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"Aqui ele é o Tetinha". UOL vê jogo (e lesão) de Gabriel Jesus no Jd. Peri

Juca Kfouri: Gabriel Jesus tem tudo pra ser o grande camisa 9 da seleção

UOL Esporte

Felipe Pereira

Do UOL, em São Paulo

14/02/2017 08h21

O Bar da Gi é aquele típico da quebrada. As prateleiras têm o básico: bolacha, macarrão instantâneo, extrato de tomate, achocolatado e material de limpeza. A geladeira fica ao lado e só conta com marcas nacionais de cerveja. Para comer tem coxinha, croquete e outros salgadinhos.

Se quiser trilha sonora, a jukebox está repleta de sertanejos e pagodes. O estabelecimento foi um dos lugares frequentados por Gabriel Jesus até os últimos dias no Brasil. A dona é Giselle Xavier, uma mulher que se recusa a dizer a idade e a chamar o atacante pelo nome.

“Aqui ele nunca foi Gabriel Jesus, era Tetinha. Todo mundo aqui ficou sabendo pela televisão que o nome dele era Gabriel”.

O bar fica no Jardim Peri, lugar em que o jogador se criou. Giselle é a proprietária nos últimos sete anos e sempre teve o vizinho Gabriel Jesus como cliente. Nada mais justo que seja o local escolhido por vários moradores para assistir às partidas de Tetinha. Gi conta que mudou o plano da TV a cabo para poder ver os jogos.

“Eu estou aqui torcendo para este time que nem sei falar o nome. Assisto só para ver o Tetinha jogar”.

Diversão durou 14 minutos

O bar foi escolhido pelo UOL Esporte para acompanhar o jogo do Manchester City. No outro lado da rua fica o ponto final de algumas linhas de ônibus. Quase todo mundo que chegava do trabalho ou escola passava no bar para saber como Tetinha estava jogando. A pergunta sobre o atacante era tão repetida quanto se a máquina de recargar o cartão de transporte estava funcionando.

Quem não estava trabalhando acompanhou o jogo esparramado nas cadeiras de plástico vermelho ou numa banqueta com a madeira marcada pelo tempo. Ninguém esperava que o atacante saísse machucado aos 14 minutos do primeiro tempo.

Como a expectativa é a mãe da decepção, foi um anticlímax. Num minuto uma dezena de pessoas foi embora deixando Gi sozinha com a cerveja que abriu para curtir a partida. Dona Neném, 40 anos, resumiu o que as pessoas sentiam.

“Sem ele não tem graça. Pra nós, a graça é que ele está lá”, explicou a mulher que também não sabe o nome do time de Gabriel Jesus.

A contusão era assunto de um grupo de garotos que saiu de frente da TV para ver as pernas que desciam e subiam nos ônibus. Ninguém acreditava que era algo grave. Diziam para as pessoas que chegavam do trabalho que Guardiola estava preservando o melhor atacante do time.

Hora da resenha

Gi segura camisa autografada por Gabriel Jesus - Felipe Pereira - Felipe Pereira
Imagem: Felipe Pereira

Sem clientes, Gi teve tempo de contar histórias de Gabriel Jesus. Ela é dessas falsas mal-humoradas e não consegue manter a personagem muito tempo. Logo estava repetindo uma brincadeira do jogador que falava ‘tê..tinha, agora não tem mais’. Ela revela também dos gostos do cliente famoso que era “uma formiga”.

"Trakinas e Yakult eram os preferidos dele. Refrigerante também. Podia ser Coca ou qualquer tubaína."

Assim que termina a frase, Gi vai ao caixa e volta com um caderninho. As últimas anotações são do final de dezembro e remetem ao paladar de uma criança, só tem doce e refrigerante.

Uma presente de Tetinha não combina com o bar: as duas camisas autografadas do Palmeiras não ornam com os dois relógios do Corinthians que estão pendurados na parede, cornetam os frequentadores do bar.

Ela dá de ombros e saca o celular para mostrar gravações da festa de final de ano da comunidade. Foi no bar dela e contou com Gabriel Jesus tocando pandeiro, cantando e jogando futebol. O campo foi montado no ponto final.

Como as vias do Jardim Peri são estreitas, o local é procurado pela molecada porque o encontro das ruas cria um espaço incomum na comunidade. Antes de ser profissional, Tetinha passou muito tempo no lugar e nos campos de várzea da vizinhança.

Admiração sim, histeria não

Giselle é dona de bar que Gabriel Jesus frequentava quando morava no Jardim Peri - Felipe Pereira - Felipe Pereira
Imagem: Felipe Pereira

A Jesusmania é grande e se fala muito do jogador no Brasil e na Inglaterra. Todo mundo no Jardim Peri comenta dos jornalistas ingleses que estão na comunidade fazendo matéria do atacante. O tio dele confirma que estiveram em sua casa tirando fotos. Mas os moradores não se comportam como adolescente que acampam na frente do estádio dias antes do show da diva.

O que eles têm é uma relação de respeito por Gabriel Jesus não ter esquecido a comunidade. Osvaldo de Faria Figueiredo, 74 anos, era dono de outro bar e explica o que as pessoas pensam.

“Tem gente que quando pega fama arruma uma loira e nem aparece mais no bairro”.

A comparação com Neymar é repetida por muitas pessoas no Jardim Peri. Eles afirmam que o jogador do Barcelona ficou ‘metido’ e, se Gabriel Jesus pode comer filé mignon hoje, continua o mesmo garoto dos dias em que comia ovo.

Os discursos dos moradores têm as palavras humildade, merecedor, representa a quebrada e nascido com estrela. Com tanta gente falando bem, as crianças que jogam bola nas ruelas não querem mais ser Messi, Cristiano Ronaldo ou Neymar. Mas um milagre Gabriel Jesus não operou. Todas ainda sonham em jogar no Barcelona.