca de 40 assinaturas foram obtidas em poucas horas. Como ex-atleta, ele já era sócio emérito. A tentativa é de convencer o atual presidente do clube, Nelson Mufarrej, ou o presidente do Conselho Deliberativo, Jorge Aurélio. Pelo estatuto, só eles podem colocar o tema em votação.

Bebeto de Freitas será enterrado na tarde desta quinta-feira, no Cemitério São João Batista, no bairro de Botafogo. Haverá um minuto de silêncio no clássico entre o Glorioso e o Vasco, no domingo, e deve haver faixas de homenagem ao ex-dirigente. A imagem de quem deixou legado no clube vai ser elevada.

Boas relações, pouca paciência

A imagem de Bebeto de Freitas, ainda nos anos 1980, já era de quem lutava contra a corrupção. Opunha-se aos esquemas ilícitos que via se estenderem desde as federações estaduais às entidades nacionais e internacionais. Teve Carlos Arthur Nuzman, primeiramente companheiro de time no vôlei do Botafogo, como algoz na política. Muito antes da prisão do ex-presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, no ano passado.

E a tal inesgotável luta a contra corrupção aglutinava quem nele acreditava. E isso levava investimentos para sanear os cofres alvinegros. Fosse com a oratória junto a empresários, fosse com políticos de qualquer partido. De direita ou de esquerda.

- Apesar de ter na diretoria pessoas ligadas ao PT (Partido dos Trabalhadores), ele nunca se colou nisso. Tinha relação com todos os partidos. Com o Democratas, do César Maia (vereador e ex-prefeito do Rio), com o (Alexandre) Kalil (prefeito de Belo Horizonte pelo Partido Humanista da Solidariedade, PHS), com o Aécio (Neves, senador pelo PSDB, Partido da Social Democracia Brasileira). Tudo isso pela empatia dele, apesar de não ser nada simpático - lembra Mario Sergio.

O temperamento explosivo de quem era sobrinho de João Saldanha e primo de Heleno de Freitas causou? discussões fortes com dirigentes rivais, torcedores de organizadas e até com parceiros. Era comum.

- Terminei brigado com ele, infelizmente. É da vida. mas jamais deixei de reconhecer a importância dele como botafoguense. Se tivesse oportunidade, teria reatado. Mas considero o Bebeto um dos maiores presidentes da história do clube - opina Vinícius Assumpção.