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Nem feira e rock salvam: elefantes brancos da Copa dão R$ 18 mi de prejuízo

Vinícius Segalla

Do UOL, em São Paulo

23/12/2015 06h00Atualizada em 23/12/2015 19h25

Dos 12 estádios construídos ou reformados para a Copa do Mundo de 2014 no Brasil, três foram erguidos em Estados sem tradição no futebol do país: Estádio Nacional Mané Garrincha, em Brasília, Arena Amazônia, em Manaus, e Arena Pantanal, em Cuiabá. Eram, desde o princípio, os maiores candidatos a se tornar "elefantes brancos" após a Copa, em que pese as autoridades públicas jamais terem admitido essa possibilidade.

Agora, o ano de 2015 vai chegando ao fim e já é possível tratar do assunto baseando-se em fatos e números, e não previsões. As três arenas, que são 100% públicas, deram prejuízo. Juntas, consumiram neste ano R$ 17,6* milhões a mais do que arrecadaram. Das três, a Arena Pantanal é a única em que, pelo menos, o cidadão está tendo algum ganho com o equipamento, já que o governo local passou a promover eventos culturais gratuitos dentro da arena, além de incentivar o uso comunitário das praças e dos jardins construídos em seu entorno. 

Além do custo operacional, os estádios seguem sendo pagos e assim seguirão por mais de dez anos, na medida em que vencem as parcelas dos empréstimos tomados para bancar as obras.

Em nenhuma das arenas o futebol sozinho é capaz de garantir uma rentabilidade mínima. Assim, cada Estado buscou suas formas de dar uso aos equipamentos. Veja, abaixo, como foi o ano de 2015 daqueles que foram apelidados como elefantes brancos da Copa. 

Arena Amazônia: falta de dinheiro para manutenção, pouco futebol e rock´n´roll

Foi um ano de poucos jogos de futebol na arena construída em Manaus por cerca de R$ 750 milhões. Foram cinco partidas nos cinco primeiros meses de 2015, sendo apenas uma valendo por competição do calendário oficial.  

As três primeiras foram do amistoso Super Series, nos dias 21, 23 e 25 de Janeiro, que contou com os times do Sudeste Flamengo, Vasco e São Paulo então em pré-temporada. Depois, no dia 22 de fevereiro, o Nacional-AM enfrentou o Vilhena-RO, pela Copa Verde. Finalmente, no dia 28 de fevereiro, a arena recebeu a partida beneficente entre os amigos do lutador José Aldo contra amigos do ex-jogador Delmo.

Em junho, o estádio recebeu sua primeira partida do Campeonato Amazonense de 2015. Foi a final do torneio, entre Nacional e Princesa do Solimões. Um público de 6.787 pessoas gerou uma renda de R$ 93.825, mas nem um centavo foi para os cofres estaduais. Isso porque o governo estadual fez um acordo com os clubes para subsidiar a realização do jogo, a única forma encontrada de fazer com que pelo menos a final do Amazonense fosse disputada na arena.

O sétimo jogo do ano no estádio aconteceu no dia 13 de setembro, na última rodada da Série D do Campeonato Brasileiro. O duelo entre Nacional e Náutico (RR) foi acompanhado por 260 pagantes, que proporcionaram a menor renda do ano, de R$ 2.385, dos quais R$ 238,50 foram revertidos aos cofres estaduais.

A Arena Amazônia não sediou nenhum jogo das séries A e B do Campeonato Brasileiro em 2015, ao contrário das outras 11 sedes do Mundial. O equipamento fecha o ano no vermelho, tendo gerado um prejuízo aos cofres estaduais de R$ 4,08 milhões, contando o montante gasto com manutenção no ano (R$ 4,8 milhões), menos o quanto o Estado arrecadou com jogos e eventos no local (R$ 720,8 mil).

O resultado teria sido pior se não tivessem sido realizados eventos musicais no local. Foram dois festivais: um de rock, em novembro, com as bandas Paralamas do Sucesso, Detonautas e atrações locais, e outro de música eletrônica, no último dia 12, com DJs se apresentando em um evento de mais de 12 horas de música.

Finalmente, o ano de 2015 na Arena Amazônia foi marcado também por problemas de manutenção gerados por falta de recursos. Em fevereiro, para reduzir os custos operacionais, o governo cortou serviços de limpeza que eram feitos após a utilização do equipamento.

Além disso, a empresa contratada para realizar a manutenção do gramado ficou seis meses sem receber. Por causa disso, no mês passado, ela deixou de prestar o serviço por 20 dias, e só retornou a fazê-lo quando o Estado pagou os R$ 440 mil que devia. Mas a interrupção dos trabalhos acarretou em uma infestação de lagartas no gramado, que só voltará a estar em condições de uso em fevereiro do ano que vem. 

Arena Pantanal: Muitos jogos, pouca renda e uso criativo do espaço

Em Cuiabá, a administração que assumiu o governo estadual no início deste ano usou de criatividade e observação do comportamento espontâneo da população para garantir que o estádio tivesse maior utilidade, mas não conseguiu impedir que ele gerasse prejuízo financeiro aos cofres públicos.

