Luiz Gomes: 'Reflexões de Páscoa'
Só hoje é domingo de Páscoa. Mas o espírito pascoal baixou mais cedo, pelo menos em alguns personagens das disputadas semifinais dos estaduais, ao longo da Semana Santa. Diogo Vitor, um garoto de 21 anos, recém-promovido das divisões de base do Santos, e Fabrício, exatamente dez anos mais velho do que ele, um veterano em tempo de bola e em confusões, vestiram as sandálias da humildade e ganharam destaque na mídia e nas redes sociais.
Idade não é sinal de amadurecimento. Ou de respeito. Diogo Vitor, apesar de jovem - ou talvez por isso mesmo, movido pelo ímpeto dos que querem resolver tudo de uma vez e fazer a história - mostrou uma determinação de veterano ao se colocar como um dos batedores de pênalti do Santos na semifinal contra o Palmeiras. Num momento, como se sabe, em que muito jogador cascudo se faz de morto para fugir da responsabilidade. Só isso já seria digno de elogios. Mas o moleque foi lá, cobrou e... perdeu.
Diogo chorou, saiu desolado. Mas não jogou a toalha. No dia seguinte, foi às redes sociais, reconheceu o erro e sua parcela de culpa na eliminação do Peixe, num post dirigido ao torcedor. "Hoje estou vindo aqui me desculpar pelo meu grande erro. E também venho agradecer o apoio de toda a torcida (...) no pior momento da minha carreira. Pego esse erro como aprendizado e não vou abaixar a cabeça. Obrigado a todos os torcedores santistas e a todos que vem me apoiando". Diogo fez o que muito figurão consagrado não tem a coragem e a hombridade de fazer. Não botou a culpa na bola, num escorregão, no cansaço. Errou e ponto final. Recebeu o apoio dos companheiros e também do técnico. Em entrevista coletiva, Jair Ventura afirmou que "quando um erra, erram todos". Simples assim.
Já no Maracanã, depois da épica virada do Vasco de Zé Ricardo sobre o Fluminense de Abel Braga, podia-se esperar de tudo do autor do gol salvador, o polêmico Fabrício. Por muitos lugares por onde passou - do início da carreira no Monte Azul, no interior paulista, a Portuguesa, Internacional, Cruzeiro, Palmeiras e Atlético-PR - esse cara arrumou encrencas. A maior delas em um dia da mentira, em 1º de abril de 2015, quando, vaiado numa partida do Inter contra o Ypiranga, no Beira-Rio, irritou-se com a torcida Colorada, largou a bola de lado e, verdadeiramente descontrolado, se dirigiu à arquibancada com gestos obscenos, tirou a camisa, a jogou no gramado e acabou expulso pelo juiz. Foi suspenso por cinco dias e logo em seguida afastado definitivamente pelo clube.
O jogo de quinta poderia ter seguido o mesmo roteiro. Fabrício - hoje praticamente o terceiro reserva da lateral-esquerda no limitado elenco do Vasco - também vinha sendo insistentemente vaiado pelo torcedor do próprio time a cada vez que tocava na bola. Mas sua resposta dessa vez foi outra, o gran finale não foi um ataque de nervos, mas um chute cruzado, quase sem ângulo, que venceu o goleiro Júlio César e selou a virada histórica já aos 50 minutos do segundo tempo.
Ainda mais surpreendente do que ter se tornado o herói improvável da classificação vascaína para as finais, foi a reação lúcida de Fabrício após o jogo. Com o filho pequeno no colo, o jogador desabafou. Deu até razão à insatisfação da torcida com ele, ainda que não concordasse com a forma como foi vaiado. E não usou de meias palavras:
"A gente trabalha a semana inteira, às vezes não sai do jeito que a gente quer. Amassei a bola hoje. Errei dois lances, e a torcida pegou no meu pé. Posso jogar mal o jogo todo, mas enquanto o juiz não acabar o jogo tem que incentivar o cara. Vaia depois que acaba. Não estava jogando bem o jogo inteiro. Amassei a bola, não joguei nada, mas joguei pelos meus companheiros e pude fazer o gol. Eu sei que estava mal no jogo, mas vontade, garra e determinação não podem faltar dentro de mim. O grupo está de parabéns''.
Boas falas, Fabrício. Feliz Páscoa, leitores!
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