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'Pessoas desconfiam de gentileza', diz brasileiro que doou ingresso na Copa

Gleb Obodovsky e a mulher, Marina, conseguiram achar os brasileiros com a ajuda das redes sociais - Reprodução
Gleb Obodovsky e a mulher, Marina, conseguiram achar os brasileiros com a ajuda das redes sociais Imagem: Reprodução

Lígia Mesquita

Da BBC News Brasil em Londres

28/06/2018 18h09

O russo Gleb Obodovsky, de 27 anos, acordou nesta quinta, 28, com uma enxurrada de mensagens em todas as redes sociais onde ele postou um pedido de ajuda: encontrar os brasileiros que haviam presenteado ele e a mulher, Marina, dias atrás, com ingressos para um jogo da Copa do Mundo da Rússia.

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As pessoas estavam escrevendo para revelar a identidade dos dois homens que aparecem na foto tirada pelo jovem perto do estádio de Rostov-on-Don: o arquiteto Leandro Barreira, 44, e o publicitário Pedro Frota, 35, que são cunhados.

Os mineiros de Belo Horizonte e mais outros dois amigos, os advogados Matheus Quirino, 44, e Frederico Barros, 43, foram os responsáveis pela doação do par de ingressos no valor de US$ 105 cada um ao casal, fazendo com que eles conseguissem ver a partida entre Brasil e Suíça no dia 17.

A história de Obodovsky foi publicada nesta quarta, 27 pela BBC News Brasil e deu resultado. As mulheres dos dois brasileiros que aparecem na fotografia usada para o pedido de ajuda entraram em contato com o russo e com a reportagem.

Assim que conseguiu os contatos dos mineiros, Obodovsky, que trabalha com engenharia de software, escreveu para Frota, que estava em Moscou. "Eu fiquei tão feliz em achá-los que no início nem sabia o que dizer", conta ele à BBC News Brasil.

Obodovsky e a mulher estavam perto do estádio de Rostov-on-Don quando foram abordados por Frota e Barreira com a oferta dos ingressos. Eles desconfiaram num primeiro momento que os tíquetes fossem falsos, mas depois seguiram todas as instruções para conseguir ver a partida. Antes, porém, tiraram a foto que serviu para resolver todo esse mistério.

O início do jogo estava próximo e eles precisaram correr para se registrar e conseguir uma identificação exigida pela Fifa para quem entra nos estádios. Por causa dessa burocracia, Frota conta que não sabia se o casal havia conseguido entrar na arena.

Os amigos Leandro Barreira, Pedro Frota, Matheus Quirino e Frederico Barros, de Belo Horizonte, doaram os ingressos que compraram a mais para o casal russo - Reprodução - Reprodução
Os amigos Leandro Barreira, Pedro Frota, Matheus Quirino e Frederico Barros, de Belo Horizonte, doaram os ingressos que compraram a mais para o casal russo
Imagem: Reprodução

"A gente nem lembrava que tinha tirado uma foto. Estávamos com pressa pro jogo", diz Frota à BBC News Brasil, por telefone, de Moscou. Ele conta que ficou muito feliz ao saber que o casal assistiu ao jogo e que Obodovsky fez uma campanha nas redes sociais para encontrá-los. "Foi muito bacana a atitude dele de procurar a gente, de fazer de tudo para se comunicar. Ficamos felizes que deu tudo certo."

Obodovsky disse a Frota que queria reencontrá-los e recebê-los em sua casa, mas os brasileiros não irão de novo para Rostov-on-Don. "Eu agora vou mandar para ele uma camisa do Brasil. Acho que no fundo o nosso papel de torcedor em outro país é um pouco esse de diplomacia também, de mostrar o que é o Brasil", fala Frota.

Gentileza gera gentileza

O publicitário e os amigos contam que decidiram doar quatro ingressos que compraram a mais, porque foram sorteados duas vezes pela Fifa para aquela partida.

"A gente até chegou a pensar em vender, mas depois desistimos, nem tínhamos tempo para isso e acho que não tinha interessado. Sabemos que não custou barato, mas já foi, deixamos assim. Depois pensamos em trocar por algumas cervejas (risos) em um bar perto do estádio. Demos um dos ingressos para um garçom", diz.

Antes de abordar Obodovsky, os brasileiros ofereceram os ingressos a outros russos pelo caminho. Alguns, segundo ele, ficaram ressabiados achando que era uma pegadinha. A desconfiança, ele diz, não tem a ver com o recente caso de assédio envolvendo outros torcedores brasileiros, que fizeram uma russa repetir palavras vulgares em português sem saber o que estava dizendo.

Com ingressos na mão, casal russo teve que correr para fazer crachás de identificação que dão acesso ao estádio - Reprodução - Reprodução
Com ingressos na mão, casal russo teve que correr para fazer crachás de identificação que dão acesso ao estádio
Imagem: Reprodução

"A desconfiança é mesmo porque as pessoas não sabem como lidar com a gentileza inesperada", afirma. "A gente tem uma tendência a pensar nas pessoas de forma unidimensional. E as pessoas têm outras dimensões. Que bom que a gente fez alguém feliz e ele está retribuindo, tornando isso público para deixar a gente saber."

Obodovsky por sua vez gostaria muito de poder fazer algo pelos amigos que o presentearam sem nem conhecê-lo. "Queria oferecer a eles alguma coisa legal, mas neste momento não consigo pagar nada porque acabamos de fazer um financiamento de nosso apartamento e estamos pagando isso mais o aluguel. Mas se eu pudesse eu iria levá-los a vários lugares legais, comprar souvenires pra a família deles", conta.

O que ele conseguiu oferecer foi um jantar em sua casa, mas os brasileiros estão em viagem agora para outras cidades.

"Eu espero que um dia quando as coisas melhorarem a gente possa ir ao Brasil para encontrá-los com suas famílias e levar souvenires e coisas gostosas", diz o russo. "Esses caras me fizeram acreditar que ainda há coisas boas na humanidade. Eu devo a eles não apenas os ingressos, mas esse milagre."

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