A arena foi erguida por quase R$ 700 milhões. Para incentivar a utilização do equipamento, o governo estadual decidiu arcar integralmente com o custo de manutenção em 2015. "O custo mensal de manutenção do estádio é de R$ 600 mil, que estão sendo pagos integralmente pela Secretaria de Estado das Cidades (totalizando R$ 7,2 milhões). Para 2016, está previsto um decreto que regulamentará a cobrança pelos eventos realizados na Arena Pantanal", informa a pasta.

Dessa maneira, pelo menos foi possível garantir que a população pudesse usufruir da praça esportiva. A Arena Pantanal recebeu um público de quase 100 mil pessoas só no mês de novembro. Um quarto disso, ou 25 mil pessoas, não pagou nada para entrar, são aqueles que passaram pelo local na quarta edição do programa “Vem Pra Arena”, criado pelo governo estadual. Ele ocorre em fins de semana, tem entrada gratuita e conta com atrações musicais, cênicas e praça gastronômica a preços acessíveis, das 18h às 22h. 

A ideia de dar um uso cultural e gratuito ao estádio surgiu da observação da maneira como os cuiabanos vinham ocupando o espaço. Em volta da arena, há praças e jardins, que passaram a ser ocupados pela população como se fosse um parque, com jovens e famílias andando de bicicleta, skate e fazendo exercícios.

Não pagar para utilizar o estádio incentivou os clubes locais a utilizá-lo. Em 2015, a Arena Pantanal recebeu mais de 250 mil pessoas, em quase 150 eventos realizados. Deste total, pouco mais de um terço foram partidas de futebol, a grande maioria com público inferior a 2.000 pessoas.

No dia 21 do mês passado, o estádio recebeu a final da Superliga Centro-Sul de Futebol Americano, entre o Cuiabá Arsenal e o Coritiba Crocodiles. Foram 15 mil espectadores, recorde de público da modalidade no Brasil.

E foi também quase o maior público do estádio no ano, só perdeu para Vasco e Flamengo, no dia 28 de junho, pelo Campeonato Brasileiro, que levou 16.602 torcedores à arena e proporcionou a maior renda de 2015: R$ 1,15 milhão.

Os outros jogos da Série A do Brasileiro que aconteceram na Arena Pantanal atraíram menor público do que a final do futebol americano. Cruzeiro e Corinthians, pela primeira rodada do Brasileirão, foi visto por 11.773 pessoas. Ponte Preta e Palmeiras teve um total de 11.074 pagantes. Já o maior público pagante em uma partida com equipes locais foi a final do Campeonato Mato-Grossense, com 6.331 ingressos vendidos.

Estádio Nacional Mané Garrincha: virou repartição pública e garagem de ônibus 

Em Brasília, a maior e uma das mais caras arenas da Copa (R$ 1,6 bilhão, segundo o Tribunal de Contas do DF), o Estádio Nacional de Brasília, jamais teve sua capacidade total de público (72 mil) atingida em jogos após o Mundial de futebol.

Até novembro deste ano, a arrecadação do Governo do Distrito Federal com 13 partidas e 52 eventos que foram realizados no estádio brasiliense foi de R$ 1,5 milhão. Já os gastos operacionais estimados até o mês passado foram de R$ 7,7 milhões. Ou seja, um prejuízo de R$ 6,2 milhões. Os números são do próprio governo distrital.

Em março deste ano, quando ainda não havia recebido sequer uma partida oficial no trimestre, a arena entrou nos planos logísticos do governo distrital, que, em maio, remanejou os servidores das secretarias de Esporte, de Desenvolvimento Econômico e Sustentável, e Desenvolvimento Humano e Social para as salas internas do estádio. Foram cerca de 400 servidores remanejados.

O espaço passou a receber também eventos oficiais de Estado. No dia 23 do mês passado, sediou o Fórum de Gestão Pública do Consad (Conselho Nacional de Secretários de Estado da Administração), realizado na Tribuna de Honra

Já a área externa do estádio passou a ser utilizada como estacionamento dos ônibus que circulam na cidade. Além disso, o mesmo espaço já foi utilizado para shows de duplas sertanejas, grupos de pagode e festivais de música eletrônica.

Isso não significa que o estádio não tenha recebido jogos em 2015. Foram 14 partidas no total, a maioria com público inferior a 10 mil pessoas, ou 15% da capacidade.

A última foi no dia 17 de setembro: Flamengo e Ponte Preta jogaram para 12.814 pagantes, que proporcionaram renda bruta de R$ 640 mil. O recorde de público foi no dia 22 de novembro, entre Flamengo e Coritiba: 67.011 pagantes e renda de R$ 3.995.500. Já o jogo com menos torcedores foi Legião e Don Pedro, pela Série B do Campeonato Brasiliense, que levou 270 torcedores à arena no dia 31 de outubro.
 

* Considerando uma projeção de prejuízo anual do Mané Garrincha em R$ 6,8 milhões, baseada no prejuízo dos primeiros 11 meses do ano, de R$ 6,2 milhões. A arena de Brasília ainda não divulgou números da operação anual.