Ricardo Centurión não está confortável. Maior contratação do ano do São Paulo, o argentino de 22 anos encerra neste domingo o primeiro ano no clube sem conseguir mostrar a que veio. Pouco aproveitado na temporada e vítima indireta da instabilidade nos bastidores do clube, ele ainda se viu às voltas com um drama fora dos campos: o câncer da mulher. O jogador prefere não colocar muito peso sobre o tema. Mas não faz questão de esconder um certo incômodo com a sua situação atual no clube. Ele queria mais.
"Não foi um bom ano para o grupo e individualmente. Quando cheguei ao São Paulo pensava em ser protagonista", lamenta ele, numa entrevista exclusiva ao UOL Esporte, nesta quarta-feira, 2. "Depois da Libertadores, baixei um pouco de nível e deixei de ser aproveitado pelo técnico. Mas sempre segui trabalhando para fazer o melhor. Estou tranquilo, foi um ano de adaptação aqui no Brasil", avalia o jogador.
Centurión, na verdade, deixa o drama pessoal no pretérito. Prefere atribuir o ano instável a uma de suas características: a dificuldade em se adaptar a uma outra cultura. Muricy Ramalho, técnico do São Paulo quando o atleta chegou ao clube, falou abertamente sobre o assunto. Citava, sobretudo, o problema do jogador em se entrosar com os colegas. O mesmo já havia ocorrido quando defendeu o Gênoa, na Itália, em 2013. Não ficou no clube a tempo de reverter essa imagem. Pediu para voltar antes do fim do vínculo.
O meia reconhece que o processo de adaptação dele é mais lento que de boa parte dos casos e cita a passagem pouco produtiva pelo futebol italiano como um exemplo. "Me havia passado já (em 2013, quando fui jogar) no Gênoa. É muito difícil a adaptação. Não acontece com todos, mas no meu caso sim, a adaptação me custa muito", admite. Até hoje, por exemplo, o jogador não fala português com facilidade: "Posso entender bem, mas falar é mais complicado".
A cidade, em si, também não ajudou. Ele se assustou especialmente com questões de mobilidade na metrópole. A solução foi alugar um apartamento próximo ao CT do clube, na Barra Funda. Mas isso impediu que ele descobrisse o que há de bom na cidade.
Tudo isso somado ainda ao seu temperamento. "É muito tímido e calado. Às vezes, isso pode ser mal interpretado", afirma Talles Darlan, braço direito do jogador no Brasil. Ele foi um dos poucos amigos que conseguiu fazer na capital desde que chegou. Não à toa, é o assessor, aliás, quem costuma, acompanhá-lo nos raros passeios por São Paulo. Leva, sobretudo, a restaurantes que o façam relembrar um pouco do país de origem.
Quem convive ainda que superficialmente com Centurión, nos bastidores do clube, também destaca o lado introvertido dele. O cabeleireiro Dill Black, que atende atletas no CT, conta que ele prefere ser atendido quando os colegas já não estão mais no local. "É um cara do bem, mas é uma pessoa muito quieta, não se envolve nas brincadeiras dos outros. Acho que até mesmo pela questão do idioma, acha que estão zoando", palpita. Coincidência ou não, o atacante colombiano Wilder Guisao é com quem o atleta tem mais proximidade no elenco são-paulino. Mas os dois não levam a relação além dos limites do clube.
Alan Kardec, atacante, foi um dos que tentaram se aproximar de Centurión. Mas não conseguiu estabelecer uma amizade. "Sinceramente, é complicado falar de outros companheiros e até uma irresponsabilidade enorme. Talvez não tenha se adaptado. Mas acho que já foi tempo suficiente pra isso também. Da parte técnica, eu prefiro não falar. É um garoto que está conosco e contamos com ele para 2016", afirma.
Ele está com dificuldade de comunicação, entrosamento. Ele não é de falar mesmo. Ele está tendo dificuldade com isso dentro de campo
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Está no direito de querer jogar sempre. Mas espero que respeite minhas decisões. Penso sempre no que é melhor para o time, não para o jogador
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Centurión nos dará muitas alegrias. Precisamos de um time melhor em volta dele
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Enquanto o futuro do jogador não é definido, ele mantém a rotina de sempre. É no confortável apartamento que vive na Barra Funda que ele passa a maior parte do tempo nas horas vagas. Quando não está com a mulher, "importa" amigos e familiares da Argentina para fazer companhia a ele. Vale até a sogra. Quando tem períodos maiores de folga, costuma viajar ao seu país.
Em São Paulo, uma das maiores diversões de Centurión é assistir aos jogos do campeonato argentino. Acompanha com regularidade. Nessas horas, age como um torcedor comum, perturbando vizinhos. Também adora jogar games. E se diverte com um cachorro, um buldogue francês adquirido por mais de R$ 10 mil assim que chegou à cidade.
Com a mulher de volta definitivamente a São Paulo, após encerrar a quimioterapia, Centurión tem tentado aproveitar o tempo a dois e passear. Após a vitória contra a Chapecoense, viajou ao Rio com a namorada. Os dois se hospedaram num hotel de luxo em Copacabana. Ela ainda não conhecia a cidade. Melody, aliás, planejava conhecer praias brasileiras durante as primeiras férias do atleta no país.