Copinha é pop

Enquanto se discute a relevância da Copa São Paulo após 50 anos, ela ainda revela jogadores e chama atenção

Gabriel Carneiro Do UOL, em São Paulo Leandro Moraes

Consolidada como a competição que abre a temporada do futebol brasileiro, a Copa São Paulo de Futebol Júnior completa 50 anos de existência em 2019, quando, a partir de quarta-feira (2), mais de 3 mil jovens de 128 times nacionais disputarão um título e o sonho de um futuro no futebol profissional. Mas ainda há quem torça o nariz

Uma das principais críticas ao torneio é a qualidade técnica de seus jogos e jogadores. Motivo pelo qual a maioria dos atletas não verá seu sonho ser realizado. Existem também outros motivos de rejeição, como o elevado número de equipes na disputa, os horários, a falta de prioridade que alguns times dão ao torneio e até uma suposta perda de relevância da Copa São Paulo por causa da proliferação de competições na categoria sub-20 nos últimos anos. 

Mas há também a contrapartida: a Copinha é abrangente, proporciona oportunidades sociais como nenhum outro campeonato do país, revela talentos e tem quase todos os jogos transmitidos na TV. Por fim, existe um ingrediente até mais importante do que todos os outros: as pessoas são interessadas pela Copa São Paulo.

A edição de 2018 da Copinha foi o evento esportivo nacional mais buscado na web pelos brasileiros. E o 9º colocado no ranking geral, atrás somente de Copa do Mundo, Big Brother Brasil, Eleições, Jair Bolsonaro, horário de Brasília, greve dos caminhoneiros, Lula e Haddad, segundo relatório divulgado pelo Google em dezembro. 

Não teve para Brasileirão, Copa do Brasil ou Estaduais... A Copinha tem seu valor.

Leandro Moraes
Staff Images

Campeonatos sub-20 mais expressivos e organizados

A Copinha deixou de reinar como "o" grande torneio para as categorias de base. Hoje, há mais competições no futebol júnior brasileiro. E elas também são mais relevantes e organizadas do que anteriormente. 

A CBF organiza desde 2015 o Campeonato Brasileiro sub-20, que já teve Fluminense, Botafogo, Cruzeiro e Palmeiras como campeões. É um torneio que também tem transmissão da TV, é disputado por times bem classificados segundo o índice da entidade e se estabelece cada vez mais como uma etapa importante na formação de jogadores - é comum que os garotos que já subiram para o elenco profissional, mas não jogam com frequência, sejam "emprestados" ao sub-20.

Antes de a CBF assumir a organização existia um campeonato de mesmo nome, mas administrado pela Federação Gaúcha de Futebol e disputado entre 2006 e 2014, quando surgiram jogadores como Alexandre Pato, Marquinhos Gabriel, Alan Patrick e Marcos Júnior. A FGF transformou o antigo Brasileirão sub-20 em Copa Rio Grande do Sul, ou Copa RS, e até vendeu a propriedade do nome. O torneio é disputado desde 2015 e teve o São Paulo como campeão em três edições e o Palmeiras agora em 2018 - nos pênaltis, contra o próprio São Paulo. A competição fecha o calendário da base anualmente. 

Também existem os Estaduais, a Copa do Nordeste, a Copa do Brasil sub-20, disputada desde 2012 e vencida por São Paulo (três vezes), Vitória, Santos, Internacional e Atlético-MG, e a Supercopa, disputada entre o campeão brasileiro e o da Copa do Brasil. Ufa!

Daí nasce um importante debate: essa proliferação de competições sub-20 poderia esvaziar a Copinha?

Divulgação/FPF

"Acredito que a Copinha tornou-se o que é, a maior competição de base do país, pela soma de alguns fatores. Um é a necessidade de se investir e se debruçar sobre a base, mas também a celebração da felicidade de tantos meninos jogando futebol, deixando sua vida em campo. É uma festa do futebol em um período em que os times profissionais estão em férias. A Copinha sempre rendeu grandes craques e grandes histórias, por isso ela é querida e celebrada de um jeito especial."

