Topo

Grêmio

Artilheiro 'esquecido': autor de quatro gols em um Gre-Nal vai virar livro

Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Jeremias Wernek

Do UOL, em Porto Alegre

05/06/2019 04h00

Marino está entre os 10 maiores artilheiros da história do Grêmio, mas a memória da maioria dos gremistas não tem uma gaveta reservada exclusivamente a ele. Deveria. Único jogador do clube a marcar quatro gols em um mesmo Gre-Nal, o ex-atacante vai virar livro justamente para ter a vida eternizada. As lembranças do herói do clássico de maio de 1963 são compiladas pela família e reservam passagens que vão desde o jogo em que Pelé virou goleiro até a lição de vida em uma entrevista de emprego como torneiro mecânico na extinta VARIG.

Natural de São Leopoldo, no Vale do Sinos, Marino morreu em 2001 depois de viver como astro do Grêmio multicampeão dos anos 1960 e também trabalhador comum.

"Comecei a escrever o livro para mostrar a vida como jogador, mas também o caráter humano do Marino. Ele foi um grande homem", conta Jair da Rocha, sobrinho do goleador.

"Meus irmãos e eu convivemos muito com ele e ouvíamos as histórias da época em que ele jogava. Muita gente queria falar com ele, perguntar dos clubes e ele sempre foi reservado. Não gostava de falar dele. Quando falava, então, era um acontecimento e tinha também um lado filosófico e de reflexão", diz Rocha.

No site do Grêmio existe uma aba onde 17 jogadores são chamados de "Heróis". A lista tem Renato Gaúcho, por óbvio, e nomes pesados da história gremista como Gessy, Airton Pavilhão, Eurico Lara, Juarez 'Tanque' e até Carlos Miguel. Marino não consta lá. O único homem a fazer quatro gols em cima do Inter em um só clássico foi homenageado pelo tricolor em 2001. Desde então, os pés do antigo jogador estão na 'Calçada da Fama' do clube.

Marino jogou no Grêmio por cinco temporadas e marcou 117 gols, sendo o oitavo goleador da história do clube. Foi campeão estadual entre 1962 e 1964, mas o jogo que mais lembrava ao revisitar a carreira era um amistoso contra o Internacional. No primeiro dia de maio de 1963, o estádio Olímpico recebeu Gre-Nal que serviu de preparação para o restante da temporada. O Grêmio venceu por 4 a 1 e todos os gols saíram dos pés do então ponta-direita do time.

"Ele falava direto do Gre-Nal e ele tinha orgulho enorme. Ele comparava com o Larry e dizia que tinha feito todos os gols do Grêmio no jogo. O Larry não fez todos do Inter no Gre-Nal de 1954", lembra Jari da Rocha.

Larry Pinto de Faria marcou quatro gols na vitória do Inter no primeiro Gre-Nal do Olímpico, em 1954, e sempre foi reverenciado pelo feito. O clássico que acabou 6 a 2 ecoa na história da rivalidade, mas Marino sempre fez contraponto com sua história.

Em 1964, Marino estava me campo quando Pelé saiu da linha e foi jogar como goleiro do Santos. A partida no Pacaembu terminou com vitória santista por 5 a 4 e entrou para os anais do futebol como a segunda vez em que o Rei atuou debaixo das traves.

"Ele falava direto desse jogo do Pelé como goleiro", relembra o sobrinho. "Para nós, ele não era o Marino ídolo, jogador de futebol. Ele era um conselheiro e uma caixa de histórias incríveis", completa.

Marino da Silva ainda jogou por Cerro-URU, Esportivo-RS e no próprio Inter - em breve período. Se aposentou no final da década de 1960 e depois seguiu a vida com trabalhos fora do futebol. Passou pela VARIG, teve lanchonete, foi taxista e se aposentou como funcionário da CEEE (Companhia Estadual de Energia Elétrica). O primeiro teste de emprego sem as chuteiras marcou para sempre e virou uma lição aos sobrinhos.

"Ele concorria pela vaga com outro cara, havia tempo para entregar peça no torno. O outro cara teve problema na máquina e aí o tio parou e foi ajudar ele a fazer o torno funcionar de novo. Eles terminam juntos, depois do prazo, e mesmo assim ele foi escolhido. Foi um ato de solidariedade enorme, mas ele tratava como algo comum. Não fazia firula com isso", conta Jari.

A obra sobre Marino ainda está no forno. O projeto reúne fotos inéditas, depoimentos da família e quer abraçar relatos de torcedores e amigos que conviveram ou tiveram passagens com o goleador. Tudo dividido em quatro partes, em referência aos gols no Gre-Nal 163 que fazem o artilheiro ser único na história do Grêmio.

"Essa ideia de trabalho colaborativo vai resgatar detalhes que estão aí e a gente nem sabe. Vai dar mais profundidade ao livro e ajudar a construir a imagem do Marino como ele merece", explica o sobrinho e autor do projeto.

Grêmio