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Romário quer investigar COB e suspeita de favorecimento sobre venda de ingressos de 2016

O deputado federal e ex-jogador de futebol Romário (PSB-RJ) discursou nesta segunda - Marcelo Camargo/Folhapress
O deputado federal e ex-jogador de futebol Romário (PSB-RJ) discursou nesta segunda Imagem: Marcelo Camargo/Folhapress

Do UOL, no Rio de Janeiro*

02/10/2012 16h13

O deputado federal Romário (PSB-RJ) voltou a criticar nesta terça-feira o presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e do Comitê Organizador da Rio-2016, Carlos Arthur Nuzman. Em um pronunciamento publicado em seu site, o ex-jogador de futebol pediu uma investigação sobre as contas das duas entidades presididas por Nuzman. Também relevou supostas ligações entre um membro do Comitê Olímpico Internacional (COI) e a empresa detentora dos direitos sobre a venda de ingressos dos Jogos Olímpicos de 2016, que serão realizados no Rio de Janeiro.

Romário informou que nos próximos dias apresentará uma proposta de fiscalização e controle à Comissão de Turismo e Desporto da Câmara dos Deputados para que sejam auditadas as contas do COB e do Comitê Rio-2016. Disse também que quer que Nuzman seja ouvido na Câmara para esclarecer o furto de documentos do Comitê Organizador dos Jogos de Londres por funcionários da Rio-2016.

Essa é a segunda vez em menos de uma semana que Romário critica o presidente do COB e do Comitê Rio-2016. Depois de o Blog do Juca, do UOL Esporte, revelar o furto em Londres, o deputado federal divulgou uma carta aberta pedindo a intervenção da presidente Dilma Rousseff no comitê da Olimpíada do Rio.

O incidente ocorreu durante programa de intercâmbio entre funcionários da Rio-2016 e de Londres-2012, nos Jogos Olímpicos deste ano. Os ingleses descobriram o furto e cobraram os brasileiros, que demitiram nove funcionários envolvidos na questão. Na quinta-feira, Nuzman, eximiu o comitê de qualquer responsabilidade e disse que o caso estava encerrado.

Nesta terça-feira, Romário voltou a pedir que o governo federal interfira no Comitê Rio-2016 e também no COB. Disse que as verbas federais destinadas ao COB devem estar condicionadas à alternância de presidentes na entidade.

"Mais do que nunca, é preciso que a Presidenta Dilma e o Ministro Aldo Rebelo [ministro do Esporte] se mantenham firmes e não recuem da decisão de só repassar recursos públicos a entidades que modernizarem seus estatutos e limitarem os mandatos dos seus dirigentes. Essa é uma tendência mundial", defendeu o deputado.

O COB é presidido por Nuzman desde 1995. Na próxima sexta-feira, ele é candidato único na eleição para presidente da entidade. Portanto, deve permanecer no cargo até 2016.

Já sobre as suspeitas de favorecimento de empresas a respeito do direito da venda de ingressos para a Rio-2016, Romário disse que "soube por fonte segura" que o filho de Patrick Hickey, membro da Diretoria Executiva da organização e do Comitê de Coordenação que acompanha a organização dos Jogos do Rio de Janeiro, trabalha para em uma subsidiária da companhia que venderá os blihetes para as competições realizadas no Brasil.

"Um dos amigos do Sr. Nuzman no COI, pelo que me consta, é o Sr. Patrick Hickey, irlandês, membro da Diretoria Executiva da organização e do Comitê de Coordenação que acompanha a organização dos Jogos do Rio de Janeiro", afirmou o deputado. "Eu soube de fonte segura que o filho dele trabalha numa subsidiária da empresa que ganhou, pela mão do Sr. Hickey, o direito de vender ingressos para os Jogos Olímpicos de 2016."

Romário ainda disse que Hickey estaria envolvido irregularidades em vendas de ingressos para competições de outras edições dos Jogos Olímpicos. Essas suspeitas estariam sendo apuradas pela Comissão de Ética do COI. O deputado disse também que gostaria de ouvir Hickey na Câmara de Deputados para que ele pudesse esclarecer essas suspeitas.

O COB e o Comitê Rio-2016 foram procurados pelo UOL nesta tarde para comentarem o pronunciamento de Romário. Até agora, os dois órgãos ainda não se manifestaram.