Mauro Silva, ex-jogador, vice-presidente de atletas e competições da Federação Paulista de Futebol

Por que a Copa São Paulo se mantém relevante em 2018

Daniel Vorley/AGIF

Abrangência

A Copa RS teve 12 times da Série A, 1 da Série B e 7 estrangeiros, enquanto o Brasileiro sub-20 contou com 16 equipes da elite nacional e 4 da segunda divisão. Na Copa São Paulo a realidade é bem diferente: há clubes de todas as divisões, a maioria sem divisão, e também de todos os Estados. São 128 times, alguns deles semi-amadores ou originados em projetos sociais, o que torna a competição a mais abrangente e democrática das categorias de base no país.

Rodrigo Capote/UOL

Oportunidade

Em razão da abrangência no território nacional, a Copa São Paulo também ocupa o posto de grande oportunidade social do futebol brasileiro nas divisões inferiores. É a chance de meninos que jogam futebol em locais de acesso mais complicado serem notados por empresários e observadores de grandes clubes e assim se projetarem na carreira. Mesmo em times eliminados precocemente é possível pinçar talentos. Uma venda, às vezes, também resolve um ano do clube.

UOL

Mídia

Todos os jogos da Copa São Paulo de 2018 serão transmitidos. SporTV, ESPN, globoesporte.com, Rede Vida e agora a FPF TV, que exibe jogos pelas redes sociais na plataforma Mycujoo, serão os canais responsáveis por não deixar nenhum lance do torneio passar batido, com exibição da final na TV Globo. Além disso, a cobertura da preparação e o pós-jogo são reforçados pela ausência de torneios profissionais simultâneos. É o único torneio de base com esse apelo.

Montagem sobre Acervo pessoal e Divulgação

"Hoje talvez o Valdivia estivesse vendendo muçarela"

Um dos casos mais emblemáticos de oportunidade social proporcionada pela Copa São Paulo é a história de Valdivia, meio-campista do Internacional, hoje emprestado ao Al Ittihad, da Arábia Saudita. O garoto nascido em Jaciara, no Mato Grosso, em 1994, chegou ao Rondonópolis Esporte Clube aos 12 anos de idade. Mostrava talento, mas sempre foi muito franzino e tinha dificuldades para jogar em alto nível. "Eu conversava muito com ele, que devia ter destaque em uma competição como a Copa São Paulo para se projetar", diz Márcio Schmidt, antigo gestor da base do Rondonópolis.

Até que em 2012 tudo mudou. E o filho do Seu Chiquinho, vendedor de peças de queijo muçarela de porta em porta no interior do Mato Grosso, sagrou-se artilheiro da Copa São Paulo aos 17 anos, com oito gols marcados na melhor campanha da história de um time do Estado no torneio. Em março, ele foi negociado com o Internacional e começou a trajetória que acumula passagens também por São Paulo, Atlético-MG e seleção brasileira de base. 

"A Copa São Paulo é a principal vitrine, é o encontro da estratégia dos clubes, do potencial dos jogadores e da oportunidade. Hoje temos um nível muito alto de competições, mas só para os grandes clubes. Os pequenos muitas vezes têm só a Copa São Paulo, é a única chance. É um torneio que acontece em uma idade que os meninos precisam jogar a vida, porque ou vão para o elenco profissional ou param por ali. É a última oportunidade, a última vitrine. Se não tivéssemos usado essa estratégia hoje talvez o Valdivia estivesse vendendo muçarela", relata o dirigente.

Schmidt hoje trabalha no Academia Futebol Clube, uma espécie de continuação do trabalho do Rondonópolis. Mais uma porta de entrada para novos Valdivias.

Copinha não revela mais ninguém?

Um dos clichês mais recorrentes sobre a Copa São Paulo é que ela parou de revelar jogadores. A ideia é reforçada pela citação de nomes mais antigos como grandes revelações do torneio, como Falcão, Casagrande e Dener, e também por alguns fatos recentes: há jogadores que não disputam a competição porque já estão sendo aproveitados pelo time profissional, como o santista Rodrygo; e há casos como do campeão Flamengo em 2018, em que vários jogadores foram cedidos durante a Copinha para o elenco principal e tiveram que deixar São Paulo.

