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Ele já foi número 1 do Brasil e hoje constrói habitações populares

Marcos Daniel é sócio-proprietário de uma construtora na cidade de Passo Fundo - Arquivo pessoal
Marcos Daniel é sócio-proprietário de uma construtora na cidade de Passo Fundo Imagem: Arquivo pessoal

Fábio Aleixo

Do UOL, em São Paulo

06/02/2015 06h00

Marcos Daniel já foi número 1 do Brasil, chegou à 56ª posição do ranking mundial em 2009, disputou 16 Grand Slams, vários confrontos da Copa Davis e até enfrentou Roger Federer e Rafael Nadal. Mas hoje, quase quatro anos após a aposentadoria, o tênis não faz mais parte de sua rotina. O gaúcho de 36 anos se dedica a algo que nada tem a ver com o esporte. Há seis meses, deixou o emprego de treinador que tinha em uma importante academia de Itajaí (SC) para trabalhar na construção civil.

Junto com o irmão e outro amigo abriu uma construtora, a Ligasul, responsável pela construção de apartamentos populares na cidade de Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, onde nasceu e vive atualmente. A empresa firmou contrato com a Caixa Econômica Federal e foi habilitada a fazer obras para o programa habitacional "Minha Casa, Minha Vida".

"Faz apenas seis meses que estou nesta nova área. Está sendo uma experiência totalmente diferente,  pois não tinha nenhum conhecimento sobre construção civil. Estou aprendendo aos poucos e contando com a ajuda do meu irmão,  que já tinha uma outra construtora. Estou fazendo cursos para entender melhor este ramo”, disse Daniel, que não teve vida fácil no começo da empreitada.

Marcos Daniel construtor - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Marcos Daniel posa em frente a um prédio que sua construtora está erguendo
Imagem: Arquivo pessoal

“No início, foi bem difícil. Me deram uma lista de compras com uns 500 itens e eu devia conhecer no máximo uns 10. Até perdia o sono e dizia 'Meu Deus. O que estou fazendo?'",  contou Daniel, que cuida da parte de compras a entrega de documentos e escrituras.

“Ainda falta muito para eu me sentir bem à vontade e dominar esta situação. Mas estou muito mais seguro, conseguindo contribuir cada vez mais em áreas diferentes. A cada dia que passa, meu conhecimento aumenta”, afirmou.

Em seis meses de trabalho, a construtora já finalizou um prédio de 30 apartamentos, tem 70% concluído de um segundo e deu início à construção de um edifício maior, com 140 unidades.
“Já são dois prédios totalmente vendidos. A empresa está capitalizando, mas não é uma coisa fácil”, completou Daniel.

A mudança radical em seu ramo de atuação nada teve a ver com o desgosto pelo tênis ou frustrações como treinador no Itamirim Clube, onde comandou jovens promessas do tênis nacional como Bruno Sant’anna. A escolha foi feita para ficar com a família e poder acompanhar de perto o crescimento dos filhos Maria Fernanda e Davi, de quatro e sete anos, respectivamente.

“Esta mudança foi e continua sendo um risco, pois o mercado não está fácil. Eu estava muito bem no Itamirim, ganhando um salário bacana e trabalhando ao lado de amigos. Mas foi uma mudança mesmo para poder ficar perto da família. Meu projeto de vida sempre foi poder estar perto dela. Ser treinador exigia muitas viagens. Agora, só viajo quando quero”, afirmou o ex-tenista.

Apesar de estar afastado do tênis e não disputar uma partida como profissional desde abril de 2011, quando caiu na primeira rodada do ATP 250 de Estoril (POR), Marcos Daniel ainda poderia jogar torneios. Isso porque conta com ranking de entradas protegido de número 150. O benefício é concedido a jogadores que precisam se afastar do circuito por conta de uma grave lesão. O gaúcho abandonou a carreira logo após sofrer um rompimento dos tendões do ombro direito.

Marcos Daniel - Mark Dadswell/Getty Images - Mark Dadswell/Getty Images
Marcos Daniel chegou a ocupar a 56ª colocação do ranking em setembro de 2009
Imagem: Mark Dadswell/Getty Images

“Pedi o ranking protegido pois eu sabia que seria técnico e gostaria de usar isso para jogar uma dupla com um atleta meu, poder passar algumas dicas estando ali dentro de quadra. Minha ideia seria usar este ano se continuasse como treinador e não tivesse sofrido uma lesão na minha perna. Há um ano, rompi o tendão posterior da coxa direita e até hoje tenho dificuldades para arrancar”, contou.

Lesões, aliás, foram as grandes vilãs na carreira de Marcos Daniel. “Todo mundo sabe que meu físico não ajudava muito. Podia ter parado de jogar com 18 anos”.

Das diversas lesões sofridas, uma das que mais frustraram o ex-tenista aconteceu em janeiro de 2011. Dois dias antes da estreia no Aberto da Austrália, estava treinando quando sentiu algo estranho no joelho ao dar uma freada. O choque dos ossos provocou um derrame de líquido e o inchaço foi instantâneo, o que o impediu de treinar até enfrentar Rafael Nadal.
 

Ao entrar na Rod Laver Arena, já sabia que não teria condição alguma de fazer frente ao espanhol. Levou 6 a 0 no primeiro set e perdia o segundo por 5 a 0 quando decidiu abandonar. Só eram passados 47 minutos de jogo.

“Já entrei em quadra sabendo que seria um horror, não conseguia mexer a perna e parecia que o joelho ia cair. Mas também havia uma grana em jogo (o derrotado na estreia ganhava cerca de R$ 40 mil), eu tinha patrocinadores como a Adidas e a Nestlé para quem era importante a exposição, ainda mais que eu estava jogando na quadra central. Apesar da lesão, achava que conseguiria ganhar alguns games. Mas quando vi que podia perder de 18 a 0, resolvi abandonar, estava sendo algo ridículo. Não era jogador para perder deste jeito, não era tão ruim assim”, contou Daniel, que à época era o 93º do ranking mundial.

Antes deste duelo, havia enfrentado Nadal em outras duas oportunidades. Em 2010, no ATP 250 de Queen’s, na grama, perdera por 6-2 e 6-2.  Um ano antes, em Roland Garros, havia sido derrotado na estreia por 7-5, 6-4 e 6-3.

O REI DE BOGOTÁ
Em sua carreira, Marcos Daniel jamais ganhou um título de ATP, nem chegou à final. Seu melhor resultado foi a semifinal do ATP 250 de Gstaad (SUI), em 2009. Porém se havia um lugar onde o gaúcho era dominante era a cidade de Bogotá.

Na capital colombiana, localizada a 2.640m de altitude, conquistou seis títulos do challenger. Foi o local onde mais ergueu troféus da vida.

“Na altura, a bola anda demais, a velocidade nivela tudo. Um cara muito ruim, pode ganhar de um cara muito bom. Sabendo jogar, você consegue bons resultados e sempre me adaptei bem. Bastava ter gás para suportar a falta de oxigênio. Pena que agora que parei de jogar apareceram ATPs em Bogotá e Quito (localizada a 2.850m de altitude)”, disse o tenista, que teve um recorde de 24 vitórias e 66 derrotas em torneios de nível ATP e totalizou US$ 1,1 milhão em premiações.