Dois argentinos "vira-casaca" mostram como vão torcer pelo Brasil na Copa América

Fernando Moura*

Em Buenos Aires (Argentina)

  • Fernando Moura/UOL

    O taxista argentino Juan Vicente Ruperto é apaixonado pelo futebol brasileiro

    O taxista argentino Juan Vicente Ruperto é apaixonado pelo futebol brasileiro

A Copa América começou na Argentina, mas nem todos os argentinos (anfitriões e arqui-inimigos) querem que a seleção do Lionel Messi ganhe o torneio mais importante do continente. Pelo contrario. O UOL Esporte encontrou dois argentinos que sonham em ver campeão o Brasil de Neymar e Ganso no próximo 24 de julho.

JUAN, O TAXISTA FÃ DE CLAUDIA LEITTE CLAUDIO E A "PEGADA BRASILEIRA"
"Sou João Vicente, como está?," se apresentou um taxista na avenida Corrientes na capital argentina quando ouviu os repórteres falarem português. "Onde os levo?", disse sorrindo. "Este é o táxi dos brasileiros em Buenos Aires. Tenho clientes fixos," explica o motorista.

"Brasil me apaixonou desde sempre. Fui crescendo com a música e sonhando com o país. Sou taxista e levo continuamente turistas brasileiros no meu táxi. Hoje vivo como brasileiro. Para mim é um estilo de vida. Adotei a forma alegre de viver de vocês," explicou o argentino que, na verdade, se chama Juan Vicente Ruperto, de 47 anos.

"Sabe por que queria ser brasileiro e transportar brasileiros? Porque no Brasil está tudo bem. Tudo é beleza. Tudo está ótimo. Assim trabalho com mais alegria. É outro estilo de vida", continuou emocionado.

Com Claudia Leitte tocando a todo volume no seu táxi, João, como se faz chamar, guia seu carro há mais de uma década. O veículo sempre está em clima de Copa. Bandeira, adesivos da seleção e centenas de CDs de musica brasileira. "Se pudesse escolher entre conhecer o Messi ou algum jogador brasileiro, preferia Neymar, Dani Alves ou Robinho. Meu coração é "verde amarelo" e a minha alma é carioca. Nasci em Buenos Aires fisicamente, mas em espírito foi lá."
 
"Meu sonho é ver o Brasil ganhar a Copa no "Monumental" (apelido do estádio do River Plate). Imagina ser campeão no estádio "de las Gallinhas" (apelido do River) que foram para a série B e com o Brasil que é a seleção que amo e pela que sofro desde sempre," diz sorridente Cláudio Folgueiro, 38, professor de Filosofia em duas escolas secundárias da capital Argentina

O "Claudinho" não lembra desde quando tem esse apelido. "Lembro que no Mundial de 1982 sofri porque não ganhamos. Tinha uns 10 anos. Em 1993 comprei a minha camisa oficial do Brasil, com a que jogava futebol com os meus amigos os domingos. Ninguém entendia porque não usava outra," conta enquanto procura umas fotos que não encontra. "Devem estar na casa da minha mãe. Quando casei devem ter ficado. Eram dessa época. Uma pena."

O professor, pai de duas filhas e fanático torcedor do Boca Juniors, disse que se emociona com a forma de jogar do Brasil. "Sei que devem estar sempre preocupados em ganhar, mas acredito que eles desfrutam com o jogo. Por isso se divertem. Eu quero que o meu Boca ganhe, mas antes disso tem de jogar bem. Senão não serve. Eu jogo, mas quero jogar bonito, driblar, tocar a bola, avançar e fazer gols."
 

Sempre sonhei em vir aqui [ao Obelisco] com a minha bandeira brasileira

Meu sonho é ver o Brasil ganhar a Copa no "Monumental" (apelido do estádio do River Plate)

Em frente ao Obelisco, Juan Vicente sonha alto: "Se chegam à final Argentina e Brasil (sorri) espero que ganhe o Brasil e possa vir aqui comemorar. Sempre sonhei em vir aqui com a minha bandeira brasileira. Sabe, na Argentina comemoramos todos os títulos importantes aqui," explicou feliz o "tachero" portenho.

