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Legado olímpico do Rio manchado pela corrupção e a violência

12/09/2017 10h51

Rio de Janeiro, 12 Set 2017 (AFP) - Um ano após receber os Jogos Olímpicos, a festa acabou no Rio de Janeiro. O legado olímpico ficou manchado pelas denúncias de corrupção em torno do megaevento em uma cidade castigada pela violência e pela crise econômica.

"Brasil, medalha de ouro em corrupção", resumia uma montagem com o logo das Olimpíadas que circulava na semana passada pelas redes sociais, depois que o Ministério Público Federal (MPF) revelou a investigação "Unfair Play" sobre a suposta compra de votos para que a cidade organizasse os Jogos.

Apesar de estarem acostumados que os escândalos de corrupção atinjam indistintamente políticos e empresários desde que a Lava Jato começou, há três anos, os brasileiros não deixaram de se surpreender com os detalhes que surgiram sobre os primeiros Jogos Olímpicos da América do Sul.

Enquanto sofriam com a pior recessão de sua história, os políticos do estado do Rio de Janeiro viram nas Olimpíadas um "grande trampolim" para enriquecer, disse a procuradora Fabiana Schneider, em 5 de setembro, ao revelar a "Unfair Play".

Neste dia, as autoridades denunciaram "uma trama de corrupção internacional" em torno dos Jogos, supostamente orquestrada pelo ex-governador Sérgio Cabral, hoje preso, na qual empresários brasileiras pagaram dois milhões de dólares a membros africanos do Comitê Olímpico Internacional (COI).

Considerado uma peça-chave do esquema, o presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), Carlos Nuzman, foi chamado a depor e teve seu passaporte confiscado pouco após a Polícia fazer uma operação de busca e apreensão em sua casa.

Graças ao pagamento de propinas, a Cidade Maravilhosa teria eliminado em 2009 as candidaturas de Chicago, Madri e Tóquio.

A "Unfair Play" demonstrou, mais uma vez, que a corrupção é endêmica no país e afeta todas as suas esferas.

- Sentimento de insegurança -No Rio, os desvios liderados por Cabral - condenado a mais de 14 anos de prisão pelas propinas que embolsou nas obras públicas, inclusive a da reforma do Maracanã - contribuíram para a quebra do estado, que está à beira da falência.

Atualmente os funcionários sofrem com atrasos nos salários e alguns chegam a depender de doações para poder sobreviver. Esta situação também afeta a Polícia.

"Estamos tentando otimizar os recursos disponíveis e racionalizar o emprego dos nossos recursos no sentido de tentar fazer mais com menos. Esse é nosso grande desafio", diz Roberto Alzir, responsável de questões estratégicas de Segurança no estado do Rio.

No fim de julho, o governo federal mobilizou 8.500 militares para o Rio a fim de ajudar a conter a onda de violência.

Mas o sentimento de insegurança permanece onipresente.

Guerras entre facções de traficantes, crianças mortas por balas perdidas durante as incursões policiais contra esses grupos, aumento no número de roubos à mão armada: a situação não para de piorar.

Mais de 100 policiais já foram mortos este ano no Rio.

Inúmeros especialistas explicam a situação pela fraqueza da estratégia de ocupação das comunidades por meio da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP).

"Estamos pagando o preço do fracasso total do projeto das UPPs", denuncia Julia Lembruber, coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) da Universidade Cândido Mendes.

"O Rio, a partir de 2008, apostou num projeto que tinha um objetivo muito claro: tornar essa cidade mais segura para receber dois grandes eventos (Copa do Mundo-2014 e Jogos Olímpicos-2016), mas acabaram criando UPPs numa velocidade enorme, um projeto insustentável a longo prazo", analisou.

"Por que a UPP não deu tão certo? Porque só foi a polícia. A inclusão social, o urbanismo, o saneamento não chegaram em muitas comunidades. Não é algo simples, muito menos barato, e é preciso uma ação integrada entre polícia e todos os setores sociais", reconhece Roberto Alzir.

- Crise olímpica -Para além dos problemas de violência, os cariocas também foram afetados pela alta taxa de desemprego.

Antigos executivos de empresas hoje trabalham como motoristas da Uber, enquanto a quantidade de pessoas sem lar aumenta consideravelmente.

A crise afetou inclusive os esportistas de alto nível: medalhistas olímpicos nos Jogos do Rio perderam o patrocínio.

Abandonadas durante meses, algumas instalações do Parque Olímpico começam a receber treinamentos ou eventos pontuais como o Rock in Rio, apesar de ainda resistirem dúvidas sobre seu futuro.

De acordo com a Confederação Nacional do Comércio (CNC), foram criados cerca de 5.000 postos de trabalho neste setor durante as Olimpíadas, mas 9.000 pessoas foram demitidas de janeiro a maio de 2017.