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Clássicos pelo mundo: Hajduk-Dínamo, rivais croatas unidos pelo ódio

01/10/2016 12h50

Zagreb, 1 Out 2016 (AFP) - Rivalidade norte-sul, duelo entre a capital próspera e a cidade portuária em declínio econômico: o clássico croata de domingo entre Dínamo de Zagreb e Hajduk Split é, como sempre promessa de muita tensão.

Os dois clubes conquistaram juntos todos os títulos de campeão nacional desde a independência do país, em 1991, mas a rivalidade começou bem antes.

"Hoje, a única coisa que sobra é o ódio", descreve à AFP Tomislav Zidak, um dos mais famosos jornalistas esportivos do país.

Na verdade, as relações eram menos tensas na época da Iugoslávia, quando os clubes croatas conquistaram juntos 11 títulos nacionais (sete para o Hajduk e quatro para o Dínamo) apesar da forte concorrência com os gigantes de Belgrado, Partizan e Estrela Vermelha.

No final dos anos 1980, quando a Iugoslávia entrava em colapso, os clássicos eram disputados em clima amistoso, como um encontro entre dois símbolos da identidade nacional croata em pleno ressurgimento. Nos estádios Maksimir de Zagreb e Poljud de Split, os torcedores entoavam juntos: "dois clubes irmãos, o orgulho da Croácia".

- Clube do Pai da Nação -"Em 1990, quando eu jogava, os torcedores cantavam juntos", lembrou em 2009 Slaven Bilic, hoje treinador do West Ham, na Inglaterra. Natual de Split, o ex-zagueiro, que fez parte da seleção croata terceira colocada da Copa do Mundo de 1998, na França, jogou 120 partidas com a camisa do Hajduk.

No meio da década de 1990, porém, "a rivalidade esportiva se transformou em ódio".

O clima foi se deteriorando por motivos políticos. Desde a independência, em 1991, o Dínamo tem forte identificação com o poder. O pai da nação croata, Franjo Tudjman, primeiro presidente do país, assistia a quase todas as partidas e chegou até a mudar o nome do clube para Croatia Zagreb, provocando a revolta da torcida.

A capital croata garante subsídios generosos ao Dínamo e os cartolas têm ligações estreitas com o HDZ, partido conservador de Tudjman. Os irmãos Zdravko e Zoran Mamic, ex-presidente e treinador do Dínamo, respectivamente, já foram indiciados por desvio de verba em transferências suspeitas de jogadores.

Considerado o manda-chuva do futebol croata, Zdravko Mamic admite de bom grado ter financiado a carreira política de Kolinda Grabar-Kitarovic, do HDZ, que foi eleita presidente da República no ano passado. Ele teve que deixar a presidência do clube por causa dos problemas com a justiça, mais ainda mantém cargo oficial de conselheiro da chefe de Estado.

- Unidos pelo pior -Os dirigentes do Dínamo "assumiram o controle de todo o futebol croata, ao colocá-lo a serviço dos seus próprios interesses e do clube", acusa Damir Grujic, líder de uma torcida organizada do Hajduk. "Consideramos o Dínamo o símbolo das irregularidades e da ausência de transparência financeira no nosso futebol", completa.

Enquanto o Hajduk vive uma situação financeira complicada, "o Dínamo é o grande vencedor da irrupção da política no futebol", explica à AFP Drazen Lalic, sociólogo especializado em esporte na Universidade de Zagreb.

De fato, o Dínamo abocanhou os últimos 11 títulos nacionais, e há quatro temporadas o Hajduk não é nem mais o vice-campeão.

O único motivo de orgulho do clube da dálmata é o apoio incondicional da torcida: "o Hajduk é uma religião secular, a maioria dos moradores de Split e Dalmacia tem esse sentimento", analisa Drazen Lalic.

Em meio a essa rivalidade ferrenha, os torcedores 'ultra' de ambos os times se uniram em torno da seleção nacional. Uma união pelo pior: sinalizadores nas arquibancadas, cantos nazistas, violência durante a Eurocopa de 2016, na França.

De acordo com Lalic, "eles têm agora um inimigo comum, Mamic e os demais dirigente do futebol croata", como o presidente da federação, o ex-atacante Davor Suker, maior craque da história do país.

Para muitos observadores, essas provocações têm como único objetivo: enfraquecer a federação, ao forçá-la a pagar multas à Uefa. Torcedores violentos de ambos os times deixam de lado suas cores tradicionais para usar camisas pretas e semear o terror nos estádios.

Isso aconteceu durante a Euro, quando hooligans croatas arremessaram sinalizadores no gramado durante a partida contra a República Tcheca. O jogo foi interrompido e os croatas, que venciam por 2 a 1 no momento do incidente, acabaram cedendo o empate.

Os 'ultras' do Dínamo, os 'Bad Blue Boys', que acusam Mamic de enriquecimento às custas do clube, boicotaram os jogos durante seis anos, mas a 'greve' está acabando e muitos devem comparecer no clássico deste domingo. Uma novidade que já deixa as autoridades locais preocupadas.