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'Ele estava na relação de mortos e eu na perseverança', conta mãe de Neto

Chuck Tayman /BBC Brasil
Imagem: Chuck Tayman /BBC Brasil

Julia Dias Carneiro e Roberta Fortuna

08/12/2016 15h03

Dona Valéria dos Santos Zampier reconheceu o filho caçula pela TV. Ele estava enfaixado em uma maca, mas a mãe, quando viu a imagem em casa, falou: “é o Netinho!”.

Neste momento, o nome do zagueiro aparecia na lista de mortos do voo da Chapecoense. Por isso, os outros familiares na casa permaneceram incrédulos, nervosos. E ela repetia: “É ele sim, é o Netinho”.

A imagem passou repetidas vezes, mas demorou algumas horas até confirmarem o que a mãe sabia: seu filho, Hélio Hermito Zampier Neto, conhecido por todos como Neto, era o último a ser resgatado com vida dos destroços do voo que matou 71 pessoas a caminho de Medellín.

"Ele estava na relação de mortos já e eu ali, na perseverança", conta Valéria.

“Eu conheço porque ele é muito alto. Os pés dele, pelo tempo que ele ficou lá, estavam enfaixados, ele estava com hipotermia. Eu falei: "é ele, é ele!'. E daqui a pouco quando (a TV) deu “Neto vivo”, falamos, ‘meu Deus!’...”

A mãe do jogador diz que “o Senhor sabe das coisas” e considera obra divina a sobrevida dada ao filho.

Mas a família permanece aflita, já que, entre todos os sobreviventes, o estado do zagueiro é considerado o mais grave.

Na quarta-feira, seu pai, Helam Marinho Zampier, embarcou para a Colômbia com o outro filho para acompanhar de perto a recuperação de Neto ao lado da nora, Simone.

O zagueiro enfrenta uma infecção pulmonar e segue em coma induzido, respirando com a ajuda de aparelhos.

“Eles agora identificaram a bactéria e estão atacando ela”, diz o pai. “Antes estavam sem saber. Mas ele está sedado ainda. Ele está muito agoniado para falar e o médico está sedando ele para ele não falar”, conta o pai.

Helam diz, porém, que o filho já teve momentos de consciência e apertou a mão da mulher.

A BBC Brasil conversou com os pais do zagueiro no quintal da casa onde cresceu e viveu até os 18 anos na Pavuna, bairro de classe média baixa na zona norte do Rio de Janeiro.

A entrevista foi interrompida por telefonemas dos outros três filhos do casal. A família toda está unida, aguardando notícias da recuperação do caçula.

A professora de escola do jogador também estava na casa - havia passado para dar um abraço nos pais.

A carreira de Neto começou no clube do bairro, o Pavunense, e a vizinhança toda está na torcida por sua melhora.

Mas Dona Valéria e Seu Helam não agradecem apenas a Deus; gostariam de dar um abraço no policial Marlon Lengua, o subtenente da Policía Nacional colombiana que o resgatou quando socorristas já tinham deixado o local para retomar as buscas no dia seguinte.

“Eu o dei à luz, e ele (o policial) deu a ele uma sobrevida”, diz Valéria.

Em entrevista ao programa de TV GloboEsporte, Marlon disse que os bombeiros e socorristas haviam se retirado por volta das 2h, dizendo que já não encontrariam mais passageiros com vida.

Os homens da Policía Nacional continuaram até as 9h do dia seguinte “devido ao nosso compromisso e dever”. Até que ele escutou barulhos e, depois, queixas e gritos de Neto.

“Quando escutei os primeiros ruídos e percebi que era uma pessoa, nossa, o meu coração viveu uma emoção, uma mistura de sentimentos. Quando todos davam como perdido. Ele foi um guerreiro, lutou por mais de 10 horas pela vida”, relatou o subtenente, que deseja conhecer o zagueiro.

O desejo é o mesmo na família de Neto, segundo Helam.

“Eu quero conhecer esse cara, vou ter muito prazer em dar um abraço nele...”, afirma, emocionado.

“E agradecer por sua insistência em ficar ali. Quando todos já tinham ido embora, ele continuou com os amigos dele pra procurar mais alguém. Os próprios bombeiros já tinham se retirado né? E ele, na missão de tomar conta como policial, prestou socorro, salvou uma vida.”