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Derrota de mestre chinês em desafio no MMA cria debate sobre artes marciais

10/05/2017 06h00

A humilhante derrota de um mestre chinês de kung fu, que em dez segundos de combate perdeu para um campeão de artes marciais mistas (MMA), desatou um debate sobre se as formas tradicionais de luta desenvolvidas na China há milênios ainda são úteis perante as técnicas mais modernas.

O combate, que aconteceu no dia 27 de abril em um ginásio da cidade central de Chengdu, colocou frente a frente Wei Li, professor de tai chi (uma das mais conhecidas formas de kung fu, palavra que engloba diversas formas de luta tradicional na China) com Xu Xiaodong, um lutador de MMA.

O evento, que criou grande expetativa como símbolo de um combate entre modernas e antigas formas de luta, foi transmitido ao vivo pela internet para mais de um milhão de espectadores e durou somente alguns instantes antes que Wei fosse nocauteado, de uma forma selvagem, atingido na cabeça por Xu.

O evento tinha uma morbidade especial, já que Xu, um lutador a quem os fãs consideram um provocador, não isento de surtos de loucura, já tinha dito anteriormente que seu propósito era demonstrar que as artes marciais chinesas como o tai chi eram "uma fraude" e acabaria com elas.

E, após a vitória que aparentemente lhe deu a razão, Xu desafiou qualquer lutador de kung fu a lutar com ele, sugerindo um prêmio de 1,2 milhão de iuanes (cerca de R$ 555 mil) para o ganhador.

Durante a semana transcorrida após o combate, as redes sociais chinesas ferveram em debates sobre a efetividade do kung fu ou do tai chi no mundo moderno, e a imprensa também analisou o assunto, sem obter por enquanto um veredicto claro.

"O tai chi nasceu como uma arte de defesa, mas agora é mais um instrumento de manutenção da saúde, efetivo contra as doenças crônicas", tentou contemporizar, em declarações à Agência Efe, um professor do Centro de Cultivo Espiritual de Pequim.

Outros consideram que a luta foi um mero espetáculo para atrair fãs e não lhe dão validade para determinar se as artes marciais modernas ou as novas são melhores, como opinou o famoso praticante de MMA, Liu Wenqin, para quem o evento foi somente um show no qual "um louco bateu em um tolo".

O próprio Wei Li, que se autoproclama especialista no chamado "estilo Trovão" do tai chi, diminuiu a importância de sua derrota, assegurando em várias entrevistas que tinha escolhido um calçado ruim que o fez escorregar.

Para a China, pôr em dúvida o kung fu é fazer tremer os alicerces de uma das grandes expressões de sua cultura, tão destacada que tem seu próprio gênero no cinema oriental e converte lugares como o Templo Shaolin, berço dos monges guerreiros, em grandes centros de peregrinação e de negócio.

Dizem os historiadores que as formas de combate chinesas, que ainda são estudadas pela polícia e pelos soldados do país, nasceram em volta da dinastia Qin (século III a.C.), quando os nobres começaram a contratar assassinos profissionais para sua segurança ou inclusive para usá-los de um modo parecido com o dos gladiadores romanos.

As artes marciais floresceram especialmente a partir da dinastia Tang (618-907), quando se abriram escolas e locais de luta em muitas cidades do país.

Na história da China, talvez o maior destaque do kung fu tenha sido na Rebelião dos Boxers (1899-1901), uma revolta de fanáticos antiocidentais especialistas no combate corpo a corpo que pode ser considerada a semente do nacionalismo no país.

No século XX já houve combates para provar se as artes marciais chinesas podiam competir com sistemas de luta moderna, às vezes com sucesso, como quando em 1943 o lutador chinês Cae Longyun derrotou em cinco minutos um boxeador russo.

Mas em 1960, como lembrou na semana passada o jornal "South China Morning Post", um dos pais das artes marciais mistas, o famoso ator americano nascido em Hong Kong, Bruce Lee, já tinha derrotado um praticante de artes tradicionais chinesas, Wong Jack-man, começando a colocá-las em dúvida.

A China, apesar disso, continua tentando promover por todo o mundo suas artes marciais tradicionais, como provou o fato de que na Olimpíada de Pequim em 2008 fossem esportes de exibição, ou que seus monges shaolin viajem por todo o mundo para mostrar o poder de seus punhos.