Por trás da máscara

Apresentador do Desimpedidos, Bolívia lembra entrevistas marcantes e conta que máscara já assustou boleiros

Bruno Freitas e Celso Paiva Do UOL, em São Paulo Lucas Lima/UOL

Milhares de likes e seguidores não podem estar errados... Bolívia é um sucesso na internet. Junto com a turma do Desimpedidos, o entrevistador mascarado caiu na graça de um novo tipo de torcedor de futebol. É o cara que adora boleiragem, curte uma zueira e não consegue ficar longe das redes sociais.

Em poucos anos, o anfitrião do Bolívia Talk Show entrevistou os maiores jogadores do Brasil e fez rir até um algoz alemão dos 7 a 1. Contando com ajuda do mistério, o personagem conseguiu ser um dos jornalistas de esporte mais influentes do país. Isso numa história com perrengues, suor atrás da máscara e lidando com a curiosidade de fãs: "quem é esse cara?"

Enquanto Bolívia segue firme e forte no canal que o lançou à fama, vai retomar a escrita com um blog no UOL. Atrás de sua famosa máscara, o jornalista vai estrear um blog no veículo líder da internet brasileira, prometendo muito humor, bastidores de entrevistas e boleiragem na veia. Curte aí!

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Como a máscara entrou na vida de Bolívia?

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Máscara quebrada e calor embaixo dela

Quem assiste a um vídeo, seja no YouTube ou outras redes sociais, não imagina a dose de sacrifício do homem por trás do personagem. "Todo mundo tem os seus dias ruins, né? Brigou com a namorada, acordou de mau-humor, está triste por causa de alguma coisa ou simplesmente não está num dia bom. E aí tem que pôr a máscara e fazer a palhaçada. É uma coisa que tem que desenvolver. Não estou falando que eu sofro: 'nossa, coitado, como ele sofre'. Não. Só estou falando que tem dia que você não está muito a fim. Esses são os piores".

Mas não se esqueça da temperatura que sobe embaixo do plástico da máscara. Em pouco menos de uma hora de entrevista num estúdio climatizado, Bolívia suava. Muito. Imagina embaixo de sol, durante horas de gravação?

E o desconforto do calor, né? O desconforto porque eu suo bastante normalmente."

"Eu usei a mesma máscara durante uns dois ou três anos. Aí um dia eu estava lá em casa e de repente pisei nela. Quebrou o maxilar dela. Depois tive que ir lá na 25 comprar mais. Se você quiser uma máscara bonita dessa pra você ficar bonito como eu, vai lá na 25 de Março [centro de São Paulo], você paga uns dez contos e leva."

"No começo, era difícil o pessoal respeitar"

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Problemas com torcidas de Fla e Palmeiras

Quando o humor conduz o trabalho de comunicação, o risco de deixar alguém ofendido está presente. Ainda mais no universo do futebol, em que o famoso "clubismo" geralmente inspira uma polêmica por dia. Mesmo sem querer, Bolívia acabou virando alvo de duas torcidas gigantes do país em situações diferentes.

Primeiro foi com os rubro-negros:

"A Adidas chegou e falou: 'a gente vai fazer o lançamento da camisa 3, vamos fazer um vídeo? Só que você tem que mandar uma ideia até amanhã'. Só que na época, no Desimpedidos, eu tinha uma brincadeira de falar 'Framengo', ...igual fala "Curíntia", "Parmêra", falava "Framengo". E torcida do Flamengo que acompanhava o Desimpedidos adorava. Eu nunca imaginei que isso pudesse ser ofensivo. Quando coloquei isso no vídeo, fui meio inocente de não imaginar que ia ser uma coisa como se fosse oficial do clube. E não era.

Aí a torcida do Flamengo que não conhecia o canal e viu um cara que tem um sotaque mais de São Paulo, tem um pouco de bairrismo também: 'quem é esse palhaço para vir aqui e ficar zoando a gente?'. Mas não teve nada disso. A gente ficou um tempo com uma relação bem estremecida com o Flamengo, não podia gravar."

Depois veio a polêmica com os palmeirenses:

"A entrevista do Marcos foi polêmica porque ele resolveu dar a opinião sobre o Mundial do Palmeiras. Como ídolo maior, ele ter falado: 'ah, o Palmeiras foi buscar isso depois que o Corinthians ganhou, tem que ir lá e ganhar para cala a boca'. Isso pega no ponto fraco da torcida do Palmeiras. É claro que isso iria repercutir. Sabia que ia repercutir.