Por outro lado, 16 jogadores convocados para a Copa do Mundo da Rússia pela seleção brasileira disputaram a Copa São Paulo:

  • Alisson (Internacional, em 2011)
  • Cássio (Grêmio, em 2006)
  • Danilo (América-MG, em 2009)
  • Filipe Luis (Figueirense, em 2004)
  • Marcelo (Fluminense, em 2006)
  • Marquinhos (Corinthians, em 2012)
  • Miranda (Coritiba, em 2004)
  • Casemiro (São Paulo, em 2009 e 2010)
  • Fernandinho (Atlético-PR, em 2003)
  • Fred (Internacional, em 2011 e 2012)
  • Paulinho (Juventus, em 2006)
  • Willian (Corinthians, em 2006)
  • Douglas Costa (Grêmio, em 2007)
  • Gabriel Jesus (Palmeiras, em 2015)
  • Roberto Firmino (Figueirense, em 2009 e 2010)
  • Neymar (Santos, em 2008 e 2009)
Cesar Greco

Vitrine de talentos: quem passou pela Copa São Paulo

Reprodução

Identidade assumida: agora é Copinha

O apelido "Copinha" nem sempre foi bem aceito pelos organizadores do torneio. Pelo contrário. Os criadores da Copa São Paulo achavam depreciativo, negativo e redutor o uso do diminutivo. Não viam como um apelido carinhoso para um torneio disputado por jovens jogadores. A ordem era evitar o termo. Mas a situação mudou nos últimos dois anos e o nome, enfim, passou a ser usado institucionalmente. Em 2019, faz parte até do material gráfico preparado pelo departamento de comunicação da FPF.

"Copinha" passou a ser a identidade da maior competição de base do futebol brasileiro. "É a competição que mais revelou craques no país mais vencedor do futebol e mantém esse DNA alegre, puro. Não tem como não gerar admiração e carinho", explica Mauro Silva.

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50 anos: história e curiosidades

  • Início

    Preparação de atividades esportivas em comemoração à fundação de São Paulo foi o pontapé inicial da Copinha, em 1969. No primeiro ano, houve a disputa em várias modalidades, mas o futebol foi um problema: era período de férias dos jogadores profissionais, e só por isso a competição virou juvenil (na época não existia a categoria júnior). O primeiro time a topar a disputa foi o Nacional da Lapa, depois o Palmeiras e na esteira o Corinthians. O local foi a Vila Manchester, Zona Leste.

    Imagem: Acervo pessoal/Ex-jogador Mozart
  • Explosão

    Após algum tempo nasceu a ideia de convidar clubes de outros Estados e fazer um mini Campeonato Brasileiro (na época, o torneio Roberto Gomes Pedrosa) na categoria juvenil. Ainda era uma época amadora e até times vencedores de campeonatos colegiais da Secretaria Municipal de Esportes eram convidados. A partir de 1972, com a revelação de Paulo Roberto Falcão pelo Internacional, a opinião pública entendeu que o torneio formava para clubes e seleção e a ideia se consolidou.

    Imagem: Arquivo Folha
  • Limbo

    Não houve Copa São Paulo de Futebol Júnior em 1987. Segundo Fábio Lazzari, assistente esportivo do Brigadeiro Faria Lima, prefeito de São Paulo na época da concepção do torneio, a eleição de Jânio Quadros em 1986 sucedeu uma série de mudanças em todos os cargos e departamentos da Prefeitura, que não teve tempo ou interesse de organizar a competição. Dez anos depois, a gestão do prefeito Celso Pitta passou a organização para a Federação Paulista de Futebol.

    Imagem: Reprodução
  • Atualidade

    A Copa São Paulo movimenta 30 cidades do Estado em 32 diferentes grupos de quatro times - as 128 equipes foram mantidas, igualando o recorde de 2018. Apenas a capital possui três sedes: Rua Javari (Juventus), Nicolau Alayon (Nacional) e Canindé (Portuguesa). É um torneio consolidado nacionalmente e já vencido por 21 times desde 1969. O maior campeão é o Corinthians, que já ergueu dez taças (1969, 1970, 1995, 1999, 2004, 2005, 2009, 2012, 2015 e 2017)

    Imagem: Rodrigo Gazzanel/Agência Corinthians
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