O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, acompanhou representantes do COI (Comitê Olímpico Internacional) a uma visita ao Parque Olímpico da Rio-2016 na tarde desta quinta-feira. Em clima amistoso, o político e os diretores do comitê olímpico posaram para fotos em frente às obras do principal projeto em execução para a Olimpíada do Rio, que começa a menos dois anos e meio.

A poucos metros dali, entretanto, o ambiente era bem diferente. Na Vila Autódromo, bairro vizinho ao canteiro de obras do Parque Olímpico, o clima era de tensão e apreensão. Isso porque, dias antes de representantes do COI chegarem ao Rio para reuniões sobre a preparação da cidade para os Jogos Olímpicos, Paes ordenou a demolição das primeiras casas da comunidade por causa do evento.

A Vila Autódromo existe desde a década de 60 em um terreno exatamente ao lado de onde está sendo construído o Parque Olímpico. O prefeito do Rio já afirmou que 280 das cerca de 600 famílias que vivem no bairro terão de deixar suas casas por causa de obras necessárias para a Olimpíada. Na semana passada, as duas primeiras deixaram a comunidade. As casas em que elas viviam foram postas abaixo.

"As pessoas saíram de manhã e, no mesmo dia, já estavam demolindo tudo", contou Marcia Lemos, dona de loja. "Eles disseram que precisavam passar um duto de esgoto por aqui. Ofereceram uma indenização e meu vizinho aceitou. Foi embora. Mas eu não saio daqui nem por R$ 5 milhões. Daqui não me tiram."

Marcia mora na Vila Autódromo há dez anos. Ela vive numa casa confortável com outras seis pessoas de sua família, além de vários animais de estimação: cachorro, gato, galinha, galo e até uma porquinha. Levando em conta sua atual condição de vida, ela nem considera a possibilidade de mudar-se para um dos apartamentos que a prefeitura tem oferecido a moradores que aceitam deixar a Vila Autódromo para abrir espaço ao projeto olímpico da cidade.

Desde o início das demolições no bairro, porém, Lemos tem cada vez menos certeza se sua resistência terá resultado. "A cada família que vai embora, nós perdemos nossa força [de mobilização]", reconheceu ela. "Mas tem muita gente que não quer sair. A maioria dos moradores quer e vai ficar até o fim."

Mudança voluntária

Na quarta-feira, Paes participou do primeiro dia de reuniões com representantes do COI que estão no Rio para monitorar o andamento da preparação olímpica da cidade. Antes mesmo de entrar para a primeira sessão de trabalhos, ele conversou com jornalistas e reconheceu que o processo de remoção de parte dos moradores da Vila Autódromo está próximo.

Paes ainda ressaltou que só sairá do bairro quem quiser. Ele disse que a prefeitura do Rio alterou seus planos para as obras do entorno do Parque Olímpico e só 280 famílias precisam deixar o bairro. Todas elas serão indenizadas ou mudarão para um apartamento em um conjunto habitacional recém-construído a 800 metros da Vila Autódromo.

"Na última vez que recebi moradores da Vila Autódromo para uma conversa, eles estavam pedindo para mudar para um apartamento. Tem mais gente querendo ir para o imóvel novo do que a quantidade de pessoas que precisa sair de lá. Ninguém está saindo forçado."

Indefinição incomoda

 

O discurso do prefeito, entretanto, não condiz com o que dizem os moradores da Vila Autódromo que não querem sair de lá. Cerina dos Santos Pereira mora há 28 anos no bairro e diz que não pretende deixar a comunidade, mas que sofre pressões constantes para isso. "O pessoal da prefeitura já marcou minha casa muitas vezes. Eu não vou sair," disse ela.

"Isso é um projeto de especulação imobiliária", complementou ela, que é assistente social por formação. "Já fizemos um plano popular para o bairro. Está comprovado que ninguém tem que sair daqui. Ganhamos um prêmio internacional por causa desse projeto, mas a prefeitura quer porque quer tirar a gente daqui."

Procurada, a Secretaria Municipal de Habitação repetiu que só deixará a Vila Autódromo quem quiser. Segundo o órgão, das 280 famílias que sairão do bairro, 204 ganharão um apartamento no novo conjunto habitacional e 76 serão indenizadas. As duas casas do bairro já demolidas são de famílias indenizadas.

Já a mudança das famílias para os apartamento começa nesta sexta-feira, segundo moradores. A Secretaria de Habitação informou que as 204 famílias mudam sem gastar nada por isso. Há ainda 172 famílias da Vila Autódromo que já demonstraram interesse em transferir-se para um apartamento. Elas também devem ser reassentadas.

Nesta quinta-feira, antes de visitar o Parque Olímpico, o prefeito Paes apresentou a membros do COI o conjunto habitacional para o qual os moradores da Vila Autódromo serão transferidos, o Parque Carioca. A comitiva, que conta com representantes do Comitê Organizador dos Jogos Rio-2016, passou em frente à Vila Autódromo. Não parou para conhecer a comunidade.