Então, acho que a torcida do Palmeiras pode ficar brava porque fala assim: 'pô, falou no programa desse cara, esse cara está agitando'. Mas, para pra pensar, respirar um pouquinho, não tem nada a ver."

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Essa história de eu não ser amigo de jogador: não é que eu não quero ser amigo de jogador. É porque, naturalmente, não temos os mesmos gostos. O Fred [outro apresentador do Desimpedidos] gosta de ir no pagode, de ir no Villa Mix [balada sertaneja], das coisas que os boleiros gostam, né? O meu rolê já é totalmente outro

Bolívia, fã de rock e shows quando não está de máscara

Ao lado de craques

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Adriano

"Sou fã do cara. O cara estava aí nas redes sociais sendo ele, autêntico, fazendo o que ele gosta apesar de todas as críticas. É difícil de topar por isso. Se esse dia chegar [de entrevista-lo], já deixei claro que eu não quero tocar em nenhum ponto polêmico de problema com álcool, carreira interrompida, da favela ou morte do pai. Queria aquele Adriano felizão lá na comunidade dele. Didico, dá essa moral pra 'nóis'."

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Romário

"Pelo fato de eu ter acompanhado a carreira inteira, torci muito por ele na seleção, porque até quando ele jogava por outros times, que não o meu - que ele nunca jogou -, sempre fui fã. Eu cheguei lá no prédio dele e ele não chegava. Ficava pensando: 'desce aí, quero te dar um abraço!'. Ele chegou. Estava segurando minha onda, mas dava para ver que eu estava muito feliz entrevistando o Romário. O lado do torcedor falou mais alto."

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Thomas Müller

"A gente tem impressão que o latino-americano é muito mais solto, é muito da zoeira, e que o europeu é mais durão. Quando eu fui entrevistar o Müller, o cara é muito legal. Já chegou: 'e aí, e aí? Tudo bem? Beleza! Brasil, Brasil!'. Não sei se é por que ele fica feliz, né, porque ele lembra do Brasil. Um dos caras mais simpáticos que eu já entrevistei. Parecia, sei lá, o Vampeta chegando, entendeu? É um cara muito astral."

O dia em que "não deu match" com Ronaldinho Gaúcho

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E a comunidade boliviana?

Quem é de São Paulo sabe: a comunidade boliviana na cidade é enorme. Mas o Bolívia da internet ainda não teve a oportunidade de interagir com os imigrantes. "Eu nunca tive nenhum retorno de bolivianos, por incrível que pareça. Porque na verdade não tem nada de boliviano, né? É uma brincadeira. Não tenho contato nenhum. Nunca tive esse retorno."

Nem mesmo a voz ou o sotaque remetem à comunidade. "Na verdade, se você for ver os vídeos antigos do Desimpedidos, eu fazia uma vozinha ridícula. Forçava um sotaquezinho espanhol, fazia a voz um pouco até mais fina do que essa que eu faço. Aí eu desencanei de fazer a voz que eu fazia antes. E o sotaque também. Era chata. Era uma preocupação que eu tinha. Já mudou bastante. Está quase perto da minha voz normal, mas ainda é diferente."

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Ninguém reconhece o Bolívia de cara limpa?

Hoje em dia, já é mais difícil porque o cara já olha as tattoos e relaciona. Então, os moleques ficam olhando e não falam nada. Uma vez no shopping, o cara "ganhou" quem eu era sem a máscara. Uma vez na minha vida! A gente ia gravar alguma coisa dentro da livraria, o cara falou: "você que é o Bolívia?". Eu falei: "cara!". E eu estava normal. Daí para frente... Acho que agora abriu a porta do inferno

Bolívia, sobre a única vez que foi "desmascarado"

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A fama faz falta ao homem atrás da máscara?

O personagem é um sucesso, mas a opção pelo anonimato tem suas consequências. O criador do Bolívia não lida com o sucesso nas ruas, por exemplo, mas diz que prefere as coisas assim. 

"Não sinto falta disso porque tenho esse reconhecimento do trabalho. Tenho o Instagram, com muita gente. Tenho Twitter, que eu estou lá todo dia interagindo com o pessoal. Essa parte eu curto bastante. Quando vou gravar na rua, a molecada ia, ia bastante gente, multidão mesmo. Ficava lá depois de três horas tirando foto com os moleques, assinando camisa e tal. Então essa parte de curtir o retorno do meu trabalho, eu curto."