De pai argentino e mãe paraguaia, Juan Vicente não descarta um dia se radicar na terra da sua bisavó, Juana Vieira, de origem gaúcha. "Eu pensei muito nisso, acredito que devo ser uma reencarnação de um negro, malandro e sambista. Tenho o samba e a ginga no sangue."

"Quando era jovem, era rebelde e queria ir ao Brasil. Poupei dinheiro para comprar um carro, mas meu pai não deixou porque só tinha 17 anos. Aí comprei uma passagem de ônibus e foi viver com um tio em Porto Alegre. Estive lá um tempo (1980-1984) e vivi um ano em Uruguaiana (RS)," comentou o taxista.
Torcer pelo Brasil no país "de los hermanos" não é fácil. Folgueiro conta que quando o Brasil ganhou a Copa de 1994 jogava futebol com a "camisa Umbro" aos domingos, sem exceção. "Mas aquele domingo foi especial. Caminhava pela rua e as pessoas olhavam para mim, olhavam feio. Alguns gritaram e xingaram, mas no fim comemorei. Sei que essa seleção não foi das mais bonitas, mas jogava bem."

As historias de Cláudio são muitas, mas talvez a mais difícil de esquecer seja no jogo da Argentina contra o Brasil na Copa América de 1999, que assistiu em sua casa vestindo a sua camisa do Brasil. Os irmãos não gostaram, mas como estavam confiantes na vitória da Argentina, deixaram que ele assistisse no sofá.

"Mas quando gritei o gol do Rivaldo de livre direto (acho que foi 1x1, depois Ronaldo fez o segundo), meu irmão Pablo me insultou em todas as línguas perguntando-me porque gritava pelo Brasil. Eu respondi questionando por que ele torcia pela Argentina. Acabamos brigados e sem nos falar."
 

Acredito que devo ser uma reencarnação de um negro, malandro e sambista. Tenho o samba e a ginga no sangue

Na Copa América vou torcer pelo Brasil. Sou "maradoniano" e quando ele saiu da seleção acabou para mim o bom futebol

O boom turístico de brasileiros em Buenos Aires permite ao João sonhar: "Agora estamos armando uma página onde estarão os serviços oferecidos, as fotos. É um mercado que me diverte e me faz bem." O promissor empresário se baseia em números: "Hoje há 55 mil brasileiros vivendo aqui. Eu me foco neles e nos que chegam de férias, só com isso posso crescer."

Nos despedimos junto a um posto de combustível no qual Vicente se encontrou com dois colegas. Enrique, 52, com um café na mão brinca: "João usa até cuecas do Brasil." Ao seu lado, Oscar, 45, continua: "Se ele pudesse seria cidadão brasileiro. Era Juan Vicente Ruperto, agora é João Vicente Da Silva Moreira, garoto de Ipanema"

E o João segue feliz, quer estar em La Plata no domingo, vai tentar. Entretanto, se ouve com ele uma música do Zeca Pagodinho. "Deja a vida me levar..."
"Na Copa América vou torcer pelo Brasil. Eu sou "maradoniano" e quando Diego Maradona saiu da seleção acabou para mim o bom futebol. "Diego" era o mais "brasilero"de todos os jogadores argentinos," disse lembrando a jogada que deu o segundo gol da Argentina à Inglaterra no mundial de 1986.

Para Folgueiro, a seguir a "el Pibe", Romário é o melhor jogador que viu jogar. "Rivaldo também era incrível e, claro, Careca e sua dupla com o Maradona no Napoli. Hoje a coisa é diferente, mas o Brasil tem jogadores excelente como Dani Alves, Lúcio e Roberto Carlos com a sua pegada de bola memorável. Que gol na França, você lembra?"

"Claudinho" mostra orgulhoso a sua biblioteca na qual tem a história dos mundiais. Nela, o que mais aprecia são os que falam da seleção brasileira. "No Mundial de 1978, o Nelinho fez um gol de loucos lindo, lindo. Chuta a bola e ela parece que dobra, se mexe no ar, como a do Roberto Carlos. Isso é lindo, como eu falo, isso é "pegada" brasileira."

* Colaborou Gabriel Costa

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