Confira a íntegra do pronunciamento:

Nos próximos dias, o Sr. Carlos Arthur Nuzman poderá ser reconduzido ao cargo de Presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, que ele ocupa há nada menos que dezessete anos. E ele tem grande chance de conseguir estender por mais 4 anos o seu reinado: afinal de contas, é candidato único!

Comandar o esporte olímpico do Brasil é, com certeza, uma missão de grande responsabilidade, ainda mais às vésperas da primeira edição dos Jogos no nosso país. Por isso, é fundamental estarmos atentos para saber se o Presidente do COB está realmente comprometido com os interesses do Brasil, ou se ele atende, em primeiro lugar, ao Comitê Olímpico Internacional.

Um dos amigos do Sr. Nuzman no COI, pelo que me consta, é o Sr. Patrick Hickey, irlandês, membro da Diretoria Executiva da organização e do Comitê de Coordenação que acompanha a organização dos Jogos do Rio de Janeiro. Eu gostaria de saber – talvez o Sr. Nuzman possa esclarecer ao Parlamento e à sociedade brasileira – se o Sr. Hickey costuma visitar o Rio para contribuir com os preparativos do evento, ou para sondar oportunidades de negócios para sua família. Afinal, eu soube de fonte segura que o filho dele trabalha numa subsidiária da empresa que ganhou, pela mão do Sr. Hickey, o direito de vender ingressos para os Jogos Olímpicos de 2016.

Todo mundo sabe da minha preocupação em garantir a todos os cidadãos acesso aos jogos da Copa do Mundo e das Olimpíadas. Por isso, algumas informações me preocupam muito.

Foi noticiado na Inglaterra que o Sr. Hickey concedeu a alocação dos ingressos da Irlanda para os Jogos Olímpicos de Londres a uma empresa privada que, por sua vez, criou pacotes de ingressos com hospedagem voltados para a clientela mais rica.

Essa empresa foi o Grupo Marcus Evans, que tem uma longa história de negociações de ingressos para jogos olímpicos. Investigações do jornal The Sunday Times levaram à descoberta de que esse grupo, Marcus Evans, estaria revendendo bilhetes que tinham sido reservados, inicialmente, para os comitês olímpicos da Grécia, de Malta – e da Irlanda.

A Comissão de Ética do Comitê Olímpico Internacional já abriu sua própria investigação sobre os negócios do Grupo Marcus Evans envolvendo ingressos de jogos. Essa Comissão poderá verificar, por exemplo, se houve envolvimento de Patrick Hickey na alocação de ingressos da Irlanda para os Jogos de Inverno da Rússia, que acontecerão em 2014, para esse mesmo grupo empresarial.
Senhor Presidente:
Vossa Excelência e os nobres colegas com certeza já perceberam qual é a minha maior preocupação. Eu me pergunto o que vai acontecer com os ingressos para as Olimpíadas do Rio de 2016.

Será que o Sr. Hickey vai conceder direitos de venda de ingressos ao grupo que oferecer mais dinheiro?

Será que o Sr. Carlos Arthur Nuzman, caso continue o seu reinado à frente do esporte olímpico brasileiro, vai permitir que operadores comerciais assumam o controle da venda de ingresso para os nossos Jogos?

Será que aqui no Brasil os ingressos para os Jogos serão objeto de luxo, e a classe média, os pobres, só poderão assistir às competições pela TV?

Essas coisas me deixam com uma pulga atrás da orelha, Senhor Presidente. Também acho incômodo o fato de Stephen Hickey, filho do Sr. Patrick Hickey, trabalhar numa subsidiária do Grupo Marcus Evans, uma empresa chamada Hospitality Group. Será isso uma mera coincidência?

Através dessa empresa, o Grupo Marcus Evans conseguiu uma proeza, que foi a de montar um empreendimento em Londres, durante os Jogos, chamado de “Casa Olímpica Irlandesa”. O local, que cobrava ingressos caros e servia bebidas até a madrugada, foi divulgado como sendo “oficial”, e utilizava o símbolo oficial dos jogos – um privilégio que marcas globais como McDonald´s, Samsung e Coca-Cola só conseguiram após caríssimas negociações. A Casa fechou as portas após os Jogos Olímpicos, e não reabriu nos Paraolímpicos.

