Várzea consagra modelo do manager europeu e dá poder aos técnicos dentro e fora de campo

Bruno Doro e David Abramvezt

Do UOL, em São Paulo

  • Renato Cordeiro/Copa Kaiser

    Tião recebe homenagem do ex-técnico da seleção brasileira Mano Menezes, em 2012

    Tião recebe homenagem do ex-técnico da seleção brasileira Mano Menezes, em 2012

Na várzea, o técnico é muito mais do que aquele que define a escalação do time e fica à beira do campo gritando para orientar seus jogadores. O treinador varzeano é um autêntico manager. Figura cultuada no futebol europeu, no Brasil o profissional que acumula a função de dirigente é mais visto em terrões de periferia do que nos grandes clubes profissionais.

Tião Almeida, considerado o melhor treinador da várzea paulista, é um grande exemplo de manager. Craque em todas as funções, recebeu propostas de cinco times para deixar o Classe A, da Barra Funda, pelo qual foi campeão da Copa Kaiser de 2011, e acabou optando pelo Vila Izabel, de Osasco. Tião, que também foi campeão da Kaiser pelo Vila Loka, da Vila Brasilândia, em 2009, disputou três finais da principal competição varzeana nos últimos cinco anos. 

"Dinheiro, a gente não ganha muito, mas convite a gente recebe bastante. Hoje em dia, é preciso ser alguém completo. Eu monto o time, treino, oriento os jogadores, trabalho junto com a diretoria, busco apoio. Faço de tudo", diz Tião. "Eu também tive propostas do Nápoli (Vila Industrial), Tiradentes (Vila Curuçá), Nove de Julho (Casa Verde) e Jardim Regina (Pirituba), mas escolhi o Vila Izabel para levar esse time que sempre caiu na etapa 3 da Copa Kaiser mais adiante", emendou o treinador.

Ao trocar a Barra Funda por Osasco, Tião demonstrou a força do seu lado manager ao levar com ele nada menos do que cinco jogadores do Classe A, dentre eles quatro grandes destaques do seu ex-time: o zagueiro Fabiano (irmão do volante Marcos Assunção, hoje no Santos), os meio-campistas Mauro e Robson e o atacante Clóvis.

"São jogadores da minha total confiança e eles fizeram questão de me acompanhar, pois sabem que eu comando projetos vitoriosos. Será um projeto de três anos no Vila Izabel. Em toda competição, visamos conquistar o título, sempre respeitando os adversários. Mas eu não tenho dúvida de que o Vila Izabel vai incomodar todo mundo".

Copa Kaiser de futebol amador
Copa Kaiser de futebol amador

A lenda da várzea não quis falar sobre valores de sua transferência, mas deixou claro que o mercado varzeano está inflacionado. "Quando eu comecei, em 1995, a gente jogava para defender nosso bairro. Hoje, em dia, se não tiver dinheiro, não se consegue nada. As coisas mudaram, sorte de quem consegue tirar o sustento ou a maior parte dele da várzea".

Atual campeão da Copa Kaiser, o Ajax, da Vila Rica, terá a efetivação de alguém que, para muitos, era o verdadeiro técnico do time na vitoriosa campanha de 2012. No papel, Robson era auxiliar de Tukinha. No vestiário, porém, era ele quem dava a palavra final na escalação da equipe. O agora treinador também teve, e tem, papel fundamental na contratação de jogadores, montando o elenco para a busca do bicampeonato da Kaiser.

"Eu era auxiliar do Tukinha e montei o time. Mas na várzea ninguém faz nada sozinho. Todo mundo tem a sua parte. Eu não sou um centralizador. Tenho a minha importância, assim como todo mundo do Ajax. Eu só peço pra entrarmos em campo e darmos sempre o nosso melhor. Time grande é assim", disse Robson, que está empolgado com o trabalho no "Corinthians da várzea". "Estamos fortes e vamos em busca do bicampeonato. Respeitamos todos os adversários, mas com o apoio da nossa grande torcida temos condição de chegar longe de novo."

Quem também vai apostar na força de um treinador é o Nápoli, da Vila Industrial. Campeão em 2002, o clube terá na beira do campo e também nos bastidores um dos técnicos mais linha-dura do futebol amador de São Paulo, Lombardinho,  filho de Lombardi, que ficou famoso como narrador de Sílvio Santos no SBT. Até o ano passado era o próprio presidente do Nápoli, Pelé, quem exercia a função de comandante do time, que caiu nas quartas de final da Copa Kaiser de 2012. "Até o ano passado eu era o técnico, mas fica pesado. Eu já estava atrás do Lombardinho há muito tempo e, finalmente, fechamos. O meu trabalho fica mais fácil, só preciso cuidar da montagem do time", celebra Pelé.

Lombardinho já participou ativamente da formação da equipe, bem como da organização do clube da região leste de São Paulo. "Eu aceitei o Nápoli pela estrutura que montaram. Criamos um departamento de futebol, temos um bom campo para treino. Os jogadores chegam porque confiam em tudo isso. Eu faço a lista, digo quem eu quero e eu e o Pelé discutimos quem pode vir, quem não pode", explicou ele.

Vice-campeão das duas últimas edições da Copa Kaiser, a Turma do Baffô, do Jardim Clímax, resolveu trocar de técnico após chegar tão perto, mas não conquistar o título pelo segundo ano consecutivo. Juninho foi dispensado e o clube busca justamente alguém que possa fazer o papel de manager. "Foi um desgaste natural e resolvemos que era hora de mudar o comando do time. Ainda estamos analisando quem vai assumir, mas pelo menos mantivemos a base de jogadores", explica o presidente Cláudio Rosa.

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