"Mas a minha vida pessoal, não gosto muito de expor. Só que os moleques vão atrás. É normal o pessoal mostrar casa, família, intimidade, se expor. Não curto, sou um pouco mais reservado".

Mas muita gente pede para ver seu rosto? "Muita, mas a maioria dos moleques sabe que se virem a cara vão ficar um pouco decepcionados. A pessoa nunca imagina que é uma pessoa normal. Aí o moleque vem e fica com uma cara de tristeza. É igual quando, sei lá, vai na Disney. Eu brinco com isso: vai na Disney ver o Mickey. De repente vai ao banheiro e vê o Mickey mijando sem a cabeça."

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Desimpedidos mudou jeito de tratar futebol

Criado em 2013, inicialmente com o envolvimento do jornalista Felipe Andreoli e do (agora) ex-jogador Kaká, o Desimpedidos cresceu rapidamente para se tornar uma referência de comunicação ligada a futebol na internet. Um sucesso alcançado com uma linguagem que cativou o público mais jovem.

"O Desimpedidos apareceu no momento em que a gente estava muito carente de entretenimento no futebol. A gente tem os canais de TV que dão uma opinião, que dão informação, que fazem o dia a dia do futebol para a gente se abastecer de notícias, de análises. Só que a gente não tinha opções de entretenimento. E a internet dá uma liberdade de linguagem."

"Não vejo na TV programas que pretendem fazer entretenimento com futebol. A mídia esportiva é um pouco viciada nos mesmos formatos. Aí o moleque novo se inspira no repórter antigo e acaba ficando muito parecido. No jeito de falar, a entonação e tal. Então vamos falar como torcedor. Aqui ninguém é repórter, ninguém entende mais do que ninguém, a gente é um simples torcedor que gosta de brincar, falar zoeira de futebol, zoar o rival, ser zoado."

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Entrevistador moldado pelo CQC

Antes de virar o Bolívia, o jornalista rodou bem por aí na profissão. O novo blogueiro do UOL passou por uma série de funções no mercado, inclusive na publicidade. Mas foi uma passagem pela equipe do CQC, extinto programa de humor e jornalismo da Band, que moldou de vez seu lado entrevistador.

"Fiz o curso de Jornalismo na (Faculdade) Cásper Líbero. Comecei a trabalhar na Gazeta Esportiva, o jornal... final do jornal, né? Porque hoje em dia é só no portal. Depois trabalhei em revista de skate, de surfe, de bike, trabalhei numa revista infantil, fui ser redator de Publicidade, em duas grandes agências. Trabalhei na TV com o CQC. Então tem bastante coisa aí. Trabalhei até aqui no UOL, em uma passagem relâmpago". 

"No CQC, era produtor de conteúdo. Além de fazer a parte de produção, de ir atrás das coisas e não sei o que, era principalmente fazer um roteiro de perguntas dos apresentadores para eles já levarem alguma coisa pronta. Então, essa parte desenvolveu a criatividade de fazer pergunta, de ter uma sacada de responder alguma coisa engraçada. Essa parte do humor desenvolveu bastante e de conhecer como que é legal chegar em uma pessoa. Se você chegar com jeito, ela vai te respeitar e vai conversar com você".

Meu blog no UOL

Eu tenho aquela coisa de jornalista, de gostar de escrever, que, agora que estou fazendo vídeo, não faço mais. Mas sempre gostei de escrever. Fui jornalista de redação em vários lugares, escrevia na agência de publicidade, era redator também. Para mim é muito legal ter essa oportunidade de voltar a escrever um pouquinho, mesmo que seja um blog, uma coisa mais curta. É uma mídia diferente, um público um pouco diferente daquele do Desimpedidos. Então acho que pode ser bem legal.

A gente já tem blogueiros aqui no UOL que são os maiores especialistas em futebol do Brasil. A gente tem o PVC, o Juca Kfouri, o Mauro Beting, o blog do Menon. Ou seja, a gente já tem um time completo de analistas. Pretendo falar mais como torcedor. Não tenho a pretensão de ser um comentarista como essas feras aí.

Quero só mostrar nossa visão, que é um pouco mais divertida, um pouco mais de torcedor mesmo. Mas não também "avacalhado" que nem a gente costuma fazer na internet, no nosso programa. Quero emitir minhas opiniões sobre futebol e mostrar um pouco das coisas que a gente tem lá no Desimpedidos. Acho que o blog vai tomando forma a partir do momento que a gente começa a ver.

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