Existem outras passagens meio nebulosas na carreira desse membro do COI, o Sr. Patrick Hickey. Eu gostaria de ouvi-lo sobre casos de corrupção no meio olímpico, inclusive sobre episódios relacionados à candidatura de Salt Lake City para as Olimpíadas de Inverno em 1991, que se tornaram, posteriormente, o maior escândalo de suborno da história olímpica.

Obtive a cópia de uma carta que o Sr. Hickey escreveu, em 1991, para os dirigentes que comandavam a candidatura de Salt Lake City para aqueles Jogos. Nessa carta “estritamente privada e confidencial”, o Sr. Hickey fez algumas revelações chocantes aos seus amigos americanos. Ele disse: “Alguns membros do COI fecharam um contrato com Nagano para votar neles por uma taxa de U$ 100 mil.”

O próprio Hickey afirma que obteve essa informação com Mario Pescante, que mais tarde sobreviveu a um escândalo de acobertamento de doping no futebol italiano, tornando-se Ministro de Silvio Berlusconi e, depois, membro do Comitê Olímpico Internacional.
O Sr. Hickey manteve a informação sobre corrupção na família olímpica em segredo. É meu dever torná-la pública.

Aliás, é importante que o Sr. Hickey seja ouvido pela Comissão de Turismo e Desporto desta Casa, de que sou membro. Essa seria uma oportunidade para ele esclarecer como pretende conduzir a venda de ingressos para os Jogos do Rio de 2016.

Precisamos saber se haverá algum tipo de favorecimento a um grupo empresarial específico. Talvez ele possa nos revelar, também, se houve alguma negociata na eleição do Rio para sede das Olimpíadas.

O Sr. Carlos Arthur Nuzman, até hoje Presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, também deveria vir à Câmara ajudar a esclarecer, com a máxima transparência, como será feita a distribuição de ingressos para as Olimpíadas do Rio, e que chance a parcela mais pobre da nossa população vai ter, se é que vai ter, de acompanhar de perto essa grande festa.

Para finalizar, Sr. Presidente, quero deixar registrada minha indignação diante dos fatos vergonhosos divulgados pela imprensa há poucos dias, sobre furtos de dados sigilosos relativos aos Jogos de Londres por funcionários brasileiros. Ainda falta muita coisa a ser esclarecida, e vou solicitar à Comissão de Turismo e Desporto que convide os funcionários demitidos do Comitê Organizador das Olimpíadas do Rio, como a Sra. Renata Santiago, para que exponham suas justificativas e ajudem a esclarecer esse episódio bizarro de furtos de dados.

Há indícios de que esse não foi o primeiro furto desse tipo. Precisamos de esclarecimentos sobre o episódio que, em 2007, culminou na demissão de Rodrigo Hermida, do Comitê Organizador dos Jogos Panamericanos do Rio de Janeiro, como noticiou o jornalista Juca Kfoury. Rodrigo, que hoje trabalha na organização da Copa de 2014, foi punido, na época, por copiar sem autorização dados da empresa multinacional EKS. Será que Nuzman não se lembra de nada disso?

É importante que Rodrigo Hermida também seja convidado para trazer esclarecimentos à nossa Comissão.

Nos próximos dias, enviarei um Requerimento de Informação ao Ministro Aldo Rebelo, solicitando que sejam apurados fatos que mencionei anteriormente. Além disso, encaminharei uma Proposta de Fiscalização e Controle à Comissão de Turismo e Desporto, pedindo para o colegiado, com auxílio do Tribunal de Contas da União:

- Fiscalizar o CO-Rio 2016, no que se refere à venda dos ingressos dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos;
- Auditar a origem e a aplicação dos recursos públicos destinados ao COB; e
- Auditar as contas do COB.

Mais do que nunca, é preciso que a Presidenta Dilma e o Ministro Aldo Rebelo se mantenham firmes e não recuem da decisão de só repassar recursos públicos a entidades que modernizarem seus estatutos e limitarem os mandatos dos seus dirigentes. Essa é uma tendência mundial. O Comitê Olímpico Internacional já alterou o seu estatuto, que agora só permite uma reeleição. E o Comitê Paraolímpico Brasileiro adotou esse preceito democrático de maneira espontânea.

Não recue, Presidenta! A senhora tem o meu apoio e o apoio de todos aqueles que amam o esporte e desejam que ele seja sempre comandado por gente séria, competente, que tem respeito pela coisa pública e que, por isso mesmo, não precisa agir nas sombras.
Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.

*Atualizada às 17h20