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Proibição da Uefa não impede manifestações de cunho político nos estádios

Manifestações a favor da independência da Catalunha são comuns no Camp Nou - David Ramos/Getty Images
Manifestações a favor da independência da Catalunha são comuns no Camp Nou Imagem: David Ramos/Getty Images

05/12/2017 15h06

Paris, 5 dez 2017 (AFP) - Apoiar a independência da Catalunha no estádio ou pedir de volta ruínas antigas "roubadas" por uma potência estrangeira: apesar da proibição da Uefa, cada vez mais torcedores aproveitam a visibilidade da Liga dos Campeões para difundir mensagens de conteúdo político.

No jogo de ida entre Apoel e Tottenham, a torcida organizada do time cipriota levou cartaz com os dizeres "a história não pode ser roubada. Devolvam-nos os mármores", pedindo que os ingleses devolvessem os mármores de Elgin.

As peças faziam parte do Parthenon de Atenas e estão expostas no Museu Britânico de Londres desde o início do século XIX. Agora, 200 anos depois, os vestígios são considerados parte do patrimônio heleno.

O caso está longe de ser exceção na temporada. Durante o jogo entre Barcelona e Olympiacos (3-1) no final de outubro, os torcedores do Camp Nou mostraram um cartaz gigante pedindo a "Liberdade para a Catalunha", em plena crise política do referendo de autodeterminação.

A demonstração mais espetacular foi feita pelos torcedores do Legia de Varsóvia, que montaram um gigantesco mosaico no final de agosto, pela terceira fase preliminar contra o Astana. A imagem representava uma criança ameaçada por um soldado da Wehrmacht, acompanhado da mensagem: "Durante a insurreição de Varsóvia, os alemães mataram 160.000 pessoas. Muitas delas crianças".

Ato ilegal

Apesar das manifestações políticas deste tipo continuarem marginalizadas, por conta da heterogeneidade e variedade de posicionamentos entre os torcedores do futebol europeu, "alguns grupos utilizam esta tribuna para externalizarem suas reivindicações com grande ressonância", explica à AFP o sociólogo Ludovic Lestrelin.

"A adoção de símbolos provocadores, do ponto de vista político, se insere dentro de uma retórica guerreira para impactar e criar uma identidade forte", completa Sébastien Louis, autor do livro sobre torcedores radicais denominado "Ultras, os outros protagonistas do futebol".

Celtic - Steve Welsh/Getty Images - Steve Welsh/Getty Images
Bandeiras da Palestina marcaram jogo do Celtic na Liga dos Campeões em 2016
Imagem: Steve Welsh/Getty Images

Para a Uefa, os atos são ilegais porque violam seu regulamento, que proíbe a exibição de "mensagens de natureza política, ideológica, religiosa, injuriosa ou provocadora" nas competições que organiza.

O Celtic, por exemplo, foi punido em 2016 após seus torcedores levarem bandeiras palestinas durante jogo da fase preliminar contra o israelense Hapoel Beer-Sheva.

Já o polêmico ato dos torcedores do Legia custou multa de 35.000 euros. A resposta não demorou a chegar: dias depois, a torcida organizada do clube polonês voltou a montar um mosaico, desta vez representando a Uefa como um poco gigante vestido com o símbolo do euro.

'Apoliticismo' cai por terra

O ato de desafiar as instância é algo importante dentro da psicologia dos grupos ultras. Além de certos grupos que têm um viés político muito claro, a única opinião que une os ultras de toda Europa é a luta contra a mercantilização do futebol", explica Sébastien Louis.

Por outro lado, o que explica a intransigência da Uefa diante das mensagens políticas? Para Ludovic Lestrelin, "a posição dos organismos esportivos é ser apolítico, porque a política se percebe como uma fonte de conflitos. Já os espaços esportivos se entendem como lugares de reconciliação e superação de fraturas sociais".

"Na medida em que existe um claro aumento dos interesses econômicos e a crescente espetaculização do futebol, o posicionamento vai em direção à neutralidade diante de toda expressão que poderia ir contra essa tendência, desnaturalizando a logica do que deve ser o esporte para os olhos dos patrocinadores", acrescentou.

Mas o estado apolítico do futebol é "um mito que não se sustenta muito tempo", destacou Sébastien Louis, citando o Paris Saint-Germain. O clube da capital francesa se tornou um dos pontos principais da estratégia de influência do Catar, diante do bloqueio imposto pelos países vizinhos e pelo instrumento geopolítico que representa a Copa do Mundo da Rússia-2018.