Obra da Olimpíada de 2016 vai demolir casas de mais de 800 famílias no Rio

Vinicius Konchinski

Do UOL, no Rio de Janeiro

O marceneiro Pedro Teodoro Cecílio, de 57 anos, orgulha-se da casa em que vive há 28 anos, na Vila União de Curicica, zona oeste do Rio de Janeiro. Construída por ele mesmo, a propriedade tem sala ampla, cozinha planejada e quartos confortáveis. Foi decorada cuidadosamente a seu gosto. Tem garagem para um carro e até uma parreira, a qual dá 50 quilos de uva por ano, segundo o próprio Pedro.

O imóvel, porém, está condenado. Por estar no caminho da obra da TransOlímpica –avenida que ligará o Parque Olímpico da Rio-2016 ao Parque de Deodoro--, a casa será demolida pela prefeitura do Rio. Pedro, inclusive, já foi avisado disso.

Há anos, ele contava que vila em que mora fosse reurbanizada. Depois que a obra da TransOlímpica começou, entretanto, perdeu a esperança. "É óbvio que não gostaria de sair, mas o que eu posso fazer?", pergunta. "O projeto dá pista está aí. Minha casa e de meus vizinhos estão no caminho. Já disseram: todo mundo terá que sair. Só espero que me paguem o justo pelo o que tenho."

De acordo a SMH (Secretaria Municipal de Habitação), 876 famílias que vivem na Vila União terão de deixar suas casas por causa da construção da avenida. A obra é estratégica para a Rio-2016 justamente por ligar as duas maiores áreas de competição dos Jogos Olímpicos do Rio. Está orçada em R$ 1,9 bilhão. Disso, R$ 300 milhões serão gastos só para desapropriação de imóveis que hoje encontram-se no trajeto da nova avenida.

Praticamente metade da Vila União está no caminho da TransOlímpica. O bairro, que surgiu nos anos 80, chegou a ser incluído num projeto de reurbanização de favelas lançado pela prefeitura em 2010, o Morar Carioca. A maior parte dos moradores do local, no entanto, já não espera mais melhorias por parte do Poder Público. Aguarda é a remoção.

"Há uns anos, vieram aqui e disseram que ia ter Morar Carioca. Agora, inventaram esse projeto de TransOlímpica. Já não conto com mais nada deles", afirmou Célia Neves de Oliveira, 62 anos, que também mora na Vila União há mais de 20 anos. "Eu também não queria sair. Muita gente não quer. Só espero que a prefeitura dê alguma coisa digna para gente."

Segundo a SMH, toda família removida terá direito a indenização ou a um apartamento em conjunto do programa Minha Casa, Minha Vida em construção a 2 quilômetros da Vila União. Célia sabe disso. Mesmo assim, teme que acabe saindo no prejuízo como a mudança forçada causada pela TransOlímpica.

"Tenho uma casa de três quartos, três banheiros, cozinha e sala, além de um espaço para meu comércio. Os apartamentos lá são muito pequenos", afirma. "Não tenho como ir para lá. Respeito quem queira ir, mas eu não quero."

A SMH informa que a Vila União fica numa área de risco, na beira do Rio Pavuninha. As famílias que sairão de lá ganharão uma moradia digna e toda a infraestrutura de urbanização no novo bairro.

Jorge Paulo Francisco, de 52 anos, soube disso e já aceitou mudar-se para um apartamento. Ele só ressaltou que deixará a Vila União não por vontade própria, mas sim por saber que mais cedo ou mais tarde alguém tentaria lhe tirar dali. "Se eu não sair hoje, no futuro vão querer me tirar aqui. O bairro nasceu irregular, você sabe como é", justifica.  "Prefiro sair agora e resolver isso de uma vez."

Desapropriações minimizadas

Além da Vila União de Curicica, a obra da TransOlímpica causará reassentamento de famílias que moram na favela de São Sebastião (62 famílias) e Ipadu (106 famílias), também na zona oeste do Rio de Janeiro. A SMH informou que não tem informações sobre resistência de moradores nessas localidades.

A SMO (Secretaria Municipal de Obras) informou que as remoções são imprescindíveis. O órgão diz que avaliou várias possibilidades para o trajeto da TransOlímpica visando a minimizar os impactos à população.

Na tentativa de evitar remoções de famílias, a TransOlímpica foi desviada até para uma área de Mata Atlântica. A construção da avenida derrubará 200 mil m² de vegetação. A área equivale a 24 campos de futebol.

Segundo a SMO, a supressão da Mata Atlântica será compensada pelo plantio de 400 mil m² de espécies de plantas do mesmo bioma justamente no Parque Estadual da Pedra Branca –duas vezes o que será derrubado para a construção da avenida.

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