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Para Guga, suas conquistas mais atrapalharam que ajudaram tênis brasileiro

Vinicius Andrade
Imagem: Vinicius Andrade

22/02/2017 19h35

Ciente de que mudou o rumo do tênis no Brasil depois de ter sido tricampeão de Roland Garros e líder do ranking, entre outros feitos alcançados, Gustavo Kuerten disse nesta quarta-feira (22) que acredita que, atualmente, seus resultados fazem mais mal que bem à modalidade no país.

"É o bem e o mal, são praticamente lineares. O próprio pai já vê um menino de oito, dez anos, e já diz que é um novo Guga. Imagina a cabeça do menino. Tem mazelas embutidas. Não houve uma quebra de paradigmas na parte estrutural, de formação, de investimentos nos profissionais. A realidade é muito similar à minha época, e com realidade similar e expectativa lá em cima, a tendência é ser pior do que era. E foi o que aconteceu", comentou Guga em entrevista coletiva concedida durante o Rio Open.

Sobre criação de expectativas, o ex-tenista lembrou de quando chegou a Paris em 1998 como atual campeão de Roland Garros. Na ocasião, ele perdeu logo na segunda rodada para o russo Marat Safin, que disputava a chave principal de um Grand Slam pela primeira vez.

"Em 98, em Roland Garros, cheguei lá para defender meu título com 21 anos de idade, todo nervoso, e a melhor coisa foi acabar aquele campeonato porque vi que não morri. É desesperador. Essa expectativa é muito difícil, mas é sempre persistente, faz parte do processo", considerou Kuerten, que crê que o panorama pode mudar a médio prazo.

"Não tenho dúvidas de que hoje o lado negativo (de seus resultados) pesa mais. A vantagem é que vejo que ainda estamos dispostos a dar essa contribuição. Acho que se estivéssemos em casa, distante, poderia ser pior. Mantemos a Escolinha Guga, com 1,9 mil crianças, com professores adequados, aprendendo a cada ano. Se mantivermos isso por dez ou 15 anos, aí o positivo vai superar", previu.

Guga vê cobrança excessiva sobre brasileiros

Gustavo Kuerten também falou sobre o jogo de quinta-feira (23) entre Thomaz Bellucci e Thiago Monteiro, pela segunda rodada do Rio Open, e criticou o que chamou de "cobrança excessiva" em cima de atletas do país.

Bellucci e Monteiro, que costumam treinar juntos, vivem no Rio de Janeiro uma situação até comum, mas um pouco inusitada. Jogaram juntos na chave de duplas, em que perderam para os colombianos Juan Sebastian Cabal e Robert Farah, e no dia seguinte ficarão frente a frente em simples.

"Raramente acontece de estar um dia do mesmo lado da quadra e no outro estar em lados opostos. O lado positivo é que já vai ter um brasileiro nas quartas de final. Quem sabe no fim de semana pode acontecer de um brasileiro chegar à final, beliscar o torneio", disse Guga em entrevista coletiva no Jockey Club Brasileiro, sede do evento, na zona sul do Rio.

O ex-número 1 do mundo lembrou que viveu algumas vezes uma situação parecida quando enfrentava Fernando Meligeni, com quem costumava praticar e, vez ou outra, entrar na chave de duplas.

"São dois brasileiros entre os poucos que têm no circuito, então não é normal. Joguei contra o Fininho duas ou três vezes, e era estranho. Erámos só eu e ele lá e nós pensávamos 'justo nós dois?'. Mas precisa ser assim. Acho que vai ser um jogo interessante", previu Kuerten, que garantiu não ter se surpreendido com a vitória de Bellucci na estreia sobre o japonês Kei Nishikori, número 5 do mundo e primeiro cabeça de chave do ATP 500 do Rio.

"Não é surpresa ele ganhar do Nishikori. Nishikori chegou com pouco tempo para se habituar, ele jogou solto, motivado. Bellucci é um jogador perigoso, incomoda qualquer outro adversário. Ninguém quer enfrentar o Bellucci em uma primeira rodada, por exemplo", elogiou.

Na visão do ex-tenista, há dependência excessiva de vitórias da parte de alguns torcedores brasileiros. "Se ganha, está ótimo; se perde, é horrível. Não pode ser assim. Esse jogo do Thiago foi um exemplo, ele poderia muito bem ter perdido por 6-2 e 6-2, e todo mundo diria 'que horrível!', mas aí se ganha do Bellucci é o melhor do mundo. Para o Bellucci, é o mesmo. Ganhou do Nishikori e é um santo, mas se perde amanhã já não serve para nada", criticou.