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Dois anos após escândalo na Rússia, atletismo ainda cura feridas

01/11/2017 15h17

Paris, 1 Nov 2017 (AFP) - Dois anos depois do vasto escândalo de doping e corrupção no esporte da Rússia, o atletismo tenta passar a página com reformas impulsionadas pelo presidente da Federação Internacional de Atletismo (IAAF), Sebastian Coe, e pressão máxima sobre o país, cujos atletas continuam suspenso.

720.000 espectadores em dez dias no Mundial de Londres e 250.000 em Nairóbi para o Mundial Sub-18: o primeiro esporte olímpico não parece ter sofrido grande impacto pela crise que provocou a revelação, em 2015, do sistema de dopagem institucionalizado na Rússia. Aliado a isso, um sistema de corrupção da IAAF.

"Somos fortes. O público não deu as costas para o atletismo", declarou Coe à AFP em outubro. Apesar da casa do atletismo continuar de pé, o britânico, que assumiu o comando da entidade em 2015, sabe que precisa trabalhar para cementar a estrutura e restaurar a credibilidade de uma federação marcada pelos casos de corrupção.

A marca de material esportivo alemã Adidas rompeu compromisso com a IAAF antes do previsto, por conta do escândalo russo. Para seu lugar, a marca japonesa Asics acertou contrato de patrocínio com a entidade.

Coe, antigo bicampeão olímpico dos 1500 metros e ex-deputado do partido conservador (1992-1997), reagiu rapidamente. Como experiente personagem político, iniciou um carrossel de reformas para acalmar os ânimos e tranquilizar os demais patrocinadores.

Em 2016, a IAAF aprovou a criação de uma unidade independente que se encarrega de doping e da integridade dos atletas (AIU), atribuindo responsabilidade para os controles e as investigações dos atletas de nível internacional. Uma ferramente "que nenhum outro esporte possui", destacou Coe.

- Reintegração em novembro -A AIU atuou pela primeira vez no Mundial de Londres, em agosto: 1.513 amostras de sangue e urina foram recolhidas antes e depois das provas. Nos 10 meses que antecederam as competições, mais de 2.000 testes sanguíneos e 3.000 amostras de urina foram realizadas fora de competição, segundo dados oficiais do organismo.

A estratégia para reconduzir o caso da Rússia, suspensa de todas as competições internacionais desde novembro de 2015, se baseia em um princípio similar. Colocou-se em marcha uma força-tarefa independente para avaliar os progressos do país na luta contra o doping.

O próximo relatório desta força-tarefa vai ser avaliado em novembro, em Monaco, pelo conselho mundial da IAAF. As medidas tomadas pela Rússia serão analisadas para ver se são suficientes ou não para a reintegração do país às competições.

"Não sei quando a Rússia será reintegrada. O que sei é que existem coisas que devolveram minha confiança nos últimos meses. Fizeram progressos no caminho para cumprir os critérios", explicou Coe à AFP, lembrando o pedido de desculpas do novo presidente da Federação Russa, Dmitry Shlyakhtin, durante congresso da IAAF no final de agosto.

- Clima viciado -Apesar de todos os esforços, o clima parece viciado. Pelo menos é o que indicam as últimas revelações sobre Sergueï Bubka, vice-presidente da IAAF que é suspeito de ter feito transferências a um dos principais protagonistas do escândalo de corrupção na nomeação dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro.

Outro indício é a suspensão provisória decretada pela AIU ao ex-velocista Frankie Fredericks como membro do conselho mundial da IAAF, também por suposta corrupção.

O sucesso popular do último Mundial não pode ocultar a imagem desastrosa deixada após a vitória de Justin Gatlin nos 100 metros rasos. O americano foi suspenso duas vezes por doping, antes de protagonizar retorno controverso e vitorioso às pistas.

Questionado pelo público, Gatlin jogou água no chope da homenagem prevista à lenda do sprinte: o jamaicano Usain Bolt.

Mas Sebastian Coe reconhece: "a confiança no atletismo não vai retornar em uma noite".