Topo

Luiz Gomes: 'O ingresso por R$ 10 e a falta de atratividade como problema'

25/03/2018 08h05

Todos queremos que os clubes brasileiros segurem seus talentos. Que os Vinícius Juniors da vida não saiam daqui antes de completar 20 anos - e só voltem no fim da carreira, vivendo na Europa seus dias de glória. Todos queremos estádios confortáveis, seguros, em que se possa mais do que assistir a jogos, vivenciar experiências diferenciadas. Todos queremos compartilhar de ações de marketing, que patrocinadores paguem mais, que os direitos de TV se multipliquem, que os fornecedores de material esportivo valorizem a relação e os produtos dos clubes. Todos queremos que Flamengo ou Corinthians, Palmeiras ou Vasco - e os outros grandes do nosso futebol - sejam vistos e admirados no exterior, conquistem, por exemplo, ao menos uma fatia do emergente e rico mercado asiático.

Queremos, enfim, que o futebol brasileiro mude de patamar. Queremos reduzir o abismo cada vez mais profundo que nos separa do que acontece do outro lado do Atlântico. E isso é muito bom. Mas conseguir alcançar tudo isso tem um preço. E, definitivamente, é uma ilusão achar que vamos ter um negócio, um espetáculo de padrão Inglaterra cobrando ingressos de padrão Honduras.

Esta semana, na véspera do Fla x Flu da semifinal da Taça Rio, o LANCE! Espresso, uma newsletter de informação comentada do dia a dia do esporte (clique aqui e inscreva-se), publicou uma nota questionando a cobrança de ingressos a R$ 10 para o clássico. O texto era o seguinte:

O que você compra com R$ 10? Cinco panos de chão no ambulante da esquina. É verdade. Mas também pode assistir ao Fla x Flu da semifinal da Taça Rio, segundo turno do campeonato carioca. Parece piada, mas não é. A partir desse valor, os ingressos para o clássico de amanhã no Nilton Santos começam a ser vendidos hoje. É uma aberração. Uma desmoralização. R$ 10 é preço de entrada de jogo de várzea. É um ato de desespero da cartolagem para tentar levar ao estádio um torcedor afastado pelas mazelas de um estadual desinteressante, com jogos mambembes em Brasília ou Cariacica e um regulamento esdruxulo. Não é o ingresso barato, incompatível com o futebol profissional de hoje em dia, com os investimentos do Rubro-Negro para montar um time, e mesmo do Tricolor em crise, que vai resolver essa situação. É, sim, o fim do amadorismo dos dirigentes. É, sim, um calendário decente, um regulamento compreensível. Acima de tudo, é o respeito ao público, aos jogadores, aos clubes. Ao campeonato que já foi o mais charmoso e atraente do país. E que mergulha a braçadas rápidas em um poço sem fundo. Vale comprar os panos de chão. Para uma faxina geral no futebol carioca. E do Brasil.

Foi uma enxurrada de críticas nas redes sociais. Elitismo, falta de sensibilidade com as necessidades da população, foi o mínimo respeitoso que se ouviu. Mas, registre-se, também foram várias as mensagens de gente apoiando os termos da nota. Achando, sim, que desrespeito é baixar o nível do futebol brasileiro a esse ponto.

Contra fatos hão há argumentos. Apesar da "oferta pano de chão", menos de 17 mil pagantes (16.923, para ser mais preciso) pagaram ingressos para o Fla x Flu. Enquanto isso, em São Paulo, 25.446 pagantes foram ao Allianz Parque na goleada de um Palmeiras já praticamente classificado sobre o Novorizontino. A diferença do ticket médio (o valor médio dos ingressos pago pelo torcedor) impressiona: R$ 29,44 no Nilton Santos e R$ 57,85 no Allianz Parque. Ou seja, embora o ingresso em São Paulo custasse quase o dobro, embora o jogo valesse muito pouco, muito mais gente foi ver o Verdão. As rendas: R$ 1.471.899,40 em SP contra R$ 548.310 no Rio.

Há elementos que até podem ajudar a compreender essa disparidade de público: o programa de sócio-torcedor do Palmeiras - assim como o do Corinthians, que também tem ingressos mais caros e público grande na Arena de Itaquera - é mais eficiente e bem mais atraentes do que o do Flamengo, por exemplo. E isso sem falar na atual conjuntura de insegurança, que torna a população do Rio mais caseira.

No entanto, a essência é outra. O que o borderô do Fla x Flu deixa claro, reafirmando a nota da polêmica no L! Espresso, é que o problema não está no valor do ingresso. Está na falta de atratividade, de credibilidade de organização do futebol brasileiro. O do Rio em particular. Quando o torcedor se sente respeitado, com um campeonato de regras claras, se sente bem tratado, com as vantagens que um programa de sócios pode oferecer, ele comparece. Paga até mais caro, mas está lá, jogo após jogo. Não há futuro que não seja esse...