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'Faz-tudo' do futebol, quarto árbitro ganha menos e lida com ofensa ao pé do ouvido

Técnico Gilson Kleina reclama com o quarto árbitro na partida contra o Internacional - Alexandro Auler/Preview.com
Técnico Gilson Kleina reclama com o quarto árbitro na partida contra o Internacional Imagem: Alexandro Auler/Preview.com

Luiza Oliveira

Do UOL, em São Paulo

01/11/2012 06h07

O quarto árbitro está em todos os jogos, mas passa despercebido aos olhos dos torcedores e poucos o conhecem. Na última semana, só ganhou notoriedade pela polêmica na partida entre Inter e Palmeiras. O UOL Esporte mostra quem é esse profissional que lida com xingamentos ao pé do ouvido, recebe menos dinheiro que os colegas e é uma espécie de ‘faz –tudo’ do futebol.

SAIBA O QUE FAZ UM QUARTO ÁRBITRO

  • Arte UOL

    - Ajuda em todos os deveres administrativos antes, durante e depois da partida

    - Auxilia o árbitro a verificar as condições do gramado e vestiário

    - Confere se a documentação de gandulas e maqueiros estão de acordo com o regulamento. Verifica se há uma ambulância para cada 12 mil espectadores.

    - Checa com os clubes o horário de subir para o gramado e o oficial da partida, inclusive da execução de hinos nacionais e estaduais.

    - Ajuda nos procedimentos de substituição e no anúncio do tempo de acréscimo, levantando a placa

    - Fiscaliza os equipamentos (uniformes) dos jogadores. Confere se eles portam acessórios como brincos, correntes e alianças que não são permitidos pela Fifa

    - Fiscaliza as marcações como tempo de jogo e punições. Auxilia o árbitro, caso cometa um engano de penalizar o jogador errado ou dar dois cartões para o mesmo atleta sem expulsá-lo

    - Comunica o árbitro se alguma pessoa na área técnica e no banco de reservas tem conduta imprópria

    - Observa se há alguma conduta violenta fora do campo visual do árbitro e seus assistentes

    - Auxilia o árbitro na marcação de lances duvidosos, caso estejam em seu campo de visão

    - Auxilia na confecção dos documentos que serão entregues às autoridades, como súmula, relatório disciplinar e comunicação de penalidades

    - Leva a cada clube a comunicação de penalidade para que possam ter ciência dos acontecimentos na partida e dos jogadores do seu time e dos adversários que foram punidos com cartões

A função parece simples: auxiliar o árbitro e estar à disposição caso ele precise ser substituído. Mas envolve muitas atribuições que começam 1 hora antes do jogo e vão bem além dos 90 minutos de bola rolando.

É ele quem cuida da parte administrativa e organiza tudo que envolve o espetáculo. Confere se maqueiros, gandulas, jogadores, comissões técnicas e dirigentes estão de acordo com a regulamentação do jogo. Verifica até se as ambulâncias estão disponíveis no estádio conforme a regra. Ao final, confere a súmula e entrega a comunicação de penalidade (ver quadro) a cada time.

Durante a partida, além de ser responsável pelas substituições e por manter a ordem no banco de reservas, ajuda o árbitro principal. Anota tempos, penalidades e intercorrências e pode sugerir alguma marcação de acordo com sua observação.

Foi o que aconteceu na partida realizada no Beira-Rio, no último fim de semana. O juiz Francisco Carlos do Nascimento anulou o gol de mão marcado por Hernán Barcos após indicação do quarto árbitro Jean Pierre Lima, que fez a comunicação pelo rádio.

O reserva, no entanto, não tem o poder de decisão. Por isso, muitas vezes acaba pagando um preço alto. Como fica na beira do gramado, está sujeito a ouvir xingamentos e muitas reclamações de jogadores e técnicos ao pé do ouvido. Além, é claro, das ofensas da torcida que fica mais próxima, especialmente em estádios menores.

O presidente da Associação Nacional dos Árbitros de Futebol (Anaf), Marco Antonio Martins, classifica  a função como a pior do futebol. “Ele é fundamental. Sem sua presença, não há possibilidade de fazer uma partida. E um erro pode transformá-la em um inferno. Mas é ofendido e xingado. Ninguém o respeita porque não tem autoridade para expulsar ninguém. É uma guerra com treinadores”, conta.

Jefferson Schmidt faz parte do quadro da CBF e a última partida que apitou foi a final da Série D entre Sampaio Correa e Crac, no fim de outubro, no estádio Castelão.  Mas exerce a função de quarto árbitro com frequência – foram oito em 2012, a última na vitória do Figueirense por 3 a 1 sobre o Atlético-GO, pelo Brasileirão, em 10 de outubro.

Sua atuação vem sendo elogiada pelos chefes do setor. Ele, que também trabalha como Major da Polícia Militar de Santa Catarina, conta que faz uma preparação especial com alimentação balanceada e uma boa noite de sono para ter tranquilidade.

“É uma função que não tem tanto desgaste físico quanto a do principal, mas o desgaste emocional é muito grande. Ouvimos muitas coisas, todos acham que somos a panaceia do mundo. Eles não entendem que não sou em quem decido. Tento baixar o nível de agitação e chegar com tranquilidade para ressaltar o estilo apaziguador e mediador. Tem que estar muito centrado e  calibrado”.

QUEM PODE SER QUARTO ÁRBITRO?

Um árbitro. No Campeonato Brasileiro das Séries A e B, por exemplo, ocorre o revezamento nos jogos entre as funções de árbitro principal, reserva e adicionais 1 e 2, que ficam do lado dos gols.

Há uma tendência (não é regra) para que sejam juízes em início de carreira e federados na praça onde acontece o jogo. Árbitros-Fifa não são escalados como quarto árbitro no Brasileirão, mas comumente exercem a função em competições internacionais como a Copa Sul-Americana.

A recomendação da Anaf e da Comissão Nacional de Árbitros de Futebol (Conaf) é justamente manter a calma. O profissional tem que se impor, mas conduzir a situação da maneira mais serena possível. Sua principal tarefa é tentar resolver o problema sem que seja preciso a interferência do árbitro principal e a consequente paralisação da partida.

“Só chamo o árbitro em caso extremo, no caso de uma expulsão, por exemplo. Exige muito feeling. São duas equipes que, por si só, têm interesses diferentes porque uma quer ganhar da outra", diz Jefferson.

"Tem que tentar apaziguar os ânimos para não gerar uma crise ou um calor na outra equipe. Me policio para adotar critérios iguais para os dois lados. Se você permite que o técnico fique em pé na área, vai permitir que o outro faça também”, completa.

Apesar das amplas responsabilidades e atribuições, o valor financeiro recebido pelo quarto árbitro ainda está bem abaixo do que ganha o dono do apito. Um reserva no Brasileirão embolsa em torno de R$ 450 por jogo, enquanto um árbitro-Fifa tem direito a aproximadamente R$ 3 300 por partida no torneio.